Juízes têm tratamento distinto em viagem

Frederico Vasconcelos

Convidados vão à Alemanha com diárias em dólar; juízes sorteados pagam despesas

A seguir, reportagem do editor deste Blog, publicada neste domingo (28/10) na Folha, sob o título “Ministros do STJ vão à Europa de primeira classe”:

Ministros do Superior Tribunal de Justiça e presidentes de Tribunais Regionais Federais embarcam neste final de semana para uma visita a tribunais e universidades da Alemanha. Viajarão em primeira classe e terão todas as despesas pagas pelo erário, com diárias antecipadas em dólar. Sorteados para participar da mesma comitiva, dez juízes federais pagarão do próprio bolso os gastos com transporte aéreo, hospedagem e alimentação.

A viagem, de 27 a 31 de outubro, é parte de programa de intercâmbio criado em 2010 pela Corregedoria da Justiça Federal na gestão do ministro Francisco Falcão, hoje Corregedor Nacional de Justiça.

Seu sucessor, ministro João Otávio de Noronha, disponibilizou as dez vagas para sócios da Ajufe (Associação de Juízes Federais do Brasil), que custeará apenas as despesas de transporte terrestre, em ônibus, entre Berlim, Leipzig e Munique.

Alguns magistrados veem a extensão do convite aos juízes como forma de diluir a imagem de um tour internacional com recursos públicos e limitada troca de conhecimento científico. O evento será em alemão, sem tradução simultânea. O programa prevê palestras de cerca de 15 minutos em cada tribunal.

Além do ministro Noronha, viajarão como convidados os ministros do STJ Isabel Gallotti e Sidnei Beneti, os membros efetivos do Conselho da Justiça Federal, presidentes dos tribunais regionais federais da 2ª, 3ª, 4ª e 5ª Regiões, Maria Helena Cisne, Newton de Lucca, Marga Tessler e Paulo Roberto de Oliveira Lima, e o presidente da Ajufe, Nino Toldo.

“Trata-se de evento oficial nas universidades e tribunais alemães, conforme termo de cooperação e não se concebe como em visita oficial os ministros tenham que ir do próprio bolso”, afirma Márcio Mafra, juiz auxiliar do CJF, coordenador da missão.

“Indiscutivelmente, é um passo importantíssimo na inserção internacional de divulgação científica do direito brasileiro e das experiências recíprocas”, diz o magistrado.

Um bilhete ida e volta para a Alemanha, em primeira classe, saía ontem por US$ 10.939 (R$ 22.173) no site da Decolar.com.

No programa de intercâmbio, não há reciprocidade em termos de custos. Professores e magistrados alemães que participaram de seminários em Recife, Florianópolis e São Paulo tiveram as despesas pagas pela Justiça Federal. Em São Paulo, o seminário foi organizado pela Fundação Álvares Penteado, com patrocínio do Banco do Brasil e do governo federal.

A “2ª Visita a Tribunais Superiores da Alemanha” é promovida pelo Instituto de Direito Processual Civil Alemão e Comparado da Universidade Albert-Ludwig, de Friburgo, Alemanha. Será assinada a prorrogação de acordo de cooperação entre o Conselho da Justiça Federal e as Universidades de Berlim e de Friburgo.

Resolução do Conselho da Justiça Federal, de 2008, estabelece que nas viagens aéreas ao exterior os membros do Conselho utilizam a primeira classe. E prevê o pagamento de diárias em dólar (permitida conversão para euros) em viagens no interesse da administração.

“Não se trata de uma mera visita, mas de uma participação ativa dos ministros do Superior Tribunal de Justiça, das presidências dos tribunais regionais federais, que também são conselheiros do Conselho da Justiça Federal, e do presidente da Ajufe”, diz Mafra.

Segundo o organizador da viagem, a extensão do convite à Ajufe, “sem qualquer ônus público ou para a entidade, tem o intuito de propiciar maior intercâmbio de nossos juízes com o sistema alemão”.

Mafra diz que pretende incluir no programa a Universidade de Brasília, para oferecer um curso de mestrado com dupla certificação para estudantes dos dois países e juízes federais brasileiros.

O presidente da Ajufe, Nino Oliveira Toldo, diz que um dos objetivos da entidade é “incentivar o estudo do Direito, por meio de cursos, convênios e viagens, com entidades afins, no Brasil e no exterior”.

Por dispositivo estatutário, as despesas de passagens aéreas e hospedagem do presidente da Ajufe são pagas pela entidade. Sua assessoria informa que Toldo viajará à Alemanha na classe econômica.

O Tribunal Regional Federal da 3ª Região informa que as despesas com programas de intercâmbio se enquadram no Plano Nacional de Aperfeiçoamento de Pesquisa para Juízes Federais/PNA.

Segundo o tribunal, a escola da magistratura se ocupa da organização pedagógica dos eventos, não sendo ordenadora de despesas. Mas há previsão orçamentária anual para este tipo de despesa, sendo o TRF-3 fiscalizado por seu controle interno e pelo Tribunal de Contas da União.

Comentários

  1. Devo dizer que não me sinto bem pagando viagens de primeira classe para funcionários públicos. No meu modo de ver, essa classe de trabalhadores existe para servir, não para serem servidos.

      1. Concordo, mas não creio que a questão seja religiosa. Dizer que servidores públicos existem para servir, não para serem servidos, é a própria essência do regime republicano.

