Desfechos da fraude que Severo confirmou

Frederico Vasconcelos

A leitora Ana Lúcia Amaral, Procuradora Regional da República aposentada, sugere que o Blog revele os desdobramentos do caso das importações superfaturadas de equipamentos israelenses durante o governo de Orestes Quércia (PMDB), fraude confirmada por Severo Gomes, secretário de Estado de Ciência e Tecnologia no governo do sucessor, Luiz Antônio Fleury Filho, conforme post publicado neste sábado (12/10).

Eis algumas informações que estão no livro “Anatomia da Reportagem”, de autoria do editor deste Blog, obra publicada pela Publifolha, em 2008:

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Quércia conseguiu eximir-se da responsabilidade por uma compra sem licitação de equipamentos para as polícias e para as universidades do Estado, no total de US$ 310 milhões. Por 16 votos a três, o STJ rejeitou a denúncia de estelionato contra o governador. Entendeu que não havia elementos para a abertura de ação penal.

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O ex-senador Severo Gomes (PMDB), então secretário de Ciência e Tecnologia do governo Luiz Antônio Fleury, sucessor de Quércia, suspeitava da formação de um caixa para a campanha presidencial que poderia chegar a US$ 100 milhões.

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Um desses documentos comprobatórios foi publicado em outubro de 1992, quando a Folha destacou em manchete: “Quércia Autorizou as Compras Suspeitas”. O texto afirmava: “O ex-governador Orestes Quércia autorizou –de próprio punho– as importações irregulares de Israel. O fato, comprovado em documento obtido pela Folha, contrasta com a decisão do juiz João Carlos da Rocha Mattos, que isentou Quércia de responsabilidade pelas compras suspeitas”.

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A pá de cal no caso das compras superfaturadas seria jogada 12 anos depois da primeira reportagem. Em fevereiro de 2003, a Folha estampou o seguinte título: “Supremo Decide Arquivar Processo que Envolve Fleury”.

“Graças a um expediente processual permitido pelo foro privilegiado, o STF decidiu que não poderão sofrer nenhuma punição os responsáveis pelas importações, sem licitação, de equipamentos superfaturados de Israel no final do governo Orestes Quércia (87-91) e arquivou definitivamente o caso”.

A reportagem informava que foram beneficiados os ex-secretários Fleury Filho (Segurança Pública), Luiz Gonzaga Belluzzo (Ciência e Tecnologia) e José Machado de Campos Filho (Fazenda), além dos intermediários da operação, os empresários liderados por Arie Halpern, da Trace Trading Company.

O ministro Maurício Corrêa, do STF, determinou o arquivamento a pedido do então procurador-geral da República, Geraldo Brindeiro, por alegada prescrição. Por seu estilo, Brindeiro ficaria conhecido como “engavetador-geral” da República.

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O foro especial garantido ao deputado Fleury (PTB-SP) permitiu que subissem ao STF processos envolvendo acusados sem direito àquela prerrogativa. Com a medida, foi extinta uma ação penal contra Belluzzo, Machado e dirigentes da Trace, cuja denúncia sob acusação de estelionato havia sido recebida em 1999, por unanimidade, por 15 desembargadores do Tribunal Regional Federal, em São Paulo. Fleury não havia sido denunciado nessa ação, mas se livrou de um inquérito criminal que se arrastava desde o início dos anos 90.

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Brindeiro subscreveu parecer do subprocurador-geral Raymundo de Bonis, que viu semelhança e conexão entre um inquérito sobre importações da Alemanha Oriental, iniciadas no governo Franco Montoro, sem suspeita de sobrepreço, e as compras de Israel. Bonis aposentou-se depois de pedir o arquivamento.

