A impunidade e as jabuticabas garantistas
Sob o título “A desventura de Joaquim Barbosa”, o artigo a seguir é de autoria do juiz federal Marcello Enes Figueira. Foi publicado originalmente em seu blog “Justiça em Dia” (*).
Nos últimos dias, o Presidente do Supremo Tribunal Federal, Ministro Joaquim Barbosa, protagonizou dois episódios que lhe causaram desgaste. Primeiro, concedeu uma entrevista em que acusou “os juízes” de terem uma mentalidade pró-impunidade. Depois, reagiu agressivamente contra um jornalista que indagava-o sobre a reação das associações de juízes a estas mesmas declarações. Mandou-o “chafurdar no lixo”.
Sobre a questão da impunidade, tenho para mim que o ministro identifica corretamente o problema, mas passa longe de entender as causas. Longe, porque sua análise não aprofunda mais do que um palmo a questão. E quanto à forma, parece-me que em ambos os casos foi semelhante: o que o ministro Joaquim Barbosa fez com os juízes, de forma implícita, foi dizer que chafurdamos no lixo do pensamento retrógrado, ao passo que os membros do Ministério Público, estes sim, seriam salvadores da pátria (rótulo que não quero para mim).
O ministro, enquanto procurador da República na primeira instância (numa época em que este órgão era também representante judicial da União), se é que teve a experiência de atuar junto a um Juízo Criminal, o fez em um contexto inteiramente diverso do atual. Não se reconhecia ainda o fenômeno da criminalidade organizada e não havia técnicas processuais especiais para o processamento da persecução penal nestes casos.
O ministro desconhece o trabalho dos juízes que remam contra a maré da jurisprudência para entregar a prestação jurisdicional, para tentar tornar o processo penal efetivo.
O ministro desmerece igualmente os juízes que cumpriram com louvor suas cartas de ordem para fazer toda a instrução do processo da AP 470.
Ignora o ministro que aos juízes cabe não apenas julgar, mas também instruir e que em dezenas, talvez centenas, de casos os processos ficam suspensos por ordem do próprio STF, a respeito da qual nada podem fazer senão cumprir.
Apesar de tudo isso, o que o ministro fez, no auge de sua popularidade, foi dizer para o povo: os juízes chafurdam na lama da impunidade. Como a jogá-los aos leões.
Ainda pior: a solução que o ministro apresenta é fazer uma lavagem cerebral nos juízes?! Caberia ao CNJ mudar a cultura?!! Ora, cabe, isto sim, ao Supremo Tribunal Federal, que o ministro preside, e ao Superior Tribunal de Justiça, uniformizar a jurisprudência. Se o fizerem de forma a ceifar as jabuticabas garantistas, podem todos ter a certeza de que colheremos um processo penal mais efetivo.
Mas se dizer isso é fazer cerco corporativista, enfim… Esta é outra jabuticaba!
http://justicaemdia.wordpress.com/2013/03/06/a-desventura-de-joaquim-barbosa/
Parabéns, Marcello, excelente artigo. abs
Caro Frederico, corre nas redes sociais e também em parte da mídia que o entrevero entre o Ministro Barbosa e o jornalista do Estadão seria por causa de apuração que ele estaria fazendo relacionado com gastos de gabinetes ,viagens e etc dos senhores ministros?Isto Procede????
Caro Carlos, Não tenho maiores informações a respeito. O assunto foi tratado em duas notas na coluna Painel da Folha, na edição desta quarta-feira (6/3):
Onde dói 1 Apontada como justificativa por Joaquim Barbosa, a crônica dor nas costas do presidente do STF não é o motivo do destempero verbal com que ele se dirigiu a um jornalista ontem.
Onde dói 2 A irritação do ministro se deve a levantamentos em curso por parte da imprensa sobre gastos com reformas nos gabinetes e apartamentos dos ministros, além de viagens. Os dados referentes ao presidente da corte teriam chamado a atenção.
Grato pela mensagem.
abs.
fred
Fred, acabei de despachar um pedido de liberdade provisória com um juiz. Sabe o que ele me perguntou, o promotor concorda? Eu disse não! Sabe o que ele respondeu: então fica difícil, mas vou ver. Fred, é comum muitos juízes seguirem o que o que promotor fala. Muitos falam para o cartorário despachar nos termos da cota do MP. Não são todos, porque há juízes no Brasil. Veja no caso do mensalão. O Ricardo Lewandowski foi juiz, decidiu de acordo com a sua convicção contra o Joaquim, MPF e a imprensa. Parabéns ao Ministro Ricardo.
José Eduardo,
Sou Juiz no Ceará e posso lhe garantir que no dia em que em seguir, como regra, pareceres do MP, deixarei a toga. As manifestações das partes e do MP devem servir como argumentos a serem enfrentados pelo juiz, o qual pronunciará sua posição, de acordo com a convicção formada.
Você tem razão: há juízes no Brasil e tenho orgulho de conhecer vários colegas (a grande maioria) independente e responsável.
Também admirei a coragem do Ministro Ricardo Lewandowski no julgamento do mensalão. Não capitulou diante de tanta pressão externa.
Doutor Ricardo, parabéns. Sou advogado e peço que o senhor não se CURVE ao MP nem a polícia. Continue a decidir de acordo com a sua convicção seja pra condenar ou absolver. Nós advogados agradecemos. Hoje percebo que muitos juízes – não todos – têm medo do promotor, polícia e imprensa. Reconheço, como advogado criminalista, que ser juiz no Brasil não é fácil.
