Defensoria: auxílio-alimentação é questionado

Frederico Vasconcelos

A Defensoria Pública do Estado de São Paulo criou por ato administrativo interno o pagamento de auxílio-alimentação a todos os seus membros. O valor do benefício é de R$ 25,00 por dia efetivamente trabalhado, montante fixado igualmente aos membros e servidores da Defensoria.

A concessão do benefício possui caráter indenizatório, sem incorporação aos salários, compensando os gastos dos profissionais com alimentação nos dias de trabalho. Por previsão expressa, não haverá retroatividade na concessão do benefício.

A decisão foi questionada por leitores do Blog, sob a alegação de que a autonomia administrativa conferida pela Constituição à Defensoria não permite que se crie benefício remuneratório sem previsão legal ou em expresso confronto com a legislação existente.

A Lei Estadual 7.524, de 28 de outubro de 1991, que trata da concessão do auxílio-alimentação no âmbito do Estado de São Paulo, proíbe o recebimento de auxílio-alimentação por quem ganha acima de 80 UFESPs (R$ 1.549,60).

Esse patamar foi elevado em 2005, por meio de decreto do governador Geraldo Alckmin (PSDB) [ver esclarecimentos da Defensoria Pública, abaixo].

Com base no patamar elevado pelo decreto, o benefício não poderia ser concedido a quem ganha acima de R$ 2.731,17, caso dos Defensores Públicos, cuja remuneração inicial, pela Lei 988/2006, é de R$ 11.235,00.

Segundo as críticas à medida, só uma lei específica aprovada pela Assembleia poderia contornar esses limites –e não um ato interno da Defensoria.

Consultada, a Defensoria Pública forneceu os seguintes esclarecimentos, por meio de sua Assessoria de Imprensa:

 

No âmbito da Administração Centralizada do Estado, o auxílio-alimentação foi criado pela Lei nº 7.524/91.

O art. 4º, inciso I, da referida legislação, limitava o benefício aos servidores cuja retribuição global no mês anterior ao de recebimento do benefício não ultrapassasse o valor correspondente a 80 UFESPs.

No entanto, o próprio Governador do Estado, por meio de Decreto – e não através de alteração legislativa – elevou esse patamar para 141 UFESPs. Trata-se do Decreto nº 50.079, de 06 de outubro de 2005.

Essa legislação tem sido aplicada no Estado, quer no tocante ao limite de ganho dos servidores, quer em relação ao valor do benefício – fixado em R$ 8,00 pelo Decreto nº 58.023, de 03 de maio de 2012. Ainda assim, as Secretarias de Estado têm adotado políticas complementares de auxílio-alimentação a seus servidores. Mesmo aqueles que recebem o benefício instituído pela Lei nº 7.524/91 também são contemplados com valores adicionais.

A política complementar de auxílio-alimentação depende da previsão e da disponibilidade orçamentária de cada órgão. A título de exemplo, há Secretaria de Estado em São Paulo que fixou, independentemente de teto de vencimentos de seus servidores, o valor do benefício em R$ 25,00 – o mesmo valor da Defensoria Pública. Há outras pastas que adotaram a política de credenciamento de restaurantes, pagando-se diretamente aos estabelecimentos um valor limite por servidor.

O fundamento da concessão de tal benefício tem sido, primordialmente, a autonomia administrativa dos órgãos e a disponibilidade orçamentária, considerando tratar-se de matéria de cunho eminentemente administrativo e de caráter indenizatório em vista do gasto realizado pelo servidor.

Anote-se que, não obstante o disposto no inciso II do art. 5º da Lei nº 7.524/91, Tribunal de Justiça, Ministério Público e o próprio Tribunal de Contas do Estado adotam, de há muito, política própria de auxílio-alimentação a seus servidores, prevendo critérios próprios de valores e sem restrição de concessão com base em teto remuneratório. Mais recentemente, o Poder Judiciário e o Ministério Público estenderam o mesmo benefício aos Juízes e Promotores, respectivamente, igualmente com critérios específicos.

No caso da Defensoria Pública, o benefício somente foi concedido aos servidores quando criada a rubrica própria em seu orçamento no ano de 2010. A rubrica permaneceu nos orçamentos seguintes e somente foi estendida aos Defensores a partir de 1º janeiro de 2013, quando entrou em vigor a lei orçamentária vigente, com a manutenção de tal dotação orçamentária, voltada para o pagamento de referida despesa. Ademais, para a implantação do benefício, seguiu rigorosamente o disposto nos arts. 16 e 17 da Lei de Responsabilidade Fiscal.

