Divergências doutrinárias e corporativismo

Frederico Vasconcelos

 

Trechos de editorial do jornal “O Estado de S. Paulo” neste domingo (10/3), sob o título “Magistratura dividida”, ao tratar da nota pública assinada por Nelson Calandra (AMB), Nino Toldo (Ajufe) e Renato Sant’Anna (Anamatra) criticando as declarações  do ministro Joaquim Barbosa a jornalistas estrangeiros:

(…)

Divergências doutrinárias, confrontos políticos e discussões causadas por interesses corporativos entre magistrados já se tornaram corriqueiros na história do Poder Judiciário.

(…)

O ministro Joaquim Barbosa não discutiu a liberdade e a independência dos magistrados. Limitou-se a classificar a mentalidade da categoria como ‘conservadora, burocrática e formalista’.

(…)

O presidente do STF pode ter se excedido, retoricamente, quando defendeu um sistema penal mais eficiente e rigoroso. Em momento algum, no entanto, ameaçou a autonomia e a independência da magistratura, como afirma nota da AMB, Ajufe e Anamatra. O ministro, afinal, apenas repetiu o que há muito se sabe.

(…)

As críticas das associações de juízes ao ministro Joaquim Barbosa são injustas. Ao dirigente máximo do Judiciário cabe defender os interesses maiores da instituição, e não ser porta-voz dos interesses corporativos daqueles que a integram.

Comentários

  1. No momento em que a ANAMATRA lança a
    Cartilha para o trabalho seguro (demonstrando que atende também ao cidadão), a mídia insiste em desqualificar a defesa da associação aos interesses de seus membros (que por via indireta também atende ao cidadão). Como se fosse algum absurdo. Para tanto abusa e lambuza-se do termo ‘corporativismo’. Cuidado atento leitor! Não se pode desprezar a força das palavras, nem a intenção de seu emitente. Vai abaixo algumas observações a respeito.

    “A arte de ter razão” de Arthur Schopenhauer, p. 67 – Estratagema 32

    “Um modo prático de afastar ou pelo menos colocar sob suspeita uma afirmação do adversário contrária a nós é o de submetê-la a uma categoria odiada, ainda que a relação entre elas seja a de uma vaga semelhança ou de total incoerência. Por exemplo: ‘Isto é maniqueísmo; isto é arianismo; isto é pelagianismo; isto é idealismo; isto é espinosismo; isto é panteísmo; isto é brownianismo; isto é naturalismo; isto é ateísmo; isto é racionalismo; isto é espiritualismo; isto é misticismo etc.’ Com isso supomos duas coisas: 1) que aquela afirmação é realmente idêntica à categoria ou que ao menos está contida nela, o que nos leva a exclamar: ‘Ah, isso nós já conhecemos!”, 2) que essa categoria já foi completamente refutada e não pode conter nenhum termo verdadeiro.”

  2. A impressão que me passa , a cada novo episódio,que deveres ,vedações e obrigações previstas na LOMAN só se aplicam aos bagrinhos…

  3. É curioso como a reação de jornalistas a JB nem passa perto da nódoa de corporativismo, mas quando de juízes…

  4. o interessante é que o proprio Estadao é contraditório. no editorial “lamentável truculência”, de 07/03/2013, afirma:

    É profundamente lamentável que, por causa de um temperamento muitas vezes descontrolado, o presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), ministro Joaquim Barbosa, coloque em risco a admiração e a credibilidade que conquistou – não apenas para si, mas, com a colaboração de seus pares, principalmente para o Poder republicano que hoje comanda – por ocasião do histórico julgamento da Ação Penal 470, que, ao mandar para a cadeia uma quadrilha de criminosos de colarinho-branco, sinalizou o fim da impunidade para os poderosos da política brasileira.
    (…)
    Contudo, diante do peso do desafio que se coloca diante do ministro, as reiteradas manifestações de descontrole emocional de Barbosa tornam-se muito preocupantes. Já durante o julgamento do mensalão, transmitido ao vivo e acompanhado por um enorme contingente de brasileiros, em várias ocasiões o então ministro relator tratou com impaciência e descortesia os pares que se opunham a suas ponderações. Mais de uma vez, viu-se obrigado a se desculpar. E a maior parte do público sempre assimilou esses deslizes com alguma tolerância, até porque era testemunha do padecimento físico que um problema crônico de coluna impunha ao ministro.
    O fato de a vítima da truculência do ministro ser um repórter deste jornal é irrelevante. A irresponsabilidade cometida por Barbosa atinge toda a imprensa, e não se redime com um anódino pedido de desculpas formulado em nota oficial pela assessoria do STF. Nem minimiza a gravidade do ocorrido a alegação, contida na nota, de que Joaquim Barbosa fora “ríspido” com o jornalista porque saíra de uma longa reunião do CNJ “tomado pelo cansaço e por fortes dores”. Se não se sente em condições físicas e psicológicas para manter um comportamento público compatível com a dignidade dos cargos que exerce, Joaquim Barbosa deveria deles se afastar. É o que merece como ser humano, é o que dele espera a enorme massa de brasileiros que por ele tem demonstrado, até agora, admiração, respeito e apreço.
    A reincidência do presidente do STF num comportamento reprovável sob todos os aspectos – desde a transgressão da liturgia do cargo que ocupa até o comprometimento de uma imagem pública que favorece o aperfeiçoamento das instituições nacionais – foi recebida com escandaloso regozijo, nas mídias sociais, pelas viúvas do mensalão, interessadas em desacreditar o principal responsável pelo desfecho da Ação Penal 470, em proveito dos dirigentes partidários condenados à prisão pelo crime de comprar apoio parlamentar para o governo Lula.
    É hora de Joaquim Barbosa parar para pensar que pode estar começando a desfazer tudo o que até agora construiu com grande competência e admirável dedicação.”
    onde está a linha editorial do Estadão?

