Tempo, prestígio e defasagem entre Juízes
Sob o título “E como ficam os Juízes?”, o artigo a seguir é de autoria de Pedro Luiz Pozza, juiz de direito no Estado do Rio Grande do Sul. Foi publicado originalmente em seu blog (*).
Nota na coluna RADAR da Revista VEJA de 24.10.2012 refere os custos suportados (nem tanto) pela Universidade GAMA FILHO, do Rio de Janeiro, para transportar de jatinho os Ministros Lewandowski e Dias Toffoli de Brasília ao Rio de Janeiro, em várias oportunidades. Lá eles iriam, segundo consta, para dar aulas no citado estabelecimento de ensino.
Considerando o custo desse transporte (quase quarenta mil reais por viagem), pode-se imaginar o que os citados Ministros percebem para lecionar na Gama Filho. Deve ser uma verdadeira fortuna.
Isso traz à tona a verdadeira remuneração dos Ministros do STF, que salvo o cargo de Juiz, só podem ter um cargo de magistério superior.
Será que realmente um Ministro do STF pode viver em Brasília com cerca de dezesseis mil reais líquidos? Por certo que não. Talvez um ou outro deles, se viver modestamente, consiga.
Mas ao que parece nem todos levam vidas modestas.
Sabe-se, ainda, que o Ministro Gilmar Mendes até ha pouco tempo era sócio do IBDP, cuja participação teria sido por ele vendida por uma expressiva quantia.
Talvez outros Ministros também tenham a mesma sorte, com fontes de renda outras que não exclusivamente a magistratura e o magistério superior.
Mas que fique bem claro: não se está aqui a dizer que os juízes da Suprema Corte teriam rendas de origem duvidosa, mas que essas rendas seriam tão expressivas a ponto de tornar os subsídios apenas um complemento de uma renda muito maior.
Esse, por certo, é o principal motivo pelo qual não se ouve dos Ministros do STF (salvo do Presidente, obrigado à liturgia do cargo) uma manifestação decisiva e contundente em favor do reajuste de seus subsídios, única forma de os demais juízes, em especial os do primeiro grau de jurisdição, terem de fato um incremento em seus vencimentos, praticamente congelados há vários anos.
A grande maioria do juízes não têm tempo – nem o prestígio de Ministros – para o magistério, pois a jurisdição deles exige por demais. Assim, a única renda de que dispõem quase todos os magistrados deste país são os seus subsídios.
Entretanto, não têm força para obter um reajuste nos seus vencimentos. Quem têm realmente força são os Ministros do STF e dos Tribunais Superiores. Esses, todavia, pouco ou nada fazem por aqueles que realmente precisam.
Está na hora de a AMB levantar a voz e lutar realmente pelos seus associados, rompendo seu silêncio.
Do contrário, só resta aos juízes esperar pelo novo Presidente do STF, o Ministro Joaquim Barbosa.
Só há um caminho a percorrer e que não eh o da inação e do dialogo…
Eh um governo de sindicalistas, não se esqueçam!!!
Exemplificando como os juízes tratam a questão dos honorários:
“A 3ª Turma do Superior Tribunal de Justiça elevou de R$ 10 mil para R$ 500 mil o valor de honorários advocatícios a serem pagos pela Publicar do Brasil Listas Telefônicas em caso que envolvia a execução de R$ 22,4 milhões. Os ministros acataram Recurso Especial da Telelistas para aumentar a verba.
Para o ministro Villas Bôas Cueva, relator do recurso, o valor de R$ 10 mil é irrisório. Isso porque a exceção de pré-executividade apresentada pela Telelistas foi acolhida, acarretando a extinção de execução em que o valor da causa era R$ 22,4 milhões. “Em hipóteses como a dos autos, justifica-se a intervenção excepcional do STJ, de modo que devem ser majorados, nos termos do parágrafo 4º do artigo 20 do Código de Processo Civil”, explicou o ministro.” (fonte: http://www.conjur.com.br/2012-out-24/stj-eleva-honorarios-10-mil-500-mil-causa-milionaria).
