Improbidade, morosidade e impunidade

Frederico Vasconcelos

Fatores que levariam juízes a não julgar crimes contra a administração pública

Sob o título “Por que os Juízes não gostam de julgar ações de improbidade?”, o artigo a seguir é de autoria de Rodrigo Aquino, Promotor de Justiça do Pará. O texto é lançado como um estímulo ao debate.

A meta imposta pelo Conselho Nacional de Justiça (julgar as ações de improbidade administrativa e as ações penais relacionadas a crimes contra a Administração Pública de 2011) é importantíssima. Entretanto, algumas ponderações devem ser feitas.

Como Promotor de Justiça de 1ª entrância, tenho observado na prática que muitos Juízes “não gostam” de julgar tais ações, em especial as de improbidade. Fico me perguntando o porquê.

Tudo bem que julgar 100 ações de alimentos, guarda e divórcio, mensalmente, diminui bastante o déficit de processos. Julgar 100 TCO’s também desafoga consideravelmente o Judiciário. Mas são processos simples, de baixa complexidade (feitos muitas vezes por assessores).

E por que os Juízes não se dedicam, com o mesmo afinco, aos processos de improbidade, que têm enorme impacto na sociedade local?

Enumero algumas razões, passíveis de críticas:

1) alta complexidade dos casos, o que demanda mais tempo de estudo, pois são sentenças extensas e melhor elaboradas;

2) medo/receio das consequências (inclusive pessoais), pois geralmente as pessoas envolvidas são políticos influentes na comunidade local;

3) não dá produtividade (ao contrário das centenas de sentenças cíveis de complexidade baixíssima, mas que são decididas no atacado);

4) falta de preparo técnico e intelectual (assuntos complexos com os quais os juízes não estão acostumados ou preparados);

5) descrédito com o 2° grau (Tribunal de Justiça), sob o argumento: “nós condenamos no 1° grau e no 2° grau eles reformam tudo. Isso não vai dar em nada. É só desgaste”;

6) Qualquer outro argumento ou nenhum deles.

E assim os processos vão se acumulando, os políticos corruptos sorrindo da impunidade e a sociedade sem saber o que fazer ou a quem recorrer.

Quando o Judiciário decide se manifestar, o réu já não é mais Prefeito, Secretário, vereador, deputado… E fica o dito pelo não dito.

Gostaria de saber a opinião de outras autoridades, inclusive de Juízes. Seria um bom debate.

Comentários

  1. A discussão é necessária.
    Sou da área jurídica, assessora e quando era servidora do MP tive a aportunidade de catalogar diversas ações civis, desde reforma de escolas até fornecimento de medicamentos e o máximo que se conseguia era uma liminar, sem que o Poder Judiciário chegasse no julgamento do mérito.
    Acho o texto bom para uma discussão ampla, sem “apontar dedos”, mas questionar sim a razão de ações civis não serem julgadas, permanecendo em instrução interminável.

  2. Se o diagnóstico proferido pelo promotor tiver alguma correspondência com a realidade, podemos concluir que os juízes são inúteis e poderiam ser substituídos por servidores menos onerosos ao Estado. Ou talvez seja o caso de se propor um tipo de ponderação para processos de acordo com a complexidade. Mas… desculpem-me pelo meu delírio. Juízes não conseguem pensar como gestores. Seria gritar aos moucos pedir-lhes que abdiquem de tarefas administrativas e passem apenas a julgar. Se sentirão diminuídos e com poderes tolhidos. É… a vaidade, a arrogância e o orgulho não os deixam ver além de seus óculos escuros, cada vez mais opacos…

  3. Pergunto: por que o promotor de justiça Demóstenes Torres, depois de ter cassado o seu mandato de senador por falta de decoro, reassumiu sem restrições as suas funções no MP do DF? Têm os membros do MP prerrogativas de “invulnerabilidade” ou outros superpoderes? Ou será que o Cachoeira interveio em seu favor?

    1. Jovem Marco Antonio Miranda,
      seu comentário padece de alguns equívocos.
      1º – Demóstenes Torres não é Promotor de Justiça;
      2º – Ele não reassumiu suas funções no MPDFT, pois não pertence aos membros desse órgão;
      3º – Ele como qualquer cidadão goza simplesmente do princípio da presunção de inocência e, como membro do MP de GO, só perderá o cargo com o trânsito em julgado de decisão judicial nesse sentido.

      Ah não estou o defendendo, apenas restabelecendo a ordem dos fatos.

  4. Eu julgo pelo menos uma ação de improbidade ou crime político por semana. E trabalho em vara cumulativa. E eu nunca vi nem fiquei sabendo de nenhum juiz de primeira instância que enrolou. Até porque quase todos julgamos pela ordem de conclusão… E temos 10 dias para julgar seja a previdenciária molezinha, seja a improbidade contra o prefeito.