  2. O presidente do STJ voar de 1a classe é razoável, dada a importância do tribunal.
    Mas só ele. Os vogais e presidentes de tribunais subalternos deveriam viajar como os demais servidores públicos viajam: classe econômica ou, eventualmente nas viagens longas, executiva.

    1. Cleberson,
      Mesmo sendo nascido na Alemanha, eloe NÃO FOI nessa viagem. Ontem participou da abertura de evento no STJ.Pelo menos ví a notícia.

  3. Independentemente de quem esteja pagando as despesas, acredito que melhor seria se estivesse fazendo o serviço para o qual são pagos. Naturalmente, para o Executivo é ótimo porque enquanto os magistrados viajam, as ações movidas contra a União não são julgadas.

  4. Engraçado: os ministros do STJ e os presidentes dos TRFs – todos nomeados pelo presidente da república – têm suas passagens custeadas pelo erário.

    Já os juízes federais de 1ª instância – que prestaram concurso público de provas e títulos – pagam do próprio bolso.

  5. É por isso que não há dinheiro para a interiorização da Justiça Federal.

    Enquanto a Justiça Federal viaja para “relevante” evento jurídico na Alemanha, a pobre Justiça Estadual carrega nas costas os processos federais.

    No Estado de São Paulo, toda a Justiça Federal da 3ª Região possui no total 1,6 milhões de processos em andamento em unidades judiciais federais.

    Já a Justiça Paulista tem sob seu comando nada menos que 1,5 milhões de processos federais em tramite na Justiça Estadual por força da chamada jurisdição federal delegada.

    Ou seja, em São Paulo, podemos dizer que há uma Justiça Federal dentro da Justiça Estadual.

    Mas obviamente não há interesse dos magistrados federais em instalar mais Varas Federais no interior do Estado. Afinal, ações previdenciárias e executivos fiscais em regra não dão notícia.

  6. Quando o exemplo não parte de cima, o que dirá dos que ficam em baixo. Precisava primeira classe ou classe executiva??? Claro que não. Alguém ai para ingressar com uma ação popular para ressarcimento ao erário?

  7. Fred, sera’ que eu entendi direito?
    Nossos magistrados superiores vao com as despesas pagas pelo erario e os magistrados deles vem com as despesas pagas pelo mesmo (nosso) erario ?
    E quando nao, sao bancados pelo Banco do Brasil (dinheiro publico) ?
    Imagino que haja tremendos ganhos tecnicos na magistratura para compensar investimentos dessa monta.

  8. Mas precisam ir de classe executiva ou primeira classe com recursos públicos?

    Perguntaria às S.Exas. se quando viajam pagando suas contas se sempre só viajma de classe executiva…

    1. Os magistrados vão. Mas a princípio voltarão para o Brasil.

      Pior será se os magistrados fizerem como o procurador da república, que foi estudar no exterior e acabou se mudando para lá!

      Sim, foi e ficou! É o caso do membro do Ministério Público Federal que mora em Roma onde faz doutorado, exercendo a função ministerial à distância, usando o processo eletrônico.

      A notícia está aqui:

      http://www.conjur.com.br/2011-jun-19/processo-eletronico-permite-procurador-trabalhe-roma

      Estamos no Brasil, pessoal!

      Por que tanta surpresa?

        1. O Estado só pagará a passagem aérea executiva ser for necessário realizar as atividades de atendimento ao público, diligências, inspeções, visitas em presídios federais, inquirições de testemunhas no âmbito dos inquéritos civis, etc, atividades que, obviamente, não podem ser feitas lá da Itália.

          1. Cadê o CNMP numa hora dessas? O Procurador em questão participa de sessões de julgamento do TRF por videoconferência?

        2. Se a Sra não souber dizer, quem saberá afinal.
          Isso é mudança de foco (se viajou de classe executiva ou não) o que interessa na discussão é a permanencia do douto procurador da República por lá, como noticiado.

  9. “O evento será em alemão, sem tradução simultânea.”
    Gostaria de saber quem desses magistrados fala alemão. E com fluência, diga-se de passagem.
    Será que levaram também as respectivas esposas? Perguntar não ofende.

    1. O Sidnei Benetti, fala alemão com fluência, tanto que fez doutorado no Instituto Max Planck, na Alemanha. Isso quando ainda era Juiz Estadual em SP. Quanto aos demais, nunca ouvi falar que falassem qualquer idioma além do português.

      1. Como condição para participar de eventos dessa natureza, os magistrados deveriam ser obrigados a fazer, assim que retornassem, uma monografia sobre a “troca de experiências” e possíveis influências para o Direito brasileiro (coisa de 200 laudas – não mais que isso – para não prejudicar a atividade judicante). Eu leria com todo prazer – desde que devidamente vertido todo o conteúdo para nossa língua-mãe, pois não falo alemão.

  10. Pois é Sr. Frederico.
    Pode parecer que a imprensa esteja ‘pegando no pé dos juízes’ (ministros e desembargadores) mas, num país como o nosso, ainda não acostumado com ‘first class’, a notícia assume relevância.
    Bastaria dizer, acaso fosse verdade, que a viagem seria um mérito alcançado por aqueles que estivessem em dia com os julgamentos. simples assim…

  11. Prezado jornalista.

    Que matéria “implicante” …. Coitados dos magistrados “ministros” ..terão que fazer essa longa viagem em avião de carreira… Mereciam e merecem voar em um Legacy … muito mais ágil… serviço de bordo melhor que os das primeiras classes carreiristas…

    O Judiciário está apodrecendo por culpa maior dos seus membros elitizados. Tem nojo deles…

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