Ninguém disse que juiz é Deus. Longe disso. Juiz é homem. Juiz é mortal. Juiz é pó e ao pó voltará.
Mas a missão de julgar é divina. Disso, ninguém duvida.
E é justamente por isso, é justamente porque exercem tarefa tão excelsa, que homens mortais, em corpos perecíveis, sentem tanto o peso de desempenhar uma missão que é divina.
O homem, em sua essência, não nasceu preparado para julgar. Por isso os juízes sentem tanto o desgaste do exercício diário da magistratura.
As pessoas que não julgam não entendem isso. Acham que os juízes exageram em suas lamúrias e que reclamam debalde.
Ora, como um corpo frágil e perecível pode suportar tamanha responsabilidade? Como sendo homens poderiam praticar atos essencialmente divinos sem prejuízo para o corpo perecível?
Daí a necessidade de remunerar condignamente os magistrados, a fim de compensar o intenso desgaste físico e mental decorrente do exercício da missão de exercer parcela da onipotência divina.
Godoy, com todo o respeito, talvez umas férias, somadas quem sabe a uma releiturazinha do texto constitucional, tirasse um pouco você desse mundo de devaneios. O ato de julgar nada tem de divino, juiz é tão somente um servidor público , especial é bem verdade, assim como outros, apenas isso… Ah, e o Brasil , apesar de todos os problemas, é uma democracia, o povo é que é o soberano meu caro, o povo.
Não se deve assumir a sua verdade como a verdade de todos os outros. A crença em uma missão divina é particular e individual. Um juiz deveria se abster de qualquer fé em seu trabalho, pois tal fé pode contaminar suas decisões. Além disso, o ofício de juiz é uma opção pessoal e não um sacrifício ou ato de heroísmo. O ato de julgar é predominantemente técnico e ao juiz cabe, quando não tecnicamente possível, interpretar. Não há nada de divino nisso. Os juízes realmente merecem ganhar mais, porém precisam, antes disso, tornar juridicamente inviável qualquer salário ou ganho do serviço público que chegue perto de seus rendimentos. Sugiro começar pelos servidores da Câmara dos Deputados e do Senado, que auferem salários abusivos. Servindo-se de uma malandragem jurídica, evitam a transparência total da divulgação de seus salários. Uma vez que os juízes tomem a decisão corajosa de limitar estes salários, aí sim acredito que os ministros, desembargadores e juízes mereçam seu justo aumento.
Não tem nada de divino na atividade jurisdicional. É um trabalho técnico, de alta complexidade (e atualmente, no Brasil, de alta periculosidade), que exige grande resistência física e mental, paciência.
Aliás, por lei, não pode ser cumulado com outras funções, exceto o magistério.
Assim, o juiz tem que ser bem remunerado, no mínimo com a reposição prevista na Constituição Federal.
Sem a remuneração condigna, a independência dos juízes corre risco.
Os advogados nada têm a ganhar com a derrocada do Poder Judiciário e da magistratura, muito antes pelo contrário.
Concordo com grande parte do texto, teve coragem, mas, uma vez mais, digo que parte desse problema é culpa da própria magistratura (a maioria, não todos), que assiste ‘calada’ ao que acontece nos Tribunais Superiores. Basta ver o TST comprando uma estátua de R$ 300.000,00, quando parte da estrutura de algumas varas do Trabalho no país ainda é sofrível. O mesmo ocorre com o quinto constitucional, uma aberração, tão criticado na 1a. instância e tão esquecido depois da promoção para desembargador.
“Será que realmente um Ministro do STF pode viver em Brasília com cerca de dezesseis mil reais líquidos? Por certo que não. Talvez um ou outro deles, se viver modestamente, consiga.”
“Mas ao que parece nem todos levam vidas modestas”.
Não meu caro amigo !!!! Um juiz não consegue viver com 16 mil em Brasília, mas perguntemos a um pai de família que consegue SOBREVIVER com uma salário mínimo no subúrbio de SP, como ele se sente.
Júlio,
Bom discurso. Vamos nivelar todos pelo pior exemplo possível. Por que não citar os pomposos ganhos dos administradores de estatais? Entre eles, alguns ministros de Estado.
