Interlocução, pragmatismo e filé midiático
Sob o título “A interlocução do STF com a sociedade deve melhorar?”, o artigo a seguir é de autoria de Renato Soares de Melo Filho, juiz de direito pelo Tribunal de Justiça de São Paulo. Trata do convite feito pelo ministro Ayres Britto ao juiz Mozart Valadares Pires, ex-presidente da Associação dos Magistrados Brasileiros, para assessorá-lo na gestão como presidente do STF e do CNJ, fato divulgado neste Blog.
A pergunta remete às palavras de Mozart Valadares Pires, ex-presidente da AMB e futuro auxiliar do Ministro Ayres Britto na Presidência do STF, conforme noticiado aqui no blog. Vale dizer, o paralelo entre as funções do Poder Judiciário e de uma associação de classe acaba, convenhamos, sendo inevitável provocação.
Explico. A não ser que Mozart faça as vezes de secretário de comunicação (o que sequer se cogita), sua referência a uma maior interlocução com a sociedade escorrega na própria atividade jurisdicional do Supremo. Leia-se – e não há como extrair outra conclusão –, a maior interlocução do STF deve redundar numa espécie de pragmatismo jurídico, renovando a leitura da legitimidade constitucional conferida aos juízes.
Embora não seja nova a discussão, já requentada outras vezes na Europa e nos EUA, pergunto: não bastassem a representação legislativa (mesmo que imperfeita, como são os representados) e os instrumentos de democracia participativa, qual tradução dos anseios populares deve ser levada a cabo por uma Corte Suprema? Não nego aqui a existência de uma mutação constitucional informal, mas, sim, questiono os limites e a legitimidade dessa inflexão interpretativa.
Quando presidiu a AMB, Mozart envolveu a associação em temas de grande repercussão, alheios aos interesses corporativos, como a Lei da ficha limpa, remando midiaticamente ao lado da maré. Afinal, a tese era (e continua sendo) bastante simples: é preciso pagar de representante do bom e do justo, estar ao lado da defesa intransigente do meio ambiente, das minorias, dos fracos, oprimidos e, claro, como não poderia deixar de ser, discursando contra corruptos. A ideia não deixa de ser eficaz, bastando notar a repentina popularidade angariada pela nossa Corregedora, Ministra Eliana Calmon. Falar (fazer é outro verbo) de combate à corrupção é tática manjada, não podendo (é no que se crê) os magistrados ficarem de fora desse filé midiático.
É desse estilo que tenta psicografar a vontade da população, acrítico e carregado de idolatria política, que tenho medo. Antes fosse numa mera associação de classe essa adulação interesseira entre povo e juízes, vá lá, mas ela brota agora, mais e mais, nas sentenças e acórdãos. É o voluntarismo judicial autocrático arrebatando multidões, ficando a cargo apenas da história dizer quem teve razão.
A pergunta, fundamento basilar do artigo, é interessante, ou seja:
“qual tradução dos anseios populares deve ser levada a cabo por uma Corte Suprema?
No entanto, simples de responder. No caso do Brasil, basta colocar na prática os princípios constitucionais que são verdadeiras letras mortas, sendo o principal deles a isonomia, na celebre frase em que “todos são iguais perante a lei”, e tudo o que vem com ela, ou seja, equidistância, proporcionalidade, com consequentes julgamentos imparciais, cadeia para os corruptos e corruptores, etc.
Portanto, o douto autor há de convir que os anseios do povo em relação ao Poder Judiciário são bem modestos.
Sendo assim, salve Ministro Ayres Brito, salve Magistrado Mozart Valadares Pires.
Belo e certeiro artigo. Parabéns ao autor.
As tradicionais fontes do Direito não comportam o acréscimo do populismo.
o pior de tudo eh que da entender que fala em nome da suprema corte,sera que ele foi nomeado Ministro e passou desapercebdo no diario oficial???
Não me surpreenderei se logo aparecer algum desses que adoram um holofote propondo uma nova Constituinte para, de “acordo com a vontade popular”, permitir a pena de morte no Brasil, posto que a atual não permite e isso é cláusula pétrea.
Assusta-nos a todos, que trabalhamos o Direito e buscamos a Justiça, a busca incessante pelo que o povo deseja.
Em tempos de outrora, o povo pressionou um juiz e levou à crucifixação de uma das figuras mais emblemáticas da história: Jesus de Narazé.
Aliás, hoje tenta-se a retirada do crucifixo como se ele fosse apenas um símbolo religioso, olvidando-se os críticos do simbolismo maior que ele carrega: o maior erro judiciário de nossa História, quando o juiz atendeu ao apelo popular.
Ademais, atendendo a anseios populares, temos a higienista Lei da Ficha Limpa, que muitos aplaudem como avanço. Se George Clooney tivesse protestado e sido preso no Brasil, estaria inelegível.
Finalmente, Ayres Britto deveria buscar uma distensão com os diversos setores da Magistratura, e não convidar justamente o ex-presidente da AMB, cujo grupo perdeu a eleição para Calandra.
Enfim… os tempos não são bons para aqueles que cultuam o Estado de Direito.
É o fim do homem médio; o nascimento do homem mídia!
Parabéns ao articulista e ao dono do blog, por abrigar o texto.