Entrevista secreta foi a grande derrotada

Frederico Vasconcelos

A seguir, avaliação do juiz de direito Marcelo Semer, ex-presidente da Associação Juízes para a Democracia, sobre a decisão do Conselho Nacional de Justiça determinando a realização de nova prova oral com os candidatos não aprovados no concurso do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo. Juiz do TJ-SP, Semer foi um dos primeiros magistrados a alertar para as distorções da entrevista reservada nos concursos públicos.

Os setenta aprovados vão tomar posse. Os reprovados terão uma nova oportunidade. No concurso do Tribunal de Justiça de São Paulo quem saiu derrotada mesmo foi a entrevista reservada –reprovada por ampla maioria.

Demorou, mas a ficha caiu.

A entrevista não é de fato nenhuma novidade. É uma tradição de décadas, mas nem por isso menos equivocada.

No âmbito de um concurso público, não há espaço para uma entrevista secreta que perscrute o íntimo ou o ideológico dos candidatos, porque estes não são critérios para escolha de magistrados.

No estado laico, não há como levar à discussão a religião dos candidatos; no espectro republicano, não há possibilidade de vetos por tutela ideológica ou por preconceito de qualquer origem.

Compatibilidades ou preferências privadas não resistem ao escrutínio de um concurso público.

A única forma de evitar que tais constrangimentos perdurem é levar ao extremo a regra da publicidade do interesse público: o que não pode ser dito em público, não pode ser feito em nome dele.

Comentários

  1. Conta a lenda que num concurso já antigo de São Paulo o examinador perguntou ao candidato, durante a entrevista, o que ele faria se a mulher do promotor da comarca “desse mole” para ele. Em termos solenes, claro, mas a pergunta foi esta.

  2. A entrevista está sepultada. A questão da vocação para o cargo fica para apreciação ou nas outras fases ainda mantidas ou para o estágio probatório. Na atual conjuntura de perda de prestígio, renda e ganho somente de ataques, a vocação pode ser aferida também no momento da inscrição para o concurso. Mais alguns anos nessa toada e a Magistratura será alvo de fuga…

  3. Concordo. O que não pode ser dito em público, não pode ser feito em nome dele. A melhor forma de favorecer alguém injustamente é manter entrevistas privadas. A porta fica escancarada para a corrupção.

  4. Perfeito o texto. Não entendo como a entrevista secreta poderia impedir o “aparelhamento” da Magistratura pelos membros do Partido no poder. Que Partido? Que poder? Todos os candidatos são submetidos a rigorosa investigação de sua vida pregressa durante o concurso, ali sim é possível aferir suas preferências, religião ou ideologia, porém, como muito bem colocado no texto, “o íntimo ou o ideológico não são critérios para a escolha de candidatos”.

  5. Discordo. A entrevista é muito importante, pois serve para descobrir se o candidato tem realmente vocação para a magistratura. Serve ainda para impedir o “aparelhamento” da magistratura pelos membros do Partido no poder. E ainda assim alguns “companheiros” acabam entrando e virando “democratas” que prestam homenagens a “grandes homens” como Stédile do MST…

    1. Mas porque acredita que os magistrados, componentes da banca, agindo secretamente estarão “descobrindo se o candidato tem reamente vocação para a magistratura? Em um País marcado pelo apadrinhamento, desde as épocas mais recuadas, como o cidadão vai saber se o magistrado agiu corretamente ao “descobrir” a suposta vocação em entrevistas privadas?

      1. È isso aí Marcos. Daqui a pouco essas críticas acabam e o novo concurso será uma virada de mesa no judiciário paulista, com referencia a concurso público para o cargo de julgador.

    2. E como fica ainda o princípio constitucional da publicidade? É melhor rasgar a Carta da República neste casos, e implantar a “república dos magistrados”, ou melhor a “república ricardiana”?

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