TJ-SP envia ao CNJ alegações sobre concurso

Frederico Vasconcelos

Ivan Sartori: Inconformados, reprovados buscam, “a fórceps”, renovar a prova oral

 

Para o TJ-SP, não cabe ao Judiciário substituir-se à comissão na atribuição de notas 

 

O presidente do Tribunal de Justiça de São Paulo, Desembargador Ivan Sartori, ofereceu ao Conselho Nacional de Justiça as razões finais da Corte sobre o questionamento dos critérios e procedimentos adotados no 183º Concurso de Ingresso na Magistratura.

Na peça enviada ao relator do procedimento administrativo, conselheiro Gilberto Valente Martins, Sartori reafirma “a legalidade, a regularidade e a lisura” do concurso, e diz que os requerentes, “inconformados com sua desclassificação por não terem obtido nota para aprovação no exame oral”, pretendem “buscar, a fórceps, a renovação dessa etapa e sua aprovação no concurso”.

Ele pede que sejam julgados improcedentes os pedidos de anulação do certame, e revogada a liminar que suspendeu o concurso.

Sartori diz que os reprovados buscam, “por meio de artificiosa criação mental”, creditar sua reprovação a suposto ato de puro arbítrio da Comissão de Concurso, em decorrência de sua entrevista pessoal”.

O presidente do TJ-SP cita decisão do CNJ sobre impugnação de concurso para ingresso na carreira da Magistratura do Estado de Santa Catarina, quando aplicou-se a orientação pacificada na jurisprudência do Supremo, “no sentido de que não cabe ao Poder Judiciário, no controle jurisdicional da legalidade, substituir-se à Comissão de Concurso nos critérios de correção de provas e de atribuição de notas”.

O TJ-SP entende que o julgamento pelo CNJ deve fixar como premissas a licitude e a regularidade dos atos praticados pela Comissão de Concurso: “Não se mostram razoáveis malabarismos interpretativos e a construção de raciocínios intrincados com o fim de se garimpar suposta mácula no apontado concurso”.

Sartori lembrou que o concurso já se estende há 19 meses: “Sua suspensão tem causado sérios e incalculáveis prejuízos ao Tribunal”. Finalmente, argumentou que “a suspensão da nomeação e posse dos aprovados agrava a carência de juízes de 1º grau, implica manter vagos cargos em dezenas de Comarcas e obriga o Tribunal a designar magistrados para acumular Varas, com prejuízo à celeridade e à qualidade da prestação jurisdicional”.

Eis alguns trechos do documento:

 

O 183º Concurso de Ingresso na Magistratura paulista foi o primeiro a aplicar a Resolução nº 75 do egrégio CNJ. Esse pioneirismo levou à adoção de procedimentos que, sem contrariar disposições expressas da aludida Resolução, trataram de superar entraves circunstanciais e preencher aparentes lacunas dessa importante normativa. Desta forma, jamais poderia ao Tribunal de Justiça de São Paulo ser imputada suposta recalcitrância no cumprimento da Resolução n. 75/2009, haja vista ser a primeira vez, repita-se, que a observava.

Para a solução dos casos, faltando à altura interpretação autêntica da Resolução nº 75, pelo próprio CNJ, tratou-se de aplicar o disposto no art. 88 da Resolução que “os casos omissos serão resolvidos pela Comissão de Concurso”.

(…)

Nenhuma impugnação houve, quanto aos exames orais, durante a realização dessa fase do concurso. Só se desfiaram reclamações depois da divulgação dos resultados.

(…)

A Resolução nº 75 do CNJ não veda, de forma expressa, a entrevista pessoal e, como exposto, nunca houve interpretação autêntica do Conselho Nacional de Justiça, consolidada em precedente seu.

(…)

A favor dessa entrevista concorriam o mais que secular costume nos concursos do Tribunal de Justiça de São Paulo e sua efetivação em vários concursos jurídicos atuais.

Além disso, o próprio egrégio CNJ, em sua Resolução nº 81 (relativa a concurso para a outorga de delegações de Notas e Registros Públicos), prevê a realização de entrevista pessoal, com o fim de aferir a personalidade do candidato.

