A jararaca e o tucano
Em artigo na Folha, neste sábado (27), o cientista político André Singer avalia as consequências políticas e eleitorais da condenação de Lula pelo TRF-4 e trata de eleições presidenciais e alternância de poder.
Segundo o ex-porta-voz e secretário de imprensa do ex-presidente Lula, no Brasil, historicamente, só dois campos demonstraram condições de competir: o popular e o de classe média.
O “nervo da controvérsia” atual, diz Singer, é que a Lava Jato “demoliu apenas um dos lados da bipolaridade que divide –e tem que dividir para ser democracia– o universo nacional. A outra parte ficou comparativamente intacta”.
O articulista questiona: “Os que acreditam que isso aconteceu porque o campo popular é essencialmente corrupto enquanto o da classe média não é precisam ler os depoimentos de Pedro Corrêa, Sérgio Machado, Nestor Cerveró, Emílio Odebrecht e Delcídio do Amaral, participantes de ambos. São, basicamente, os mesmos personagens que serviram para condenar Lula. Por que vale para um lado e não para o outro?”
Como registra o filósofo Vladimir Safatle, em artigo publicado na véspera no mesmo jornal, “a sanha anticorrupção vai até Lula e termina nele”.
O resultado, ainda segundo o mesmo autor, “é algo da ordem do escárnio”: “Um país onde Lula é condenado, Temer é presidente e Aécio Neves senador”.
Talvez hoje o cenário fosse outro se, lá atrás, o chamado mensalão tucano, em Minas Gerais, tivesse merecido a leitura e o tratamento dispensados ao chamado mensalão petista.
Os dois episódios vieram à tona na mesma época, com alguns operadores comuns e uma engenharia de lavagem e desvios de recursos públicos semelhante –embora em volumes diferentes.
Numa adaptação grosseira do ditado popular, no país da fábula pronta o pau que bate em jararaca não bate em tucano.