Ex-promotor ajudou o país a combater crimes
Uma homenagem a Adam Kaufmann, que abriu escritório privado em Nova York
O Procurador da República Vladimir Aras, da Bahia, publica em seu blog texto em homenagem a Adam Kaufmann, promotor que desligou-se do District Attorney of New York para atuar em escritório privado (*).
Aras faz um balanço dos vários casos criminais em que Kaufman ajudou o Brasil, entre os quais destaca as investigações sobre o Banestado, Paulo Maluf e o mensalão.
Em entrevista ao repórter Mario Cesar Carvalho, da Folha, em outubro de 2009, Kaufmann disse que “o Brasil fez grandes avanços na investigação de crimes de colarinho branco”.
“O único detalhe é que o país parece não ter percebido que crimes de colarinho branco têm de ser punidos rápido e efetivamente para deixar claro a mensagem de que o país mudou”, afirmou.
Eis a íntegra do artigo de Aras:
A Promotoria nova-iorquina, retratada na série “Law and Order”, perdeu o seu ”Michael Cutter” da área de crimes financeiros. O promotor Adam Kaufmann, que muitos delegados, juízes e colegas de Ministério Público conhecem, desligou-se do District Attorney of New York (DANY).
Depois de 18 anos como um dos membros mais atuantes do Escritório do D.A. de Nova Iorque, Kaufmann deixa de ser um prosecutor para abrir um escritório em NY especializado em recuperação de ativos e criminal compliance nas áreas de corrupção e lavagem de dinheiro. Kaufmann será sócio de Arthur Middlemiss, outro ex-promotor nova-iorquino. Sua nova firma tem sedes em Washington e Nova Iorque.
Caminho semelhante (indo de um órgão público para a iniciativa privada) foi seguido no Brasil pelo ex-advogado da União, Antenor Madruga, que, à frente do Departamento de Recuperação de Ativos e Cooperação Jurídica Internacional (DRCI) do Ministério da Justiça, foi o responsável pela estruturação da Enccla, uma das mais exitosas políticas públicas brasileiras contra a criminalidade.
Em 2009, ao final da memorável gestão de Robert Morgenhtau como D.A. de Manhattan (foi reeleito consecutivas vezes de 1974 até sua aposentadoria naquele ano), Adam Kaufmann e a Procuradoria dos Estados Unidos conseguiram um acordo histórico que forçou o Credit Suisse a pagar 536 milhões de dólares para encerrar uma investigação por crimes financeiros relacionados à violações de sanções econômicas impostas ao Irã.
Aqui vale um parêntese. Estes acordos chamados deferred-prosecution settlements evitam a propositura de ações penais. Os valores obtidos com tais TACs criminais normalmente são partilhados entre a Promotoria, a Cidade de Nova Iorque e o Estado.
Registro a saída de Adam Kaufmann porque ele ajudou enormemente o Brasil em vários casos criminais de grande relevância. Cito três: Banestado (PR), Maluf (SP) e Mensalão (DF). Mas há mais!
Procuradores, promotores, juízes e delegados de Polícia de todo o Brasil devem lembrar-se dos incontáveis procedimentos de cooperação internacional em matéria penal nos quais ele prestou assistência ao Brasil para a persecução criminal de graves crimes financeiros, corrupção e lavagem de dinheiro.
Para quem não sabe, Kaufmann foi responsável por obter a ordem de prisão internacional – difusão vermelha ou red notice que impede Paulo Maluf de sair do Brasil, e pela entrega de documentos fundamentais para os processos estaduais e federais contra o ex-prefeito, ora deputado.
Sob sua condução, a Promotoria de Nova Iorque cooperou com o Ministério Público de São Paulo na investigação contra membros da Igreja Universal do Reino de Deus.
Foi Kaufmann quem auxiliou o Brasil a obter documentos indispensáveis para a realização da Operação Farol da Colina (mais de 60 doleiros presos) e para alcançar dezenas de condenações que resultaram do escândalo Banestado (1996-2002), até aqui um dos maiores casos de evasão de divisas e lavagem de dinheiro da história do País.
Foi ele quem propiciou os meios para que o Ministério Público Federal conseguisse o bloqueio de expressivos valores nos Estados Unidos e depois os repatriasse na Operação Zero Absoluto. Graças a ele, à procuradora federal Marion Percell (USAO/NJ) e ao agente Thomas Drombrowski (DHS/ICE), US$3.600.000,00 voltaram aos cofres nacionais.
Foi ele quem ajudou o MPF e a PF a coletar documentos que serviram de base para a RFB realizar lançamentos tributários de mais de R$ 8 bilhões, um resultado maiúsculo da Força-Tarefa do Banestado e do Fisco.
Várias autoridades brasileiras – como os juízes Sergio Moro e Fausto de Sanctis, os procuradores Edson Almeida, Rodrigo de Grandis e Lauro Cardoso, o promotor de Justiça Sílvio Marques, os DPFs Erika Marena, Luciano Flores e Paulo Roberto Falcão -, lembrarão de outros tantos auxílios prestados por Kaufmann a investigações criminais do Brasil.
Por tudo isto, Adam Kaufmann mereceria a medalha do Ministério Público. Na verdade, talvez por justiça, merecesse uma comenda do Estado brasileiro. Fica, pelo menos, este agradecimento público.