(…)

A entrevista pessoal não influiu na atribuição de notas da prova oral. De fato, as notas individuais já estavam proferidas após o término de cada arguição, só faltando extração da média, o que se fazia ao final de cada sessão.

Essa entrevista permitia a aferição de dados da vida pregressa e atual dos concursantes e até mesmo seu confronto com o laudo de exame psicotécnico para, sendo o caso, aferir a conveniência de avaliações psicológicas complementares.

Note-se que a ocasião seria a primeira vez em que a Comissão de Concurso teria contacto pessoal com o concursante. Era exatamente a oportunidade para decidir se cabia ou não exame complementar psicotécnico. 

Não houve inclusão de fase indevida e não prevista no Concurso e tampouco tendenciosidade destinada a prejudicar ou favorecer qualquer candidato.

(…)

A entrevista foi realizada indistintamente com todos os candidatos, como forma de diligência complementar, sem caráter avaliatório ou eliminatório, visando a consolidar a investigação social e o exame da sua vida pregressa, vetusta tradição do Tribunal de Justiça de São Paulo, coerente com a intenção de se resguardar a privacidade dos candidatos quanto a seus dados pessoais, conforme previsto no edital do concurso.

(…)

Nenhuma regra expressa, na Resolução nº 75 do colendo CNJ, impõe a abertura, em sessão pública, dos envelopes, nos quais lacradas as notas do concurso. A sessão de abertura desses envelopes ocorreu na presença de toda a Comissão – incluídos os dois Advogados indicados pela OAB com a missão de fiscalizar o certame.

(…)

A Resolução nº 75/2009 do Conselho Nacional de Justiça e o Edital de Concurso não preveem que os envelopes contendo as notas do exame oral sejam abertos pelos membros da Comissão em sessão pública.

O artigo 81 da apontada Resolução apenas exige sessão pública para a identificação e divulgação dos resultados das provas, o que foi observado.

Já as notas dos candidatos reprovados no exame oral não foram divulgadas especialmente porque, nos termos do artigo 70, § 1º, da Resolução CNJ nº 75/2009, são irretratáveis.

Aliás, a prática de não se publicarem as notas dos reprovados já havia sido adotada, sem impugnação alguma, no que concerne aos resultados das provas escritas, com o fim de se preservar, na medida do possível, a reputação dos candidatos, como salientado nas informações prestadas pela Comissão de Concurso ao CNJ.

Buscou-se apenas, de forma prudente, evitar que a divulgação de notas baixas pudesse posteriormente, em outros concursos, servir de informação negativa e desabonar o candidato reprovado, como antecedente pessoal desfavorável. 

Comentários

  1. Se o TJ-SP quisesse realmente conhecer os candidatos e assegurar o ingresso dos melhores, deveria simplesmente abandonar esse entrevista – que, além de insuficiente para a alegada finalidade, ainda dá margem a dúvida sobre a lisura do procedimento e eventuais favorecimentos e perseguições. Deveria, quem sabe, adotar algo parecido ao praticado pelo TJ-RS: provas eliminatórias razoáveis (com relativa profundidade e sem “pegadinhas” e questiúnculas) e, depois, uma segunda fase do concurso com duração de 2 anos (salvo engano) para os melhores selecionado, consistente em um verdadeiro programa de trainee e no qual se busca, tanto quanto possível, o teste contínuo, reiterado e profundo de todos os participantes da 2a. fase. Aí, sim, é possível selecionar os melhores!

  2. Creditar o baixo número de aprovados a problemas das comissões de concurso é, no mínimo, ignorar os índices educacionais no Brasil. Mas tudo será resolvido com a criaçao de cotas para ingresso na magistratura.
    Enquanto isto, proliferam as faculdades caça níqueis e a educação continua ladeira abaixo. Alias, pobre civilização neste zeitgeist de populismo e nivelamento por baixo.

