Degravação total embaraça processo, diz juiz

Frederico Vasconcelos

Magistrado vê na exigência “esforço pseudoacadêmico” em emperrar a aplicação da lei

De Renato Soares de Melo Filho, juiz de direito de São Paulo, sobre a consulta proposta pelo Blog para avaliar se a degravação total é uma garantia à ampla defesa ou embaraço que pode retardar os processos criminais:

 

Embaraço completo. O importante é que todo o áudio esteja disponível e seja audível.

Em outras palavras, bastaria à defesa apontar o arquivo e respectivo minuto e segundo que demonstrem a contradição do trecho pincelado pela acusação. Não há segredo.

Em todo caso, no país do faz de conta, pelo visto, toda a infinidade de diálogos interceptados deva ser transcrita, a despeito da maioria deles não tangenciar o caso. Mas afinal, qual a diferença entre ler infinitas páginas de transcrição e ouvi-las? Dá muito trabalho do mesmo jeito.

Isso me lembra a descabida (e já derrubada) exigência de transcrição dos depoimentos registrados em audiovisual nas audiências. Ora, cabe às partes apontar as assertivas que justificam suas teses, estando ao alcance de todos os arquivos para conferência.

Saber abrir um arquivo digital de áudio/vídeo é o mínimo que se espera de um juiz, membro do Ministério Público e advogado. Leia-se, a partir do momento em que bem relatado o inquérito pelo delegado, cabe à acusação, à defesa e ao juiz fazerem seus papeis.

Enfim, o promotor/procurador, de acordo com a sua convicção, acusa e aponta nos diálogos as afirmações que endossam sua tese, identificando os minutos e segundos. O mesmo vale pra defesa, cabendo ao final ao juiz se convencer de quem tem razão.

Mas não. A impressão que temos é haver certo esforço pseudoacadêmico em emperrar os órgãos responsáveis pela aplicação da Lei.

Comentários

  1. Interessante como algumas pessoas simplesmente odeiam juízes e não conseguem esconder tal sentimento. Ao contrário, não perdem a oportunidade de mostrar o ódio, qualquer que seja o ambiente.

    O assunto deste artigo nada tem ver com os magistrados propriamente ditos. Mas, mesmo assim, alguns comentaristas, foram do contexto, investem contra a magistratura, desferindo ofensas gratuitas contra os julgadores.

    Como dizia, já em seu tempo, Tom Jobim, “No Brasil, o sucesso dos outros é ofensa pessoal”.

  2. A exigência de degravação integral de todas as conversas, ainda que todas sigam com o processo em arquivo de áudio, é absurda e promotora da impunidade.
    A interceptação telefônica, pela própria inconveniência e por mando da lei, é o último recurso a ser utilizado em uma investigação policial. Agora passará a ser recurso de rara utilização e, com certeza, de fortes ataques em prol de pedidos de anulação nos processos penais.
    Sobretudo a decisão mostra a total despreocupação com a possibilidade fática de realização transcrição completa de todo o conteúdo, tendo em vista o reduzido contingente das Polícias Civis, não sendo possível comprometer outras investigações para destacar um agente unicamente para se ocupar em transcrever um arquivo de áudio por completo.
    É lamentável que a decisão seja tão inconsequente.
    Pelo visto a única maneira de reparar esse entendimento absurdo é reformando a lei, o que dificilmente ocorrerá, tendo em vista que as interceptações telefônicas tem revelado os crimes daqueles que criam as leis…

  3. É muito fácil evitar a degravação.
    Se há um trecho que a interessa mais, a acusação indica que, no minuto X, do CD.
    Por outro lado, a Defesa indica que, no minuto Z, do CD, há a prova de que a conversa não envolve coisas ilícitas.
    Assim fica fácil, bem mais fácil do que colocar um servidor de primeira instância (onde as provas são produzidas), para degravar tudo.
    No mais, pensar que um juiz não escuta a gravação por preguiça é muita, mas muita mesmo, má vontade com a magistratura.

  4. Engraçado o Doutor falar sobre “faz de contas”. É o que mais a magistratura faz hoje. Faz de conta que despacha, que dá decisão e sentença. Mentira pura!!! Se não tiver os áudios lá, transcritos, duvido que os Doutores se colocarão dispostos a ouvi-lo em busca da verdade real. Outra falácia do Direito Processual Penal brasileiro. Ninguém busca verdade real no processo, ainda mais quando se trata de acusados menos favorecidos economicamente.

    Quanto ao leitor Tiago Simões, ledo engano colega. A acusação não faz a degravação, quem faz são os investigadores em puro processo inquisitivo. Dá uma olhada nos processos que você vai entender do que estou falando.

    Com razão a defesa do acusado que logrou êxito junto ao STF. As degravações são selecionadas em processo inquisitivo e descontextualizadas, motivo pelo qual deve ser degravados os audios na integra. O ônus é da acusação (quem alega), não da defesa. Tá lá, art. 156, do CPP.

  5. A degravação não é mais fácil de consultar do que o arquivo de vídeo ou áudio? Muitas vezes perde-se tempo ouvindo ou vendo passagens não importantes até se chegar ao ponto que interessa, ao passo que, com a degravação, imagino que correr os olhos sobre o texto seja mais rápido…

  6. Parece-me razoável a posição do juiz. Vão escalar servidores, pagos com dinheiro público, para transcrever o áudio de intermináveis conversas, a fim de quê? A defesa deve ter o áudio disponível e, caso queira, coloque seus próprios empregados ou faça o advogado por si a escuta integral dos trechos. Não foi o que a acusação fez, afinal?

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