Grael: “Sou mais um caso de impunidade”

Frederico Vasconcelos

A jornalista Daniela Ambrósio, do jornal “Valor Econômico“, convidou para almoço no Bar e Restaurante Urca, no Rio, o iatista e medalhista olímpico Lars Grael.

“Ele surpreende pelo jeito franco de ser”, narra a repórter no suplemento “Eu & Fim de Semana” (27, 28,29/7). Em 1998, Grael teve a perna decepada, quando participava de uma regata, em Vitória (ES). Uma lancha invadiu a área de competição e atropelou o seu barco.

Daniela registra que o esportista fala abertamente, “não usa eufemismos para abrandar o drama que viveu”. Segundo ela, essa facilidade e espontaneidade certamente vem das palestras que ministra sobre valores esportivos, motivação e superação.

O que incomoda Grael está nos parágrafos seguintes da entrevista:

Em outubro de 2003, Carlos Guilherme Lima, que dirigia embriagado o iate do pai, foi condenado a pagar a Lars Grael R$ 2,84 milhões e pensão mensal vitalícia de R$ 7,34 mil. A indenização nunca foi paga. “Nem um único centavo”, Lars revela. Seu advogado tentou executar bens, diz ele, mas o empresário havia tirado o que havia em seu nome. “Entre a decisão da Justiça e o cumprimento, existe um abismo muito grante”, afirma.

O tom de voz se mantém aquele mesmo que passeou por diversos assuntos sem censura ou tabu, mas, quando a conversa envereda para a indenização, a feição de Lars muda instantaneamente. “Confesso que nem penso mais nisso. Sou mais um caso de impunidade no país da impunidade”, diz. E continua, visivelmente, indignado. “Não é um privilégio meu, acho que o revoltante é o sistema judiciário como um todo. Nada do que aconteça vai devolver o que eu perdi, eu raramente falo e não gosto de falar sobre isso, só me dá gastrite”, acrescenta e interrompe o assunto.

Comentários

  1. Quero apresentar uma sugestão à reforma de execução penall: que se institua lei estabelecendo que o condenado somente poderá usufruir os benefícios de progressão, remissão, livramento condicional, indulto e comutação quando demonstrar que indenizou integralmente a vítima ou a sua família/herdeiros.

    1. E se o executado é um pobre que roubou uma galinha e já a devorou, tendo somente a roupa do corpo? Vai ficar preso a vida toda por não ter condição de indenizar a vítima?

      1. Sr. Marcos: que eu saiba existem várias penitenciárias onde o bandido preso trabalha e recebe por isso. Que ele pague com o dinheiro que receber por esse trabalho.
        Se ele merecer ficar preso por toda a vida que fique. Pensasse nisso antes de cometer o crime. Estou procupado com a vítima e não com o bandido.

  2. O nosso sistema de justiça, civil e penal, é dos piores do mundo. Só favorece quem não tem razão. Nos EUA, por força da eficiência de seu Judiciário, alguém que se vê lesado no seu direito diz ao responsável pela ilicitude: “Te vejo no Tribunal”. Por isso, o acordo é vivamente buscado pelo causador do dano, seja este civil ou penal, justamente para se ver livre do veredicto de um Juiz. Aqui no Brasil, ao contrário, quem se sai com essa frase é o culpado, pois sabe quão prestigiosa é a nossa Justiça com quem não tem razão. As leis têm sua parcela de culpa nesse descrédito, mas isso não exime o Judiciário da sua.

  3. Grael é só mais uma das vítimas do regime de dominação do homem pelo homem que no Brasil recebe o nome de “Justiça”. A cultura do calote é forte porque se encontra institucionalizada. O Estado brasileiro, que deveria dar o exemplo, é o maior caloteiro que se tem notícia no mundo todo, devendo sem pagar centenas de bilhões de reais aos cidadãos. Trata-se de uma verdadeira indústria, como vastamente exposto na inicial da ADIn 4357, em trâmite pelo STF, que inclui o permanente enfraquecimento dos mecanismos de defesa do cidadão frente ao poderio estatal; desmoralização daqueles que lutam em favor do cidadão comum e supervalorização de quem, ainda que ilegalmente, dá continuidade ao processo de dominação do homem pelo homem; sucateamento do Poder Judiciário e manutenção de uma estrutura baseada em privilégios e exclusão do cidadão comum dos centros de decisão; além de tantos outros problemas que conhecemos bem. É um problema cultural, que não será solucionado enquanto o cidadão comum não se conscientizar que o Estado precisa pagar pontualmente o que deve, e de que o Poder Judiciário deve ser estruturado para garantir o estrito cumprimento da lei e da Constitucião, em prazo razoável.

