Imprensa livre e Justiça independente
Sob o título “Liberdade de imprensa e Justiça independente, pilares da democracia”, o artigo a seguir é de autoria de Antonio Sbano, Juiz de Direito, Presidente da Associação Nacional dos Magistrados Estaduais (Anamages).
Dias passados, a Folha noticiou uma reunião de membros do PT, a frente José Dirceu, para tratar da criação de um órgão de controle da imprensa.
O mesmo jornal (5/5/2012, pág A17) narra “… a regulamentação da mídia foi defendida ontem pelo presidente do PT, deputado estadual Rui Falcão […]. O poder da mídia, esse poder nós temos que enfrentar […]. A mídia produz matérias para atacar o PT e nossas lideranças”.
Censure-se a imprensa, voltemos aos tempos de ditadura; a isto, some-se a tentativa de controlar o Judiciário: no STF temos nove dos 11 ministros nomeados pelo PT decidindo politicamente, às vezes, até contrariando o texto constitucional em nome de uma interpretação social e da governabilidade; o Conselho Nacional de Justiça se afastando, de quando em quando, de seus objetivos (melhorar a gestão do Judiciário e a eficiência da prestação jurisdicional) para se transmutar em órgão policialesco ou de campanhas sociais, com alguns conselheiros querendo limitar o poder de decisão dos juízes, em especial, quando contrariam interesses de advogados.
À imprensa compete o dever de informar, de tornar público aquilo que nas alcovas se faz em detrimento à causa pública, devendo se valer de um jornalismo investigativo sério. Ao largo de alguns desvios, a missão vem sendo desempenhada de forma elogiável, sempre procurando noticiar após ouvir todos os interessados.
Evidente que sendo o jornalismo uma atividade humana, algum pecado possa ser cometido. Entretanto, isto jamais poderá, ou deverá, ser argumento para se limitar o poder de informar.
Corporativamente, os setores alvo de denúncia se insurgem e tentam questionar a liberdade de informação, é o instinto de autodefesa e que não deve servir para inibir a publicização de condutas indignas, devidamente comprovadas ainda que indiciariamente.
Dizem que as Associações de Magistrados se opõem às apurações do Conselho Nacional de Justiça e que desejam ocultar a conduta dos que usam a toga em proveito próprio. Não é verdade! O que se questiona, e se o faz em defesa de todo e qualquer cidadão, é a necessidade de se observar o devido processo legal e ampla defesa. É o não permitir que alguém seja execrado publicamente, ou seja, literalmente “condenado”, sem ser ouvido, sem poder se defender previamente.
A magistratura, como um todo, deseja que se opere em seu meio a extirpação daqueles que, dolosamente e comprovadamente, se desviaram do bom caminho, defendendo, inclusive, penas mais rigorosas posto que deveriam ser exemplo de retidão – felizmente, o percentual de infratores é ínfimo, sequer alcança 1% do total dos magistrados.
A informação lastrada em indícios mínimos de prova jamais poderá ser considerada leviana, ainda que cause comoção e repulsa social.
A liberdade de expressão jamais deve ser controlada por ato de governo. A Lei de Imprensa em boa hora foi afastada de nosso ordenamento jurídico por decisão do STF. A legislação comum é o suficiente para inibir excessos e responsabilizar os que ultrapassem os limites do bom senso e da juridicidade de seus atos – o recorrer às vias judiciais em defesa de seus pretensos direito deve ser ato exclusivo de quem se sentir ofendido. Cabe ao Judiciário, observado o direito de ampla defesa e o contraditório, decidir se a veiculação foi, ou não, fora dos limites da razoabilidade e se, efetivamente, houve ofensa à ordem jurídica.
Vivemos dias nebulosos em que o governo tenta com manobras diversas, valendo-se da fragilidade da legislação e de artimanhas políticas, desviar atenções de um escândalo para acobertar outros. Não fosse a imprensa livre a Nação jamais saberia do mar de lama que enxovalha nossa honra e dignidade; não fossem os juízes independentes, quantas pessoas de bem seriam violentadas em seus direitos e quantos criminosos de alta estirpe restariam impunes!
A constituição determina que todos julgamentos sejam públicos, ressalvando, excepcionalmente, os casos de segredo de justiça, ainda assim, permitindo-se a presença da parte e de seus advogados. Enquanto isto, o Congresso tranca a sete chaves os trabalhos da CPMI e realiza votações secretas de processos disciplinares; o mesmo ocorre com os procedimentos disciplinares da OAB. Em suma, formas de cercear a informação.
Imprensa amordaçada e juízes sem independência, pressionados a decidir conforme entendam outros órgãos, obrigados a obedecer cegamente súmulas vinculantes, engessando o poder de julgar de acordo com seu convencimento e à luz da norma legal, ou seja, imposição de se submeter a entendimentos pré-ordenados e a impedir a evolução do Direito, são portas abertas ao arbítrio e ao rompimento do estado de direito, vale dizer, riscos à democracia.
O artigo demonstra antes ser uma peça de cunho ideológico do que uma real defesa da liberdade de expressão. Pode-se notar que o articulista envereda pelos ministros supostamente nomeados por um partido político, quando se sabe que o processo segue rigorosamente preceitos constitucionais. Depois o articulista subjetivamente mostra o que pensa sobre a ação do CNJ. Em seguida o articulista parece querer desconhecer que regulamentação não se confunde com controle e em países de tradição democrática essa regulamentação acontece, basta ver o recentíssimo caso das escutas patrocinadas pela mídia na Inglatera e as suas repercussões legais. Quando escuto alusões ao “Estado policialesco”, sempre procuro ler nas entrelinhas o que não está escrito. Tanta sutileza faz-me rir.
Devo ressaltar que o sigilo sobre os processos disciplinares na OAB não é uma vontade generalizada dos advogados, mas uma imposição daqueles que execem cargos e funções. Tanto eu como vários outros colegas advogados estão recorrendo à Justiça par afastar o sigilo sobre esses processos disciplinares visando mostrar à sociedade que a regra nesses processos são a vingança e a perseguição, que em regra restam facilitadas pela própria natureza sigilosa do procedimento. Assim, se os magistrados são contra esse sigilo, que julguem procedentes as ações para acabar com essa vergonha que é o sigilo.