    1. É inegável que há incontáveis bacharéis em Direito com péssima formação. Contudo, os habilitados à prova oral passaram por outras três etapas, com a realização de quatro provas, uma de múltipla escolha e três escritas. Não dá para comparar esses candidatos com os reprovados no exame da OAB, por exemplo.
      No exame oral, havia candidatos que demonstravam conhecimentos jurídicos – e de humanística em geral – mais precisos do que alguns dos examinadores…
      É óbvio que nesse caso o problema deve ser atribuído à comissão do concurso. É só em SP que isso acontece…

      1. Por certo que os candidatos do concurso que passaram para a prova oral devem ser qualificados. Mas ainda não passaram no concurso.
        E os examinadores do oral são os mesmos das provas escritas. Quem examinará os examinadores, ad eternum?
        Por fim, entendo que em qualquer processo de admissão sério o empregador entrevista o candidato ao emprego.

  3. “por meio de artificiosa criação mental”
    Não foi essa mesma tese utilizada pelos patronos dos mensaleiros, ao se referirem à denuncia do PGR?

    O TJSP, ao invés de admitir que não seguiu como deveria a Res. 75 do CNJ, vem atacando, de forma pessoal, os candidatos reprovados. Insiste na tese de que lhes falta competência. O ilustre representante da ordem chegou a comparar os reprovados na prova oral do TJSP aos reprovados em exame de ordem.
    No MS 28286, com muita propriedade, a Min. Ellen Gracie faz um aparte e assim diz:
    Trecho do MS 28286
    33´38:
    Aparte da Min. Ellen Gracie:
    “Com base na experiência de Presidência de um tribunal regional e na condução do CNJ, eu acho que há uma questão que ninguém ainda enfrentou neste processo. Que é uma questão básica de má administração. Por que que um tribunal, por que um Estado, fica com menos de a quarta parte da sua força de trabalho área da magistratura? Por que que não se realizam concursos?
    Cezar Peluso: Em São Paulo se realizam concursos anualmente, Ministra!
    EG: está realizando mal Presidente. Para qualquer concurso que se vê nesse pais, há milhares de candidatos. Eu não acredito que não haja candidatos para magistratura paulista. Nem todos tão bem preparados como talvez gostassem os examinadores.

    Agora, quando uma banca examinadora reprova 60, 80% dos candidatos, o problema é da banca examinadora. Assim me parece que é o mais razoável.

    Então, o que nos temos, no fundo, é o problema de improvimento de cargos, de incúria, (… Peluso – é eficiência) de descaso ou de excesso de exigência. Não sei. É certo que é preciso preencher esses cargos. Ou senão teremos eternamente o mesmo problema.
    Peluso: o Conselho tem que examinar esta situação, se está havendo omissão, desídia, negligência, ou alguma outra deficiência na administração do poder judiciário estadual. Nesse caso, o conselho responsabiliza os órgãos diretivos do tribula local, sem prejudicar o direito constitucional dos juízes…”

    1. Faltou acrescentar que há no País cerca de 5 milhões de bachareis em direito. Será que em meio a todo esse pessoal (cuja “população” é maior do que a de muitos países) não dá pra escolher 100? E o mais desolador disso tudo é verificar, no final das contas, o preparo técnico e psicológico dos juízes paulistas…

  4. O presidente do TJSP, antes de tomar posse, deu entrevista dizendo ser contra a contratação de novos juízes – seria menos dispendioso contratar assistentes jurídicos (cargo em comissão provido sem concurso público) para dar conta do grande número de processos do TJ.
    A propósito, um dos candidatos que buscam a aprovação a “forceps” foi citado como doutrinador por um ministros do STF no julgamento do mensalão, para fundamentar seu voto.
    Falta-lhe conhecimento jurídico???

  5. “Essa entrevista permitia a aferição de dados da vida pregressa e atual dos concursantes e até mesmo seu confronto com o laudo de exame psicotécnico para, sendo o caso, aferir a conveniência de avaliações psicológicas complementares.”

    >Agora os examinadores também podem realizar avaliação psicossocial dos candidatos e analisar sua vida pregressa ali, na hora do bate-papo. Curioso!

  6. Fórceps? Mas Mas não é o CNJ, nos termos da Constituição Federal, o Órgão encarregado de fiscalizar a atuação administrativa do Poder Judiciário e receber representações relativos a desvios? Não foi o próprio CNJ quem regulamentou os concursos públicos no âmbito de todo o Judiciário?

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