O processo criminal tramitava na 4ª Vara Criminal, em São Paulo. Ao vislumbrar possível “conexão” com o inquérito contra Fleury, que fora arquivado, o juiz João Carlos da Rocha Mattos considerou-se “incompetente” para prosseguir julgando a ação criminal. Rocha Mattos “revogou” o despacho em que recebera a denúncia contra Belluzzo, Machado e os empresários da Trace e enviou os autos ao STF, o que também contribuiu para o arquivamento do caso.

Trechos da reportagem publicada na Folha em 25 de fevereiro de 2003:

“Eu não queria que o caso terminasse dessa maneira, pois gostaria de provar a minha inocência”, diz o deputado federal Luiz Antônio Fleury Filho.

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O ex-secretário Luiz Gonzaga Belluzzo diz que “o processo acabou, tudo que se possa dizer ultrapassa a decisão judicial, que é definitiva”. Belluzzo diz que “gostaria que tivesse havido o contraditório”, pois entende que foram mais destacadas as posições do Ministério Público Federal e acusações pela imprensa.

Arie Halpern, da Trace, não quis se manifestar.

Comentários

  1. Olá! Caros Comentaristas! E, Fred! Após a conclusão da ação criminal 470 – mensalão – imagino que serão beneficiados tanto o COAF quanto às varas especializadas no crime organizado. Ainda, a sociedade sentirá o que não sente desde sempre: alguma resposta ao crime “intelectual”, até este processo 470, jamais analisado. É um passo incipiente, porém, importante. E vem ai, o mensalão do, “cachoeira”, poderá ser um segundo momento e com certo aperfeiçoamento e aproveitamento processual repaginado, no sentido de conter ou minimizar a corrução e a improbidade. O que se deve evitar é transformar a sociedade em “VIGIA” dos criminosos. Para isso é necessário fortalecer os órgãos de segurança e de inteligência com: RECURSOS, EQUIPAMENTOS, TECNOLOGIA DE ALTA PERFORMANCE, REMUNERAÇÃO CONDIZENTE COM A IMPORTÂNCIA DA FUNÇÃO. Isso implica, laboratórios, instalações seguras e tecnologicamente robustecidas. Não adianta comprar com licitações – ferro velho! A sofisticação do crime organizado, lavagem de dinheiro, tráfico de pessoas, armas, tráfico de numerários, e outros, Não se combate com “MIGALHAS do e no ORÇAMENTO”, para segurança pública e segurança nacional, coisas naturalmente, diferentes. E, precisam estudar mais, os Ministros do STF, sobre as peculiaridades e circunstâncias que vão do crime conhecido até o terrorismo. Em outras palavras: Voltar aos Bancos Escolares institucionais dos centros brasileiros em excelência nessa matéria. Leis por si, ou boa vontade, sem um pensamento adequado ao tema e treinados para o tema; a justiça vai perder de goleada. E, precisa um novo pacto nacional contra isso: Legislativo, executivo e judiciário, – comprometidos – “fechados na correção e na ideia de ofertar novos rumos”. Ai sim, os ajustes necessários serão produzidos e terão eficácia e serão eficientes. Os resultados aparecerão. E a “GRANA” furtada e as vezes roubada, poderá ser repatriada e localizada e apreendida ou apropriada pelo ESTADO, para voltar aos Cofres Públicos e ter o destino adequado, imaginado pelo povo, contribuinte, quando TRIBUTADO! Portanto, sem ilusão, são ações integradas ou resultarão em vitória de PIRRÔ! Que o diga, SEVERO! OPINIÃO!

