Falcão propõe disciplinar eventos de juízes
Cinco conselheiros apoiam restrições a patrocínios; pedido de vista suspende votação
O corregedor nacional de Justiça, ministro Francisco Falcão, propôs ao colegiado do Conselho Nacional de Justiça na sessão desta terça-feira (5/1) resolução que pretende disciplinar a participação de magistrados em eventos patrocinados por empresas públicas e privadas.
Trata-se da mesma proposta que a antecessora, ministra Eliana Calmon, não conseguiu ver aprovada no final de seu mandato como corregedora nacional.
Ao justificar sua iniciativa, Falcão leu reportagem da Folha, publicada em dezembro, sobre os prêmios distribuídos em festa de confraternização de final de ano realizada pela Associação Paulista de Magistrados (Apamagis). A corregedoria incluiu em pasta distribuída aos conselheiros foto de um automóvel zero quilômetro, exposta neste blog, veículo oferecido por uma empresa operadora de planos de saúde.
O corregedor listou alguns brindes oferecidos por empresas e sorteados em festas da Apamagis, como cruzeiros marítimos “no segundo maior transatlântico do mundo”, geladeiras, equipamentos eletrônicos, pacotes de viagens nacionais e internacionais fornecidos hotéis de luxo e agências de viagens.
O corregedor disse que os fatos informados na reportagem eram “gravíssimos”. “Essas medidas são para preservar a imagem do Judiciário que é formado em sua maioria por bons juízes”, disse.
A proposta proíbe magistrados de usar transporte ou hospedagem gratuitos ou subsidiados por pessoa ou empresa mesmo quando intermediado por associação de classe para participar de eventos, almoços, jantares, homenagens e eventos similares.
Os magistrados só estariam liberados para participar de eventos pagos com recursos públicos ou exclusivamente bancados por associações de classe sem patrocínios, instituições de ensino do qual o juiz seja docente, seminários e cursos de conteúdo educacional.
A resolução ainda determina que os gastos e receitas dos eventos devem ser divulgados previamente.
O conselheiro Jorge Hélio Chaves afirmou que preparou voto em apoio ao corregedor, “aderindo integralmente à resolução”. Disse entender que os patrocinadores influenciam decisões. “Quem patrocina, determina, diz a lógica do capitalismo”.
“Quem patrocina determina o destino, quando não manda, influencia. Não podemos permitir isso”, disse. “Não se trata de duvidar da idoneidade dos magistrados, mas a idoneidade tem que ser intocável”, completou Jorge Hélio Chaves, segundo relato do repórter Márcio Falcão, da Folha.
O conselheiro também comentou a alegação de que as associações de magistrados são entidades de direito privado. “Mas são entidades de direito privado especiais”, disse.
A votação foi suspensa com pedido de vista dos conselheiros Carlos Alberto Reis de Paula, Ney Freitas e Emmanoel Campelo.
Outros quatro conselheiros anteciparam o voto, acompanhando o corregedor Francisco Falcão: Jefferson Kravchychyn, Wellington Cabral Saraiva, Bruno Dantas e Gilberto Martins.
Apesar do pedido de vista, Reis de Paula manifestou “perfeita concordância com a ideia” da resolução, considerou “oportuna” e “muito apropriada” a iniciativa de Falcão, ao trazer de volta ao plenário a proposta da ministra Eliana Calmon. Explicou que gostaria de examinar os termos da resolução, comprometendo-se a trazer seu voto na próxima sessão, no dia 19/1, como “última participação no colegiado” [Reis de Paula vai presidir o Tribunal Superior do Trabalho].
Kravchychyn acompanhou a proposta do corregedor e citou como algo “impensável”, por exemplo, eventos realizados com patrocínio de grandes escritórios de advocacia. Durante as férias de Falcão, em janeiro, Kravchychyn atuou como corregedor interino.
O conselheiro Bruno Dantas, fazendo referência ao cuidado que tem com as leis (foi indicado ao CNJ pelo Senado Federal), disse que teve pleno acesso à proposta e aprovou “integralmente o texto da redação”.