  4. Nem tanto ao céu, nem tanto à terra… Da mesma forma que existem chicanas para quem se defende da execução, há instrumentos de que o credor deve lançar mão. A mudança de titularidade dos bens depois da condenação constitui fraude à execução. O que é monstruosamente odiosa é a DEMORA nos procedimentos em geral — isso, sim, gera impunidade, tanto penal como civil. É preciso uma ampla reforma dos códigos processuais.

  5. Antes que os justiceiros de plantão comecem a ofender o Judiciário: Por trás da tática do cidadão de “tirar todos os seus bens do próprio nome” (esconder o patrimônio) está, por certo e sem dúvida, a mente de um advogado. Simples assim. Ou vão negar que muitos destes “causídicos” aconselham seus clientes a desaparecerem com o patrimônio?

    1. Forneça então os nomes dos advogados que supostamente aconselham seus clientes a desaparecer com o patrimônio, a fim de que o Tribunal de Ética da OAB possa atuar. Caso não disponha desses dados, retire essa ofensa contra a classe da advocacia.

    2. Ricardo,

      vc foi muito mal nos teu comentário. Não generalize. A culpa é da lei, advogado não julga processo, caso ele tenha agido dessa forma, cometeu um crime e poderá sofrer as sanções cabiveis, repasse os nomes. Por favor, até eu o representaria.

      1. O Ricardo está certo: se o dinheiro do cliente some, a culpa é do advogado, que o orienta a escondê-lo. Sobre fornecer o nome dos advogados, como o paladino Dr. Pintar “exigiu”, infelizmente não posso fazê-lo, uma vez que o espaço para comentários é limitado. Mas se o senhor tem essa curiosidade, é muito fácil achar: vá a qualquer cartório cível e peça alguns processos de execução: verá empresas de pequeno, médio e grande porte, plenamente ativas, mas que, quando da penhora online, não tem um centavo no conta.

        1. Tenho criticado muito as atuais gestões da OAB por não defender a figura do advogado, reclame que tem sido erigido como prioridade pelas várias chapas de oposição que estão se formando. O dito pelo Paulo logo acima é pura e simples difamação contra a classe da advocacia. Se há execução frustradas, e os devedores não são os advogados, não há como apená-los ou dizer categoricamente que a culpa pela frustração é da classe da advocacia. Todo e qualquer empresário sabe que a Justiça é extremamente lenta, até mesmo porque também figuram no polo ativo de muitas ações, e apredem facilmente os mecanismos visando dibrar a legislação. Se essa acusação difamatória fosse verdadeira, teríamos que admitir que a culpa pelo calote do Governo é dos procuradores do estado e membros da AGU, o que é algo totalmente absurdo.

        2. Vou lhe dar uma dica: esse pessoal manda o dinheiro para cooperativas de crédito (que estão fora da penhora on line). A cooperativa depois abre uma conta e aplica os valores em nome dela (tudo legal) . A penhora on line não alcança, o dinheiro, pois não está aplicado no CPF nem no CNPJ do devedor.
          Fora isso vimos que há meio PIB brasileiro em off shores Seria uma boa bandeira à OAB e demais entes da Justiça unirem-se para repatriar esses valores. Seria inclusive mais proveitoso do que atacar a simetria da magistratura com o MP (aprovada pelo próprio CNJ) e do que bater em juízes até acabar de vez com qualquer interesse ao ingresso nessa carreira.

          1. E porque o sr. não leva assim todos esses fatos às autoridades públicas, de modo a que as providências legais sejam adotadas? A propósito, a Ordem dos Advogados do Brasil não pode, nem deve, exercer as funções do Ministério Público vez que mantida com recursos privados e para finalidades específicas como garantir o direito de defesa do cidadão comum frente ao poderio estatal, e orientar a todos a respeito das inverdades comumentes alardeadas por agentes públicos visando dominação do homem pelo homem. Por outro lado, a distribuição de vantagens não prevista em lei a magistrados, que estão chamando de “simetria com o MP”, nada tem a ver com o tema em discussão, muito embora seja uma questão extremamente grave. A OAB, neste aspecto, fez sua parte.