  2. Olá! Caros Comentaristas! E, Fred! Discordo da opinião de José Afonso! Na origem da corrupção e do incentivo à improbidade encontra-se o congresso nacional, deputados e senadores, nos estados às assembléias legislativas e nos município as câmaras de vereadores. É bem verdade que o judiciário poderia dar sua contribuição mais eficiente e eficaz se fosse mais rápido, entretanto, sabemos todos que: O executivo NÃO disponibiliza os instrumentais necessários para tal agilidade e o legislativo legisla de maneira que tudo se retarde. Portanto, culpar o judiciário é o mesmo que fez o TSE culpando o eleitor/a de ter cumprindo sua obrigação nas urnas. VOTADO! Se, vota: é punido por discordar da opinião da casa grande e se NÃO vota é punido por NÃO votar! Algo fantástico! Coisa IRREAL e, maldosa. E a comentarista Ana Lúcia Amaral fez bem de chamar atenção para os desdobramentos. E o Fred foi Bem por divulgar. E, salvo engano, o Geisel frente ao Médici foi um presidente bonzinho. E sempre contar por inteiro os fatos é melhor. Boa sugestão Ana Lúcia Amaral! O duro é quando a gente conta, ou só analisa metade da história! OPINIÃO!

  3. Sugeri o resumo, pois são fatos ocorridos há 20 anos, e uma geração mais jovem não teria maiores informações, se já não tiver lido o livro. Ademais, como funcionou o Poder Judiciário, na espécie, é relevante.

    Concordo com o comentário do Sr. José Afonso sobre a responsabilidade do Poder Judiciário sobre o grau de impunidade que se alcançou no país.

    Mas não acredito que será a grande virada o julamento do mensalão.

    O encaminhamento do julgamento da ação penal 470, no que se refere à lavagem de dinheiro, considerando o recebimento em espécie, por interpostas pessoas, como mero exaurimento do crime da corrupção, demonstra a falta de conhecimento das razões da lei, ou pouca disposição para condenar mais severamente certas condutas.

    Entenderam os que absolveram o grupo de parlamentares do PT e o ex-ministro Anderson Adauto, na sessão do 11/10/2012, que aqueles réus não conheciam a origem ilícita do dinheiro. Ora, o denominado caixa 2, cantado em prosa da tribuna do STF, e considerado normal pelo ex-presidente da República, não era conhecido daqueles mesmos políticos? Por que tinham que receber valor e espécie e por interpostas pessoas? Por que não poderiam receber os valores via transferências bancárias?

    A ocultação seria mero exurimento, se o próprio agente escondesse no quintal de casa, sem a intervenção de terceiros.

    E se as despesas com eleições eram reais, por que tal forma de recebimento???

    O min. Marco Aurélio, para combater a aplicação da lei de lavagem, veio com discurso meio estranho: advogados remunerados com recursos, produto de crime, poderiam ser incriminados.

    Em países mais sérios no combate lavagem, réu acusado da prática de tal crime, não pode pagar honorários a nenhum advogado para defendê-lo, pois não pode se beneficiar do produto do crime,e mais ninguém pode usufruir dele. É indicado defensor público.

    Portanto, passado o julgamento do mensalão, por não termos um povo tão cioso da legalidade, algumas condutas resistirão ao efetivo combate. Receio que o crime de lavagem de recursos ainda não tenha o efetivo combate.

    Já imaginaram se houvesse tal previsão no Brasil??

    1. Perfeito comentário. É considerar os réus oligofrênicos por não “perceberem” a origem ilícita do dinheiro e, ademais, considerar explicitamente que é legal e moralmente aceitável advogados receberem o dinheiro de origem criminosa, dinheiro, diga-se, que deveria voltar aos cofres públicos.

  4. E alguém duvida que o Supremo, por maioria, não enterraria também o mensalão se não fosse a pressão popular, como o STJ enterrou todas as grandes operações da PF? Operações, diga-se, com provas bem mais contundentes.

    A Corte votou com a “faca” imaginária no pescoço e por puro senso de sobrevivência, já que em caso contrário seria exaurida qualquer legitimidade do pouco que ainda tinha.

    O Poder Judiciário é o principal responsável pela impunidade da corrupção endêmica deste país.

    Com a ação penal 470 pelo menos temos a esperança de um começo de mudança de postura, no entanto, como a fila é grande, somente com muitas outras condenações teremos condições de análise se o Poder Judiciário deixou ou não de ser guarita segura para a impunidade dos larápios da nação.

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