Associações de juízes criticam mudança na Justiça Eleitoral

Frederico Vasconcelos

Sob o título “Funcionalidade da jurisdição eleitoral em jogo“, o artigo abaixo é de autoria de Frederico Mendes Junior, presidente da Associação dos Magistrados do Paraná.(*)

Em seguida, o Blog publica nota pública divulgada pela Associação dos Magistrados de Goiás (Asmego) contra o “desmonte da Justiça Eleitoral”.

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A seguir, o artigo de Mendes Júnior:

 

O Plenário do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) aprovou, por unanimidade, em sessão administrativa, modificações na resolução nº 23.422/14, a qual versa sobre a criação e instalação de zonas eleitorais. A razão da alteração, segundo o TSE, estaria na busca de um rezoneamento eleitoral destinado a aprimorar o trabalho da justiça eleitoral e economizar gastos com as zonas eleitorais.

De acordo com a proposição, cada zona eleitoral, a começar pelas capitais, terá no mínimo 100 mil e no máximo 200 mil eleitores.

Restou aprovada também a alteração do artigo 9 da resolução, de modo a transferir para a presidência do Tribunal a competência para expedir normas com as diretrizes necessárias à adequação das zonas eleitorais. Parte da concretização das impactantes alterações no sistema da justiça eleitoral pode ser visualizada na Portaria TSE nº 372/17.

Causa estranheza que alterações de grande impacto social e jurídico possam estar lastreadas em decisões administrativas e portarias do Tribunal Superior Eleitoral. O ativismo judicial da Justiça Eleitoral, no ponto, pode gerar, de forma inadequada, modificações no dia a dia do cidadão capazes de embaraçar o exercício de direitos fundamentais de natureza política.

O funcionamento da justiça Eleitoral está intimamente ligado à capilaridade da sua estruturação, alcançando todo o território nacional. A funcionalidade da justiça eleitoral é o ponto de partida e de chegada do Estado Democrático de Direito.

A vastidão territorial do nosso país está a exigir reflexão mais adequada da questão, a fim de melhor esclarecer à sociedade até que ponto a extinção de zonas eleitorais impactará o exercício de direitos fundamentais políticos. As peculiaridades de cada região do Brasil, do Norte ao Sul, representam fator de preocupação em relação a toda alteração da estrutura da Justiça Eleitoral.

Aliás, recentemente, já se pretendeu, inadequadamente, junto ao Tribunal Superior Eleitoral, a alteração de Res. n° 21.009/2002, visando a modificar, pela via administrativa, a regra constitucional que estabelece que a jurisdição eleitoral de 1° grau é prestada pelos Juízes de Direito.

Há décadas a Justiça Eleitoral tem prestado serviço de qualidade no Brasil. A merecer elogio de países de primeiro mundo. Tem se notabilizado por uma prestação jurisdicional célere e eficiente. O próprio Conselho Nacional de Justiça, por meio dos relatórios obtidos no programa Justiça Em Números, assinala que é o ramo do Poder Judiciário que tem se mostrado mais eficiente na redução dos estoques o no julgamento dos processos em prazo razoável.

No relatório final de cumprimento das metas, divulgado no dia 05 de maio de 2015, relativo às Metas estabelecidas para o ano de 2014, constatou-se que: O ramo que atingiu o melhor índice de cumprimento da meta foi a Justiça Eleitoral (114%) – 20 dos 27 Tribunais Regionais Eleitorais (TREs) cumpriram ou superaram 100% da meta, sendo que o TRE do Amapá alcançou resultado de 307%.

Portanto, a proposta de reorganização anunciada pelo TSE, nada obstante a boa intenção de seus respeitados membros, não pode dispensar uma ampla discussão na sociedade por meio de instrumentos de democracia participativa, a exemplo de audiências públicas. Exige-se, ainda, ampla participação das associações de juízes e membros do Ministério Público, sem afastar, é claro, a necessária discussão no parlamento.

Excessos no desempenho da função normativa da Justiça Eleitoral inevitavelmente acarretarão distorções indesejadas no sistema eleitoral. Não pode inovar no mundo jurídico, sob pena de usurpar competência do Congresso Nacional, sobretudo em ano que antecede a nova disputa política nacional.

Só assim se valorizará a mensagem constitucional que enaltece a capacidade de auto-organização, normatização própria, autogoverno e autoadministração dos Estado.

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(*) O autor é Coordenador da Justiça Estadual – Associação dos Magistrados do Brasil (AMB)

Eis a íntegra da Nota Pública dos magistrados de Goiás:

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ASMEGO posiciona-se contra o desmonte da Justiça Eleitoral

A Associação dos Magistrados do Estado de Goiás (ASMEGO) vem a público manifestar-se contra o desmonte da Justiça Eleitoral, acelerada com a publicação da Portaria nº 372/2017 que dispõe sobre a aplicação da Resolução 23.512/2017 do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), ambas assinadas pelo presidente do órgão, ministro Gilmar Mendes. A resolução determina a extinção de zonas eleitorais, das capitais e municípios com mais de 200 mil habitantes, que possuam menos de 100 mil eleitores. O texto altera a Resolução nº 23.422/2014, que também trata do rezoneamento eleitoral.

Entre os prejuízos da medida está a redução do número de zonas para o atendimento à população. Com a determinação, o eleitor terá que se deslocar para lugares mais distantes para votar e mesmo realizar serviços relacionados a essa esfera do Judiciário. Outro ponto agravante é que a redução do número de unidades da Justiça Eleitoral dificultará o combate à corrupção. Isso porque, significará a diminuição no número de juízes aptos para julgar tais crimes, em especial na localidades mais afastadas dos grandes centros, favorecendo a disseminação de práticas ilícitas.

Além disso, a ASMEGO alerta que a resolução representa uma tentativa de federalização da Justiça Eleitoral, ou seja, de transferir a competência deste ramo do Judiciário da esfera Estadual para a Federal. Conduzida há quase 29 anos pelos juízes estaduais, a Justiça Eleitoral tem eficiência reconhecida internacionalmente e atestada pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ). Segundo o relatório Justiça em Números 2016, ela é a mais eficaz no quesito Índice de Atendimento à Demanda, ao apresentar o percentual de 112,8%. Isso significa que a eficiência da Justiça Eleitoral é resultado do trabalho dos magistrados dos estados. Além disso, o Judiciário Estadual tem maior capilaridade para atender os cidadãos que mais necessitam. A população tem no magistrado estadual de primeiro grau a porta imediata da Justiça.

Por fim, a associação reitera que a Magistratura estadual seguirá na defesa da manutenção e expansão da Justiça Eleitoral para o atendimento de qualidade e adequado aos eleitores, em especial aos mais carentes.

Wilton Müller Salomão
Presidente da Associação dos Magistrados do Estado de Goiás (ASMEGO)