Gilberto Martins parabenizou o corregedor Francisco Falcão por trazer o tema para ser regulamentado pelo colegiado.
Alguns conselheiros informaram que não haviam tido acesso prévio ao texto da proposta de resolução. E disseram que o assunto não constava da pauta da sessão.
José Lúcio Munhoz lembrou que o colegiado havia aprovado a realização de uma audiência pública sobre eventos patrocinados. O corregedor, com apoio de outros membros do colegiado, entendeu que a ideia dessa consulta ficou prejudicada com a votação da proposta. Entidades que acompanham o assunto poderão pedir a admissão como parte interessada.
Eis a minuta da proposta:
RESOLUÇÃO Nº.
Regulamenta a participação de magistrados em seminários, cursos, congressos, encontros culturais, esportivos ou recreativos e eventos similares.
O PRESIDENTE DO CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA, no uso de suas atribuições constitucionais e regimentais, tendo em vista o decidido em Sessão Plenária de …………. de …………. de 2011;
CONSIDERANDO que entre as vedações impostas aos magistrados está a de receber, a qualquer título ou pretexto, auxílios ou contribuições de pessoas físicas, entidades públicas ou privadas, ressalvadas as exceções previstas em lei (art. 95, parágrafo único, IV, da Constituição Federal);
CONSIDERANDO que o Estatuto da Magistratura estabelece que dentre os deveres do magistrado está o de manter conduta irrepreensível na vida pública e particular (art. 35, VIII, da LC 35/1979);
CONSIDERANDO que o artigo 103-B, § 4º, I, da Constituição Federal atribuiu ao Conselho Nacional de Justiça o dever de expedir atos regulamentares, nos limites de suas competências, e zelar pelo cumprimento do Estatuto da Magistratura;
CONSIDERANDO que o artigo 103-B, § 4º, II, da Constituição Federal atribui ao Conselho Nacional de Justiça o dever de zelar pela observância do artigo 37 do mesmo diploma constitucional;
CONSIDERANDO as inúmeras críticas publicadas por grandes veículos da imprensa nacional (Processo CNJ 0007096-47.2010.2.00.0000) sobre a participação de magistrados e seus familiares em eventos patrocinados ou subsidiados por pessoas físicas ou por pessoas jurídicas de direito privado, ainda que indiretamente;
R E S O L V E:
Art. 1º – Os seminários, congressos, cursos, encontros e eventos similares realizados, promovidos ou patrocinados pelos Conselhos da Justiça, Tribunais submetidos à fiscalização do Conselho Nacional de Justiça e Escolas Oficiais da Magistratura, estão subordinados aos princípios da legalidade, da impessoalidade, da moralidade, da publicidade e da eficiência, de forma que o conteúdo do evento, sua carga horária, a origem das receitas e o montante das despesas devem ser expostos de forma prévia e transparente.
Art. 2º – Os seminários, congressos, cursos, encontros e eventos similares, quando realizados por órgãos da justiça submetidos ao Conselho Nacional de Justiça, inclusive as escolas oficiais da magistratura, deverão ser submetidos a parecer prévio do controle interno do respectivo Tribunal, e a documentação deverá ficar à disposição para controle do Conselho Nacional de Justiça, dos Tribunais de Contas dos Estados e do Tribunal de Contas da União, conforme a competência.
Art. 3º – Ao magistrado submetido à fiscalização do Conselho Nacional de Justiça é vedada a utilização de transporte ou hospedagem , gratuitos ou subsidiados, direta ou indiretamente, por pessoa física ou por pessoa jurídica de direito privado , mesmo quando intermediado por associação de juízes, para participação em seminários, cursos, congressos, eventos, encontros culturais, esportivos ou recreativos, almoços, jantares, homenagens e eventos similares.