E isso tudo, apenas porque se está a criticar o descumprimento de um direito mínimo: a igualdade de condições entre juízes e a recomposição salarial depois de anos sem reajustes e em arrepio à Constituição.
Os juízes proletarizados de hoje fazem até greve para obter a almejada reposição inflacionária!
O próximo passo é entrar em conflito com a PM e levar gás de pimenta na cara.
Os juízes estão se rebaixando. Onde já se viu juiz fazer greve como se fosse um trabalhador normal.
Ora, juiz é – pelo menos em tese – representante de um dos Poderes da República. Se bem que, no caso, estamos falando de uma espécie de “Subpoder”, que é o Judiciário. De qualquer forma, tratando-se de Judiciário, por mais menoscabado que o Judiciário esteja atualmente, os juízes precisam manter a postura.
Como samurais, os juízes devem morrer com dignidade. Se é para passar fome em razão do congelamento salarial, que passem fome com dignidade, como sacerdotes, como samurais cuja honra é o atributo mais importante.
ainda existem samurais? eu pensei que o último fosse tom cruise.
Nananinão… prefiro tomar gás de pimenta na cara do que deixar de lutar por um direito assegurado na Constituição. A inação é tudo que o partido do poder quer da magistratura… Este negócio de manter a postura é ridículo. Honra todos tem, mas ninguém consegue pagar as contas no final do mês com ela.
A magistratura caminha a passos largos, e de modo irreversível, para a plutocracia (sistema no qual o poder é exercido pelos mais ricos).
Sem remuneração condigna, como já se verifica hoje, apenas os mais ricos optarão pela carreira de juiz. É que, como são ricos, não precisam do salário de juiz para sobreviver. A magistratura apenas lhes servirá de status, poder e prestígio.
Já os pobres não optarão pela magistratura, porquanto escolherão carreiras que, embora sem insuplantável prestígio da toga, são economicamente mais atrativas, como o ministério público, a defensoria pública, a advocacia pública e os cartórios extrajudiciais.
Isso não é novidade. Antigamente já era assim. A magistratura nada mais era do que o título e a pessoa comprava. Inclusive o título de magistrado era uma qualificado como propriedade que se transmitia por herança.
Aos poucos, palmilha-se para a restauração desse estado anterior de coisa, o que só demonstra que a História vive de ciclos.
Godoy,
De verdade, juiz não é Deus.
A magistratura não é “bico”. Não é “extra”.
Não duvidem. Com a piora dos vencimentos, certamente haverá muitos que tentarão a sorte na iniciativa privada, como aconteceu no começo dos anos 2000. Uns virarão advogados, outros montarão cursos, outros tantos darão tantas aulas que acabarão deixando a vara de lado. Isso sem falar dos que prestarão defensoria, MP e cartórios…
Não só, acredito eu, os Ministros. Creio também que tais situações podem estar retratadas nos TJs, pois ainda não escutei reclamos de Desembargadores quanto aos subsídios e vejam que o custo de vida nas capitais é superior aos das comarcas interiorizando.
Excelente texto.
Comentários de recalcados em três… dois… um…
Está na hora de a AMB, os juizes, a magistratura, os Tribunais Superiores levantarem a voz e lutarem realmente pelos necessitados. Isso sim.
Já se luta pelos mais necessitados há muito tempo. Exemplos: ficha limpa, PEC contra trabalho escravo, medidas contra a PEC do calote, contra a terceirização de mão de obra, pela redução de acidentes do trabalho, aulas de justiça e cidadania em escolas, projetos anti-corrupção com penas mais severas, prêmios de direitos humanos…enfim, basta ver os sites das associações de juízes, já que esse trabalho não é muito divulgado fora deles.
Sem falar na parentela toda deles que trabalham em grandes escritórios de advocacia e com um simples sobrenome defendem clientes milionários.
Resumiu perfeitamente a realidade dos magistrados de primeiro grau. Parabéns.
Parabéns pelo brilhante texto, caro Pedro Luiz Pozza!!