Violência doméstica é debatida nos EUA
Juíza do TJ-SP fala sobre experiências no Brasil
A juíza auxiliar da Vara Central de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher, Rafaela Caldeira Gonçalves, recebeu convite da embaixada dos Estados Unidos para representar naquele país o Poder Judiciário paulista e brasileiro em um programa internacional denominado International Visitors Program. Esse programa tem o objetivo de proporcionar a troca de experiências entre representantes do Judiciário de diversos países.
Blog – Como surgiu o convite da embaixada dos Estados Unidos e qual o interesse dos anfitriões na troca de experiências sobre a questão da violência doméstica?
Rafaela Caldeira Gonçalves – Desde setembro de 2010, a Embaixada Americana no Brasil mantém contato comigo, como juíza da Vara de Violência Doméstica Central, interessada em saber dos trabalhos desempenhados pelo Judiciário Brasileiro, em especial o Judiciário Paulista, no campo da violência doméstica. Mais especificamente, trocamos informações em especial a respeito do volume de investigações, pedidos de medidas protetivas e processos em andamento na vara. Eles sempre solicitaram também informações sobre quais são os crimes mais julgados, quais as penas impostas, bem como quais os projetos sociais desenvolvidos para atendimento das partes envolvidas na violência doméstica. Deste modo, no inicio do ano de 2011, foi mencionado sobre a possibilidade da minha participação no projeto, uma vez que tema do International Visitors Program seria Mulheres e Justiça. Os EUA possuem grande interesse na atuação do Judiciário Brasileiro, uma vez que Lei Maria da Penha previu a criação de uma justiça especializada para tratar deste tipo de questão; tipo de justiça esta que não existe em todos os Estados Americanos. Além disso, ficaram muito interessados nos projetos sociais vinculados à Vara de Violência Doméstica, como o encaminhamento dos agressores ao Curso de Reeducação Familiar, ministrados pela Academia de Polícia e aos encontros para reflexão do Coletivo Feminista, ONG que trabalha em parceria com o Judiciário. Apresentaram ainda particular interesse no projeto chamado Audiência Magna, evento no qual se faz um trabalho de conscientização e sensibilização das vítimas de violência doméstica, inclusive com a participação das Equipes Técnicas do Judiciário, Ministério Público e Defensoria, antes de as vítimas participarem da audiência prevista no artigo 16 da Lei 11.340/06.
Blog – Há alguma avaliação sobre a violência doméstica em São Paulo e nos outros Estados da Federação? Há dados sobre o acesso à Justiça em casos de violência familiar, em relação a outras demandas?
Rafaela Caldeira Gonçalves – O Conselho Nacional de Justiça possui um banco de dados em seu site, por meio do qual se é possível obter informação a respeito da quantidade de dados pertinentes às Varas de Violência Doméstica da cidade de São Paulo. Aliás, este site é alimentado com dados que os Judiciários dos Estados, inclusive São Paulo, portanto, enviam para este órgão federal. Porém, no que concerne ao TJ-SP, por enquanto, esta análise estatística é feita somente na capital, com planos de coleta de dados o mais rápido possível das varas criminais do interior do estado, que também julgam casos desta natureza.
Blog – Quais serão os projetos e trabalhos que a sra. deverá apresentar durante sua visita?
Rafaela Caldeira Gonçalves – Basicamente, pretendo apresentar qual é o trabalho do Juiz de Violência Doméstica no Brasil, em especial em São Paulo. Portanto, necessariamente vou abordar o conceito de violência domestica, de acordo com a legislação brasileira, como estão as Varas na prática estruturadas em São Paulo. Além disso, farei menção também a respeito dos crimes mais comumente processados na vara de violência doméstica e quais as penas impostas. Obviamente foi mencionar sobre o trabalho necessário e conjunto do juiz com sua equipe técnica e ainda sobre os projetos sociais desenvolvidos em paralelo à atuação jurisdicional, mas que são de suma importância para a efetividade de nossa atuação.