Cumprimento o magistrado Ricardo Alexandre. De fato, não pode o juiz se curvar a qualquer das partes. O bom magistrado deve mesmo ser independente e decidir com suas próprias convicções. O juiz (o título de ministro não deveria caber a um juiz do STF) Ricardo Lewandowski deu sadio exemplo de independência funcional.
Fred, o Ministro Joaquim não sabe o que é ser juiz. Acha que o juiz deve punir e acusar. Na minha opinião, o papel principal do juiz é impedir que o Estado comete arbitrariedade contra o cidadão. A polícia e o Ministério Público procuram provas para condenar; o advogado para absolver; o juiz não procura nada e deve velar pelo devido processo legal e proferir sentença. O Ministro Joaquim quer os JUÍZES SER CURVEM AO MP, decidindo assim: NOS TERMOS DA MANIFESTAÇÃO DO MP, CONDENO OU DEFIRO.
Vejam o relato do juiz federal George Marmelstein Lima, em seu Blog Direitos Fundamentais, decepcionado com sua carreira depois de 10 anos de magistratura:
“Apenas quem atua como juiz e tem plena consciência da importância da sua função sabe como é desgastante e até mesmo frustrante dedicar sua vida a uma profissão que não é valorizada pela sociedade. É muito duro ouvir que todo juiz trabalha pouco, ganha muito e é corrupto. A vida de um juiz, pelo menos dos autênticos juízes, não é nada fácil. Há muito sacrifício, mudanças e renúncias.
E nesses tempos de paralisação, onde se pede para refletirmos sobre a dignidade da magistratura federal, só resta questionar: tem valido a pena? É difícil dizer. Hoje, exatamente agora, se eu tivesse o poder de interferir no destino de meus filhos, diria a eles para não seguirem meus passos. Tenho muito orgulho de ser magistrado, mas há outras profissões igualmente dignas e relevantes. Por isso, sugeriria que eles seguissem uma vida mais leve, onde eles possuíssem tempo para, de fato, poderem interferir no destino de seus filhos”.
http://direitosfundamentais.net/2011/04/26/dez-anos-de-magistratura-breves-relatos-para-memoria/
O Supremo Tribunal Federal e o Superior Tribunal de Justiça não uniformizam nada. Isso depõe contra a segurança jurídica.
Todos os problemas que vivenciamos na sociedade brasileira, digo todos, em todas as àreas, não só a jurídica, é fruto do pensamento de esquerda que viceja em quase todo o continente latinoamerciano. Jamais, digo, jamais, o teremos no sistema jurídico brasileiro penas duras cumpridas efetivamente. O pensamento da esquerda, de que a criminalidade é causada pela pobreza..etc..etc, está na universidades, enfim, em todo no Brasil, com muita ênfase.
Outro dado, e agora do sistema judicial brasileiro, é falta de respeito com que juízes, promotores em geral e advogados se tratam, parecem 3 figuras clássicas das fábulas infantis: o rato, o gato e o cachorro, ou seja, 3 personagens que vivem em constante conflito e demoralizando as instituições judiciais.
Excelentes considerações dos dois colegas. Ninguém pode controlar a mentalidade do outro profissional. Agora, as causas da impunidade brasileira passam longe do Juiz de Primeiro Grau, as vezes ofendido por aqueles que não teem a maturidade para a controvérsia e não aceitam a posição do Magistrado singular. Exatamente porque o Juiz de Primeiro Grau não é valorizado como deveria é que nós vivemos o atual estado de coisas no Brasil. O resto é fetiche e uma certa aversão contra aquele que tem o poder decisório.
Eu posso lembrar de alguns fatores de impunidade.
– Inconstitucionalidade do regime integralmente fechado para os crimes hediondos
– Prisão somente após o trânsito em julgado
– Crimes com penas baixas que somente favorece a prescrição. A pena no Brasil tem que ser acima de 02 anos para não prescrever com facilidade.
– A prescrição retroativa com base na pena aplicada. O juiz tem o trabalho de julgar uma pessoa depois extingue a punibilidade.
– Anulação de milhares dosimetrias o que leva os magistrados a fixar a pena no mínimo legal
– Ampla possibilidade de substituição da pena privativa de liberdade por restritivas de direito. Praticamente todo mundo possui direito a substituição
– Uma Lei de Execução Penal que é descumprida, o que obriga o Juiz a aplicar o regime mais brando. Explico. O regime aberto no Brasil é uma piada porque não existe a casa de albergado, de maneira que o Juiz tem que mandar cumprir a pena em casa.
– Regime de penas inadequados para determinados crimes. Exemplo, roubo. Tem sentido uma pessoa condenada por roubo ficar no semi-aberto.
– Aumentar as penas dos crimes culposos que são os maiores ralos da impunidade do país.
Para tudo isto, depende do concurso do legislador para tornar o sistema penal mais efetivo e mudança de interpretação do Poder Judiciário.
O Juiz de 1º grau se sente muito amarrado em razão das instâncias superiores porque qualquer decisão é casssada através de Habeas Corpus
Parabéns ao colega, brilhante texto!
Parabéns Marcelo, lúcidas colocações!
Excelente artigo. Parabéns ao colega.
Pelo menos para este magistrado, a carapuça não serviu. Bom artigo.