          2. Parece-me que tampouco o juiz tem iniciativa da ação. Não se preocupe, mesmo assim providências estão sendo tomadas dentro de processos. Dizê-las neste espaço não significa o contrário.
            Tem razão quanto ao MP.
            Por outro. Lado, é diminuir a OAB, dizer que não é função dela agregar outros ramos da justiça para impedir evasão de divisas. A exploração do homem pelo homem não é exclusividade do agente público.
            No outro assunto, a simetria com o MP não foi dita por juízes, mas pelo CNJ – órgão cuja autonomia era ferrenhamente defendido pela OAB, até antes de conceder direitos a juízes. É uma lógica que parece apenas acirrar rivalidades baseada no ódio acumulado do dia a dia e numa pseudo impressão de poder do juiz, mais voltada à necessidade meio freudiana de destruir aquele que lhe diz não. Depois não vá reclamar do nível da magistratura, como vc muitas vezes observa. Afinal, colhe-se o que se planta. Os bons advogados, se tiverem juízo, continuarão nesse ofício.

          3. A ação da OAB no sentido de obter decisão judicial contra a distribuição de dinheiro público em favor de juízes federais, sem previsão legal, é baseada em norma concreta, amplamente conhecida. Suposta evasão de divisas e ocultação de bens são suposições, que necessitam de investigações a serem desempenhadas pelas políicias e pelo Ministério Público. Não compete à OAB essa missão. A Entidade só deverá atuar quando efetivamente houve prova concreta e materializada sobre tais desvios, exigindo que as autoriddes competentes cumpram suas missões traçadas na Constituição Federal. Por outro lado, o fato da Ordem dos Advogados do Brasil ter ingressado no Supremo Tribunal Federal requerendo seja corrigido eventual desvio do CNJ não significa acirramento de ânimos ou nada dessa espécie. A entidade, no caso, apenas cumpre sua missão de defensora da sociedade frente ao arbítrio estatal, nos termos do previsto na Constituição Federal. Caberá ao Supremo decidir a questão, e ao povo brasileiro julgar se o STF de fato proferiu um julgamento técnico afastando a distribuição de vantagens pecuniária que não estão devidamente prevista através de lei. Na democracia funciona assim, e justamente por isso é importante que o tema seja debatido publicamente, até mesmo para que a população mais humilde compreenda a dimensão da matéria e saiba se portar adequadamente, ao invés de se deixar conduzir por oportunistas de plantão como é feito há 500 anos.

        3. Mas Pintar, por o dinheiro em off shores não é oportunismo de plantão??? O fato foi amplamente divulgado. E já não é algo concreto??? Palavra mágica então: quem sabe algum juiz aplicou ali seu milionário dinheiro ?? Afinal qdo vc aplaudiu o COAF, não houve necessidade de algo concreto, não é mesmo? Contamos com a OAB a tanto. Se há até ONGs atuando nisso, por que não a OAB? Ainda discordo de você, respeitando sempre seus racionais argumentos. Ah, o CNJ, quanto à simetria, de fato não considerou a lei. Apenas a Constituição.

          1. Olha, creio que sou um cidadão bem informado a respeito do que acontece no Brasil e no mundo. Porém, desconheço dados concretos a respeito de dinheiro depositado em paraisos fiscais, embora no íntimo creio que isso exista. Mas entre existir e haver condições concretas para se incriminar alguém, proibir a prática, ou mesmo recuperar o dinheiro supostamente desviado, vai uma distância enorme. Tal tipo de assunto, definitivamente, não é assunto da OAB, até mesmo porque estamos na advocacia com dificuldade até mesmo para ter acesso aos autos de um processo do “zé ninguém” discutindo 500tão.

  6. Se dermos uma olhada na jurisprudência do STJ, o Tribunal da Cidadania, a respeito da execução cível, teremos uma boa ideia do porquê dessa conclusão de Lars Grael.

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