Blog – Como atua a Vara Central de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher?
Rafaela Caldeira Gonçalves – A Vara de Violência Doméstica Central de São Paulo atua no julgamento dos crimes praticados contra a mulher, com motivação na questão de gênero, sejam eles decorrentes de ofensa moral, psicológica, física, ou sexual. Outrossim, como previu a Lei Maria da Penha, pode e deve, quanto entender necessário, o magistrado desta corte especializada se valer da imposição de medidas cautelares como: proibição de contato por qualquer meio de comunicação, proibição de frequência dos locais onde esteja a vítima, afastamento do lar, entre outros para garantir a integridade psíquica e ou física da vítima. Não suficiente, cabe ao juiz da violência doméstica e, assim se procura atuar na Vara Central, proceder ao encaminhamento tanto da vítima quanto do agressor, nas hipóteses que se entender necessário, para instituições da rede pública, com a finalidade de que seja promovido atendimento psicológico e psiquiátrico a estas pessoas.
Blog – Supondo que essa área requer atenção especial do magistrado para os casos mais sensíveis, como compatibilizar essa atuação específica com o volume cada vez maior de processos que o Judiciário recebe?
Rafaela Caldeira Gonçalves – A suposição mencionada é o que de fato acontece, pois os casos de violência doméstica exigem um olhar diferenciado do magistrado, visto que cuida de questões afeitas ao contexto familiar e muitas vezes envolvendo crianças. Contudo, é utópico se considerar que algum dia trabalharemos em condições ideais. Isto não existe em nenhuma profissão. Em se tratando da atuação do Judiciário, tenho certeza que sempre será possível prestar um melhor serviço para a sociedade. Na verdade, o que tento fazer, como estou certa que outros magistrados também, é lutar pela criação de novas varas e obtenção de mais funcionários. Tenho percebido que Tribunal de Justiça está visivelmente sensível à questão da Violência Doméstica e tem atuado dentro de suas possibilidades máximas.
Blog – Qual a estrutura de que a Vara dispõe? Qual tem sido a participação de servidores e assessores nesse esforço?
Rafaela Caldeira Gonçalves – A Vara de Violência Doméstica Central dispõe atualmente de dois juízes. Além da minha pessoa, há também a Dra. Elaine Cristina Monteiro Cavalcante, juíza de direito titular da Vara, de sorte que dividimos os julgamentos dos casos pertinentes a esta matéria. Além disso, há também a Equipe Técnica Multidisciplinar composta por duas assistentes sociais e uma psicóloga e o Cartório Judicial vinculado à Vara, composto de sete escreventes, além de estagiários. É indiscutível o comprometimento destes servidores públicos com o tema, considerado que não raramente trabalham além da carga de horários para manter o serviço, dado o volume de feitos, dentro de sua normalidade de tramitação. Além disso, a Presidência da Sessão Criminal do Tribunal de Justiça, na pessoa de seus Assessores nos dá incessante apoio em todas as questões administrativas, no que diz respeito aos procedimentos necessários para obtenção de mais funcionários e melhores instalações para nossas atividades, na medida de possível e do viável.
Blog – Outras questões que julgar importantes.
Rafaela Caldeira Gonçalves – Imperioso mencionar que um dos principais objetivos de minha participação neste programa é a troca de experiências com outras participantes e também com as autoridades americanas para saber quais outros projetos, sejam envolvendo a criação de novas leis, sejam no tocante ao atendimento às mulheres vitimas de violência ou mesmo de natureza preventiva, têm sido promovidos em outros países.
Parabéns ao trabalho das ilustres juízes e do TJSP. No resto do país também há trabalhos importantes. Pena que aqui nesse blog as pessoas não vêem tais avanços, preferem ficar discutindo sobre 60 ou 30 dias de férias ou se advogado vale mais que fulano, se promotor deixa de ter…