Parágrafo único: A vedação não se aplica:
I – aos seminários, cursos, congressos, eventos, encontros culturais, esportivos ou recreativos, almoços, jantares, homenagens e eventos similares realizados com receita exclusiva de associação de magistrados regularmente constituída e/ou de seus associados, desde que a origem dos recursos investidos no evento e a inexistência de patrocínio ou subsídio, direto ou indireto, sejam prévia e publicamente divulgadas pela associação responsável;
II- aos seminários, cursos, congressos, eventos, encontros culturais, esportivos ou recreativos, almoços, jantares, homenagens e eventos similares realizados por instituição de ensino na qual o magistrado participante exerça o magistério ou atividade similar;
III – aos seminários, cursos, congressos, eventos, encontros e semelhantes, de conteúdo educacional , quando o magistrado participe na condição de palestrante, conferencista, aluno ou intercambista.
Parágrafo único: Nos casos de alunos ou intercambistas, a participação prevista no inciso III deste artigo deverá ser antecedida de autorização do órgão ao qual o magistrado está vinculado, ou de convite de órgão público, Estado estrangeiro ou organismos internacionais.
Art. 4º – Esta resolução entrará em vigor 60 (sessenta) dias após a sua publicação em sessão de julgamento pelo plenário do Conselho Nacional de Justiça.
Obs. Texto atualizado às 18h18
Minha dúvida é se o time de futebol do campeonato interbairros, patrocinado pela locadora de vídeo, terá de banir o magistrado da equipe ou abrir mão do apoio. O cara pensa que é deus. Nem gente é…
Ah! A equipe do filho do camarada é patrocinada na natação, por um plano de saúde. Como ele é responsável pelo menor, é claro que se beneficia. Tem de banir o moleque também…
Esse pessoal não vai ver isso?!
Houve um caso emblemático, em que um ministro do STF foi a um casamento na Itália, com diárias em hotel cinco estrelas pagas pelo advogado nubente, o qual é patrono de ações com relatoria pelo primeiro.
A OAB entendeu que o episódio não merecia qualquer censura ao advogado, do ponto de vista ético, e que o ministro não teria sua imparcialidade contaminada. O STF também, ainda que tacitamente.
Enfim, acredito que o CNJ está sendo invadindo competência legislativa do CN, e atentando contra a cláusula da plena liberdade de associação.
Fred, a imprensa livre é a fortaleza da democracia. Agora veja o último considerando da Resolução. Será que a imprensa agora dita as decisões? Será que algum juiz poderá usar como fundamento para sua decisão o que a imprensa pensa? Será que algum juiz ousará a contrariar a imprensa? Fred, a imprensa não está acima do bem e do mal e nem os jornalistas são puritanos. Tenho receio que o juízes comecem a decidir de acordo com o que pensa a imprensa. Abração Fred deste cidadão que acha que o Poder Judiciário vai se tornar político. Amanhã o CNJ vai decidir que os juízes devem ser eleitos pelo voto popular.
Disse tudo. Esse “considerando” é um precedente ótimo às futuras decisões.
Só que a mesma imprensa que critica a magistratura esquece que, do mesmo modo que lançam suspeita sobre a independência dos juízes porque sua entidade de classe recebe patrocínios para a organização de eventos, também seria possível, pelo mesmo raciocínio, pensar que as empresas de comunicação subordinam o conteúdo de suas matérias jornalísticas aos interesses econômicos dos anunciantes.
E o MP? E a OAB? E os advogados públicos?
(silêncio)
Deixa quieto. Quem sabe os juízes (os que sobrarem) possam ir (se deixarem) nos eventos deles ainda que meio de bicão.
Quanto ao MP e Advogados públicos, seu questionamento é pertinente, pois o primeiro comp fiscal da lei, tb é imparcial e não se sujeitar a mimos e presentes de terceiros, assim como o segundo, como advogado do Estado e zelador do interesse público. Agora não vejo problemas quanto a advogados privados, que sempre são parciais. Ora, qual o problema do advogado receber mimos, se ele pode ser contratado posteriormente pela Empresa para defendê-la? Uma coisa é uma coisa, outra coisa é outra coisa.