  5. Tentava às duras penas fazer andar uma ação civil pública.Até que a assessora do juiz disse que quando tivesse outras iguais, faria uma só decisão…

    Iniciais ineptas podem ser assim rejeitadas, de plano. Se não está bem instruída a inicial, intime-se o MP para completá-la, aditá-la. Não precisa deixar dormindo nos escaninhos.

    E mais:dependendo do ímprobo, pode-se perder um apoio em hora de promoção.

    Ministro Joaquim Barbosa se referiu à sujeição a que se submete um juiz para ser promido.

  6. E estas conclusões estão baseadas em quê? Só no que o Promotor acha?
    Com todo respeito, mas isto está parecendo conversa de bar.

  7. Na esteira do que já disse, esqueci de mencionar uma opção que sempre vejo na prática:

    4) porque o Ministério Público é pródigo no oferecimento de ações de improbidade açodadas, sem justa causa, ou seja, sem maiores cautelas na averiguação quanto à efetiva prática de tais atos e quanto à sua autoria

    (ahhh.. claro, à exceção daqueles atos que ocorrem no âmbito da sua própria instituição – confesso que nunca vi na prática forense ação de improbidade contra membro do MP embora tenha visto ações de improbidade contra pobres coitados por questões envolvendo pura interpretação equivocada).

    Espera-se que os juízes, portanto, diante dessa postrura generalizada, atuem com redobrado zelo e minucioso exame dos fatos.

    Aliás, ainda quanto a isso, as “investigações” do MP que levam às ações de improbidade deixam muito a desejar quando comparadas às investigações da polícia judiciária que levam às ações penais.

    Bem, em síntese, o texto do Promotor é um claro exemplo da arraigada falta de auto-crítica do Ministério Público, que se acha o salvador do mundo e não tem olhos para o próprio umbigo.

    1. Prezado Carlos, o articulista não pede que os juízes julguem as ações do MP procedentes. Discute as razões pelas quais sequer são julgadas. Assim, se as ações são “açodadas, sem justa causa”, basta que o Poder Judiciário fundamente sua decisão e o faça com celeridade. Infelizmente, e com todo o respeito, creio que o Sr. tem alguma mágoa do MP e, por isso, perdeu o foco em sua crítica. Abs.

      1. Edaurdo, vampos por tópicos:

        1) onde você leu que eu teria dito que “o articulista pede que os juízes julguem as ações do MP procedentes”?;

        2) desde quando o articulista expões dados confiáveis ou verificáveis (pelo que conheço, o controle estatístico do MP é absolutamente precário e incipiente, razão pela qual suponho que o articulista não esteja manifestando nada mais do que o seu particular achismo ou mera “conversa de bar”, para utilizar expressão do comentarista João);

        3) eu não disse o que você afirmou; mas, veja que, supondo que os magistrados julgassem em tempo recorde ações de improbidade improcedentes, as críticas subsistiriam do mesmo modo, com nova redação e com outros achismos;

        4) aliás, em críticas o MP é bastante inventivo; parafraseando a música, o MP ACHA FEIO O QUE NÃO É ESPELHO;

        5) não tenho a mínima mágoa do MP; já fui do MP e tenho grandes amigos do MP; tenho, porém, alguma decepção, pois quando nele entrei achava que se tratava de instituição de vangauarda mas vi a mesma sujeira, em igual ou até maior quantidade, do que no Executivo, no Legislativo e no Judiciário (ahh… o Judiciário, vamos falar dele que sempre dá ibope, inclusive neste blog), com a diferença que, no MP, não há nenhum controle ou sancionamento;

        6) e qualquer magistrado que recebe uma ação de improbidade do MP se não rejeita desde logo a demanda (o que deveriam fazer) deve sim ter redobrada cautela pela ausência de zelo do MP em redigir as iniciais e apontar as provas do que (confusamente) alega.

        Abs.,

    2. Parece que o alvo é a PEC que tramita em Brasilia e que pretende tirar do MP o DIREITO CONSTITUCIONAL, de investigar e oferecer denúncia quando pertinente. Permitir que somente a Autoridade Policial detenha o poder de investigação, nos parece, atentado ao Estado Democrático e de Direito.

  8. Cravo nas alternativas 1, 3 e 4. E acrescento outros fators de morosidade/impunidade: inquéritos civis (nem todos, fique claro) (1) tardiamente instaurados; (2) mal conduzidos (2) e (3) lentamente concluídos.

  9. Senhor promotor, os promotores não vão em audiência, cumulam e só fazem o que interessam, dando mídia. Os juízes devem produzir números, aumentando a estatistica do CNJ. No dia que o juiz trabalhar o mesmo tanto que o promotor, terá tempo suficiente inclusive para sair na televisão.