Destaca-se que a fixação do valor do benefício e dos critérios para sua concessão constitui matéria que pode ser regulamentada por atos próprios da Defensoria Pública, no exercício de sua autonomia administrativa, constitucionalmente assegurada, e observados os limites orçamentários. Dessa forma, em relação ao auxílio-alimentação, a política adotada pela Defensoria Pública – que não conferiu efeito retroativo ao benefício –  é a mesma estabelecida pelas Secretarias de Estado, Poder Judiciário, Ministério Público e Tribunal de Contas do Estado.  

Comentários

  1. Tem institucoes com poder, que nao passam pelo crivo de uma eleicao. Quando criaram a defensoria so o mais puro dos humanos acreditou que o novo orgao seria diferente de outros orgaos. Agora e necessario a criacao de uma nova instituicao para defender destas

        1. Como assim? Quem decidiu isso foi a CF. É assim em todos os países do mundo. O resto é invenção do tipo: inventar a roda.

  2. Queria entender desde quando o erro de outra instituição pode servir para justificar um erro da Defensoria ou de quem quer que seja…

    Pelo que sabemos a Defensoria de SP sempre pretendeu estar num lugar diferenciado, apegada a ideais democráticos, e não repetir a cultura de privilégios dos juízes, promotores e mesmo de secretarias de estado.

    Que vergonha a justificativa transferir para o outro a responsabilidade que é da Defensoria!!

    O compromisso é com o povo ou com a criação de mais um lugar de privilégios ?

  3. Senhores, não entendo o motivo de tanta polêmica. Os juízes e promotores paulistas recebem o mesmo benefício, em valor maior e, inclusive, receberam de forma retroativa. Todos os trabalhadores recebem. Aliás, para quem vive em São Paulo, o valor fixado é inferior ao custo alimentar do trabalhador que, em regra, trabalha além de um limite razoável e com uma estrutura deficitária. Conheçam uma unidade cheia da Defensoria e os senhores irão compreender.

    1. Prezado Luiz:
      O problema nem me parece ser receber o benefício e sim a forma como foi criado (ato administrativo) e o evidente confronto com a lei.
      Como mencionado pela Barbara, a Defensoria surgiu para ser diferente. Pelo visto, logo cedo já incide nos mesmos erros das demais carreiras.
      E a tática de se justificar dizendo que os outros fazem o mesmo não me parece das mais interessantes.
      Por fim, eventuais dificuldades no trabalho diário também não justificam medidas como essa e outras que estão em andamento há algum tempo na Defensoria, como as diversas gratificações criadas também por ato administrativo e recebidas como verba indenizatória, livre de impostos e contribuição previdenciária.
      Valorizar a carreira, a meu ver, é necessário, mas não dessa forma.
      abracos

    2. Sr. Luiz, o motivo da polêmica é a IMORALIDADE e a ILEGALIDADE de tal “benefício”. A justificativa da Defensoria não convence. Logo ela que deveria zelar pela boa aplicação da Lei comete uma ilegalidade dessa fazendo interpretações em benefício próprio (é a raposa tomando conta do galinheiro). Um simples ato administrativo não pode se sobrepor a uma Lei. E a Lei diz que quem percebe mais de 141 UFESPs (R$ 19,37 x 141 = R$ 2.731,17) não tem direito ao auxílio-alimentação. Ponto final.

  4. Caros defensores públicos, fiquem tranquilos.

    O benefício será mantido. Não há motivo para preocupação. Se os senhores fossem juízes, aí sim haveria motivo para intensa aflição, já que a magistratura é alvo de constante e intensa perseguição (basta a leitura dos comentários lançados nest blog para ver o ódio contra a toga).

    Aliás, vejam o número de comentários neste post. A quantidade é ínfima, já que ninguém se incomada com as benesses de defensores públicos e advogados públicos (que, apesar da responsabilidade mais amena e da menor quantidade de trabalho, não raro ganham mais que juízes e membros do MP).

    Agora quando o post é sobre juízes, são dezenas – e quiça centenas – de comentários, a grande maioria criticando a magistratura.