Mas como, Diogo? A OAB não tem “atribuições institucionais”? “Defesa da democracia”? “Defesa do Estado Democrático de Direito”? etc. etc. etc.
Isso também não requer a superimparcialidade a toda prova que se quer usar contra as associações (privadas) dos juízes?
O povo, na sua sabedoria, ensina: “pimenta nos olhos dos outros é refresco”.
Nem vou falar na imprensa que é para não perder a amizade. Afinal, o blog do Fred, conquanto prossiga com um viés anti-juízes, é o único e exclusivo canal que fura a frente unificada anti-Judiciário (MP, OAB e imprensa).
Sinceramente, acho o texto excessivo, duro demais!!
Faço estas observações pelo simples motivo de estarmos a tratar, em sua quase totalidade, com homens e mulheres probos, de grandes qualificações intelectuais e morais.
*Era, preciso, sem dúvida, colocar freios nessa situação toda; entretanto, acho dispensável o “caput” do artigo 3º da Resolução em apreço, podendo os incisos nele inseridos serem alocados ao artigo 2º do texto, visto que tal como está descamba para o aspecto pessoal e privado do comportamento do (a) Magistrado (a), levando o leitor menos atento à desconfiança prévia sobre que Juízes são mal intencionados.
Há tempo para correções contextuais, todavia!
Juiz quando casa pode ganhar presente de casamento?
Juiz pode participar do bingo da igreja? Se participar pode ganhar?
Juiza grávida pode fazer chá de bebê e ganhar roupinhas?
Juiz pode ir jantar na casa de um amigo sem participar do custeio?
Juiz pode receber dinheiro de seus pais para ajudar a comprar um apartamento? Ou deve esperar a herança?
Juiz pode ganhar milhagens de avião pela utilização dos serviços? Ou deve comprar tudo com dinheiro mesmo?
Juiz pode participar de promoções do tipo: pague uma e leve duas?
Eu fico admirado. Os conselheiros do CNJ deveriam primar pela sensatez, pela razoabilidade. Em primeiro lugar, espero que o nobre blogueiro não ignore isto, o assunto nem constava da pauta do dia. Foi introduzido na reunião sem advertência prévia aos demais membros do órgão e isso ficou bem claro pela fala do Conselheiro Lucio Munhoz. De qualquer forma, ainda assim, foi colocado. O texto viola claramente a liberdade de associação, mas alguns conselheiros, demonstrando pouco apreço por normas assim, nem sequer as levando em consideração, aprovam a idéia. Do meu ponto de vista, entendo que o STF pode fulminar essa coisa de louco, que mais uma vez rebaixa a cidadania dos juízes. Um dos conselheiros, o primeiro a votar, disse que as associações de juízes não possuem o mesmo status das demais. Enfim…É importante ponderar, e espero que o blogueiro atente para isso: a idéia pode ser boa, mas a forma como colocada é claramente inconstitucional, autoritária.
Será que o jornalista — integrante do Quarto Poder da República — pode participar de eventos em sua área de atuação, sendo tais eventos patrocinados por empresas privadas?
Será que o jornalista — que exerce relevante atividade de interesse público — se omitiria em seu mister acaso tivesse que fazer uma reportagem investigativa grave envolvendo a empresa patrocinadora?
Resolução inconstitucional. Autoritarismo ambivalente. Se o magistrado arcar com todas as depesas pessoais, ou se a associação da qual ele faça parte arcar com elas, pode?
E os ministros do STF estão fora?
Parabéns ao Corregedor pela medida moralizadora Conta com todo o meu apoio.
“Art. 3º – …é vedada a utilização de transporte ou hospedagem , gratuitos ou subsidiados, direta ou indiretamente, por pessoa física … “, ou seja, estaria proibido, inclusive, pegar carona com colega ou se hospedar na casa de um parente ou amigo (! ?).