  10. E agora que aprovara a PEC 505/2010 que acaba com a vitaliciedade do juiz, podendo ele perder o cargo mediante simples decisão administrativa, eu é que não condeno mais ninguém por improbidade…condenei o prefeito da minha cidade a perda do cargo e o tribunal reformou rapidinho…depois descobri que vários desembargadores, quando passam pela minha comarca, pernoitam na cada do referido prefeito….e não visitam nem o Fórum…se fosse depois da aprovação da PEC eu certamente já estaria na rua…tenho filhos pra criar e pais pra amparar na velhice…viva a PEC 505/2010!

    1. É isso mesmo. Por causa de uma miinoria que se desvia vão acabar com a vitaliciedade.Agora que a coisa não anda mais contra os políticos.

  11. Faltaram algumas opções:

    1) porque as iniciais geralmente são ineptas e/ou confusas e mal redigidas;

    2) porque os processos geralmente são mal instruídos;

    3) porque geralmente não há empenho do Ministério Público durante a instrução em provar o alegado;

  12. Prezado Promotor, o que mais me espantou foi a asseriva de despreparo intelectual e técnico de juízes. Ora, não se habilitaram em concurso público? Não lhes cabe a interpretação da legislação, dos autos e a aplicaçãoda Lei seja quem for o indiciado e réu da ação? De que tem medo esses magistrados, de assasinato, se for é compreensível, porém melhor seria então irem advogar, pois esse é um risco inerente à profissão, assim como o é para promotores, procuradores, fiscais governamentais, notadamente do trabalho, previdência e receita e de policiais.Qual a solução em seu ponto de vista?Para mim, aqueles que não se sentem confortáveis ou confiantes deveriam tdeixar a toga.

  13. um motivo, talvez, é que os juízes têm que julgar todas as demandas que se apresentam numa vara, enquanto os promotores se valem da recomendação 16, de 28/04/2010, por meio da qual º. Em matéria cível, intimado como órgão interveniente, poderá o membro do Ministério Público, ao verificar não se tratar de causa que justifique a intervenção, limitar-se a consignar concisamente a sua conclusão, apresentando, neste caso, os respectivos fundamentos.
    por outro lado, na Justiça Federal há mais de quinze anos, há prioridade no julgamento de ações de improbidade:
    Art. 218. Os juízos deverão processar prioritariamente, sem prejuízo dos feitos
    sobre os quais incida preferência legalmente estabelecida, as ações de natureza coletiva lato sensu, compreendidas as ações civis públicas, ações populares, mandados de segurança coletivos, ações de improbidade administrativa, execuções fiscais de grandes devedores e outras ações em que postulados, de forma conjunta, direitos ou
    interesses coletivos, difusos ou individuais homogêneos.
    http://www.trf2.jus.br/corregedoria/documentos/consolidacao_de_normas/consolidacao_atual.pdf
    o mp também deveria fazer a mea culpa e explicar À sociedade o tempo de andamento de seus inquéritos civis e procedimentos investigatórios. o cnj desde 2007 tem o programa justiça em números. ainda não vi, desde a criação do cnmp, algo similar. há?

  14. Caro Dr. Rodrigo a zona de conforto destes senhores tem que ser quebrada, e o senhor na qualidade de promotor voz e ouvidos do povo, tem que provocar e enfrentar esta situação. Um Magistrado que se presa não se rende a posição socio economica, e tão pouco olha os mesmo na vertical. Portanto, provoque com vossos conhecimentos juridicos.

  15. Caro promotor Rodrigo Aquino, concordo plenamente com vossa excelência, pois é mais fácil fazer um divorcio do que uma ação de improbidade, ou até mesmo um crime de politico. Pois é uma faca de dois gumes, temos a sociedade e a influencia deles que podem prejudicar. Mais acho que que deveria tanto os promotores e Juízes, juntamente com o conselho nacional de justiça fazer uma frente contra a corrupção no pais dando estímulos ao poder judiciário contra a impunidade.

  16. TALVEZ SEJA POR QUE ELES (JUIZES) TAMBÉM SEJAM BENEFICIADOS DE ALGUMA FORMA. CARGOS PUBLICOS OCUPADOS POR PARENTES, PODE SER UM EXEMPLO. DE QUALQUER FORMA É UMA VERGONHA. ! A JUSTIÇA BRASILEIRA É A MAIS INJUSTA DO MUNDO! ESSE PAIS PRECISA SER PASSADO A LIMPO, DE VERDADE. FALA-SE TANTO EM MENSALÃO, MAS NINGUÉM FOI PRESO, E NEN SE COGITOU A POSSIBILIDADE DE DEVOLUÇÃO DOS VALORES ROUBADOS DA NAÇÃO BRASILEIRA. ACORDA BRASIL!!!CHEGA DE TANTA ROBALHEIRA…

    1. Luana, só um adendo e esclarecimento. A ação de devolução do valor é uma ação civil que só poderá ser levada a efeito depois do Ac[ordão do STF pela condenação dos réus, aí sim o MP jngressa com a ação de ressarcimento aos cofres públicos. Quanto a cadeia, também só depois de julgados os recursos.Assim é a legislação em vigor no País. Abraços, Cláudio.

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