    Portanto, fiquem em paz, senhores defensores públicos. Tudo se resolverá.

    Atenciosamente,

    Magistrado estadual de 1ª instância,
    ex-defensor público.

    1. Concordo plenamente com o Sr. acho que todo trabalhador deveria ganhar o auxilio, porque o sr. não enganja uma campanha para que os trabalhadores do judiciário brasileiro ganhe VA. Aqui em GO so Juízes ganham, mortais (funcionários) não ganham. Ah! aproveita também para lutar por 60 dias de férias para os mortais também.

    2. Vendo a folha de pagamentos do TJSP no Portal da Transparência dá pra ver mesmo o quanto os juízes estaduais estão sofrendo com a baixa remuneração e estão recebendo apenas e tão-somente o subsídio.

    3. As vezes, essa suposta perseguição aos magistrados ocorre porque alguns deles acham (e propagam a ideia) que o trabalho dos outros é de “responsabilidade mais amena e menor quantidade”.

      1. Felipe, Nenhum trabalho é menos importante. Mas a responsabilidade do Magistrado existe, e os números do CNJ provam que o volume de trabalho é enorme. A responsabilidade não é ficção. Perceba que o Juiz é fiscalizado pela sociedade, mídia, Corregedorias e Conselho Nacional de Justiça. Juiz manda prender, liberta o condenado, executa e decide, muitas vezes, contra o Estado. A responsabilidade do cargo pode ser avaliada pelos órgãos de controles. O Sr. tem responsabilidades inerentes a sua atividade. Também trabalha com volume de trabalho. No entanto o volume e a responsabilidade não se comparam com a responsabilidade do Magistrado. O Sr. viu a transmissão do Júri da Mercia Nakagima? A morte da Magistrada, no RJ? A pressão que sofreu o Fausto de Santis? As constantes ameaças que os Magistrados sofrem em decorrência de seu trabalho? E o Sr.? Por favor, apresente exemplos de sua carreira?

        1. Prezado Darcio,

          Longe de mim desvalorizar o trabalho dos magistrados que é, em sua amplíssima maioria, exemplar. Aliás, a continuar como está, os melhores alunos e juristas tendem a cada vez menos vir pra magistratura, MP, procuradorias, defensoria e etc.: a iniciativa privada é infinitamente mais vantajosa pra quem é bom mesmo.

          Mas essas comparações de trabalho por critérios supostamente objetivos são impossíveis, e eu imagino que você saiba disso.
          Se o magistrado certamente tem mais processos, Defensores atuam em conciliações extrajudiciais e fazem, diariamente, atendimento ao público – algo que eu tenho certeza que você lembra como é desgastante (ainda que bastante recompensador). No mesmo sentido, a Defensoria não tem o apoio administrativo que a Magistratura tem (e que é claramente insuficiente). Como resultado, o Defensor manda cartas, elabora ofícios, tira xerox – tudo pessoalmente.

          Sem dúvida, decidir é uma responsabilidade grande. Mas é bom lembrar que, no mais das vezes, quem informa a parte da decisão (e é, portanto, o objeto da ira imediata) é o advogado – ou, no caso da Defensoria, o Defensor.

          Ameaças não são exclusividade de juízes – que têm, aliás, a vantagem de trabalhar dentro de um fórum, com ampla segurança, detectores de metais…

          Conheço algumas histórias de ameaças e tentativas de agressão a Defensores Públicos que, graças a deus, até hoje não resultaram em nenhuma tragédia. Mas é questão de tempo.

          Enfim, essa discussão a respeito de quem trabalha mais é inócua.

  5. E olhem só que situação ficamos: a Defensoria cria um benefício desses claramente ilegal, mas tal ato será objeto de impugnação pelo MP, que também ganha o auxílio sem base legal? E ainda que alguém ajuíze uma ação popular, irá a Justiça considerar o ato ilegal? Considerando que os juízes também recebem auxílio-moradia sem base em lei?
    E o Executivo? Vai entrar com ação contra os defensores, que possuem em suas mãos (assim como o MP) um poder chamado “ação civil pública”?

  6. Cabe uma ação popular para analisar a legalidade do auxílio. Seria uma boa oportunidade para a manifestação da Justiça. Qualquer cidadão está apto à ajuizar tal medida.

Comments are closed.