  5. Não compreendo o porquê o Min. Joaquim Barbosa, um dos Ministros que menos julga e com baixa produtividade, rotula de “corporativismo” a defesa de normas constitucionais? Será que ele esqueceu que a defesa da Constituição compete ao STF e ele, na qualidade de Presidente, deveria cumprir com o seu papel? Aliás, esteve com ele os Mandados de Injunção relativos ao artigo 39, XI, da CR/88. Ele os julgou? Resposta: não!
    Eis mais um demagogo de plantão que surge como herói de quadrinhos nessa República como se fosse o primeiro a prolatar uma sentença condenatóra! Ele sabe muito bem que milhares de sentenças criminais e de improbidade condenaram vários corruptos por força do trabalho dos juízes de 1a e 2a instância nos últimos 20 anos. O caso da Jorgina de Freitas Fernandes é apenas um exemplo de uma infinidade.
    Ademais, ele “esquece” que o processo do mensalão foi todo instruído por magistrados de 1a instância.

  6. Diante da explicação do ESP que afirma que: “O presidente do STF pode ter se excedido retoricamente, quando defendeu um sistema penal mais eficiente e rigoroso. e que em momento algum, no entanto, ameaçou a autonomia e a independência do Judiciário.”

    Vamos virar a página e esperar que os excessos retóricos não se repitam. Que o bom senso prevaleça! Chegou a hora de debatermos o que interessa: o aprimoramento e a valorização do Poder.

  7. O mais interessante disso tudo é que Barbosa, seguindo a quase-candidata Eliana, reclama na condição de ocupante de posto em que, em tese, seria mais viável promover a solução do que reclama, ou ao menos atenuar o problema.

    Mas alguém saberia dizer, não digo nem uma efetiva melhoria concreta no Judiciário, mas ao menos uma proposta factível? Barbosa não pode propor, muito menos melhorar, pelo simples fato de que ele nunca fez parte do Judiciário. Pode melhorar, e tenta fazê-lo em todas as oportunidades (como nesta agora), para o órgão de acusação, que ele a vida inteira integrou.

    Quando ele, na condição de ministro do STF que menos julga, diz que “quem não julga [ou julga pouco] é porque não tem vontade de julgar”, a gente não sabe se ri ou se chora.

    Quer dizer, é o demagogo – tal como hoje se entende essa qualificação. Como um certo ex-presidente, que passou anos circulando pelo país criticando “as elite” pelas estradas ruins, hospitais caindo aos pedaços, educação péssima etc. etc. etc., enfim, criticando a incompetência de seu próprio governo, limpando-se na própria sujeira. Tudo muito lamentável.

  8. O Ministro Joaquim Barbosa tem demonstrado muita coerência nas suas declarações.
    As prisões brasileiras chegam a ser, em alguns casos, verdadeiras masmorras.
    Os presos são condenados à perda da liberdade e não da dignidade.A dignidade do preso está constantemente ameaçada.

  9. o Estadão deveria se informar mais sobre o papel dos chefes de justiça pelo mundo.
    o chefe da Suprema Corte Americana, John Roberts, na abertura do ano judiciário de 2009 falou, quando pediu aumento dos juízes federais americanos:
    Compensação inadequada ameaça diretamente a viabilidade da posse da vida, e se a posse no cargo é feita incerto, os juízes de força e independência necessidade de defender o Estado de direito, mesmo quando é impopular para fazer isso-será seriamente corroída.”
    “Se a nomeação judicial deixa de ser a pedra angular de uma carreira de destaque e, ao invés torna-se um trampolim para uma posição lucrativa na prática privada, o objetivo dos autores de um Judiciário verdadeiramente independente será colocado em sério risco.”
    http://www.uscourts.gov/JudgesAndJudgeships/JudicialCompensation/JudicialPayIncreaseFact.aspx
    Antes dele, o chefe de justiça William Rehnquist, que se notabilizou pela luta dos direitos civis, afirmara:Pagamento judicial inadequada enfraquece a força do nosso judiciário.
    Nos Estados Unidos não há o temo ministro, e os Chefes de Justiça no mundo todo defendem os integrantes do Judiciário, mesmo” interesses corporativos daqueles que a integram”.

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