“Magistrados estão como mudos ou párias”
Juiz diz que não há consultas para reforma de códigos e elaboração de novo Estatuto
Sob o título “Era uma vez!”, o artigo a seguir é de autoria de Antonio Carlos Martins, juiz de direito em São Sebastião (SP). Foi publicado originalmente no site “Judex, Quo Vadis?”
Era uma vez, na Roma do século I a.C, o instituto do “senatus consultum”, através do qual os magistrados romanos propunham ao Senado deliberações que, uma vez aprovadas por este, tinham força de Lei. Era, repito, era uma vez, pelo menos para os magistrados, que agora não têm vez! No governo, no parlamento, e até no Supremo Tribunal Federal, ouvem-se associações de jornalistas – chafurdem seus associados onde bem entendam, e às vezes é bom que o façam -, trabalhadores portuários, centrais sindicais, igrejas, movimentos de “sem terra”, estudantes “sem estudo” que se prestam a perseguir blogueiras e por aí vai.
Os magistrados brasileiros, contudo, estão como mudos ou párias! Não são ouvidos nem na reforma de Códigos, seus principais instrumentos de trabalho – está aí um projeto de Código Penal para tornar ainda mais caótica a crise de segurança e da própria Justiça, que não deixará dúvidas disso, acaso aprovado -, e nem mesmo para a elaboração do novo Estatuto da Magistratura os juízes foram convidados à discussão ou participação, por mais tímida que seja, o que se reservou apenas a ministros, os quais conhecem o Judiciário luxuoso do Planalto Central, do alto de seus gabinetes apinhados de assistentes, garçons, seguranças, motoristas com carros oficiais, assessores de imprensa especialistas em aplacar chiliques e faniquitos, dentre outros capinhas.
Relegou-se apenas aos deuses do Olimpo candango – que têm seus contra cheques engordados por auxílio moradia, auxílio alimentação gourmet, pagamento de planos de saúde, passagens e diárias internacionais, além de rendas extraordinárias atraídas pelo alto cargo, seja para ministrar palestras ou como professores de universidades que fornecem até o “auxílio jatinho”, extensivo às consortes – a tarefa de elaborar o anteprojeto da nova Lei Orgânica da Magistratura (ou seria o projeto da nova Lei Orgânica Antimagistratura?).
Os outros 15.000 magistrados espalhados pelo Brasil afora – pobres mortais, sem sorte, sem carros oficiais ou motoristas, sem segurança e sem planos de saúde, sem funcionários em suas Varas e sem sistemas de informática ou estrutura moderna e adequada, os quais pagam aluguel pelas “residências oficiais” caindo aos pedaços que ocupam, quando existem, restarão metas a cumprir – mesmo que sem estrutura compatível com a demanda – além do desestímulo, a amargura de assistir impotentes a derrocada e o amesquinhamento de um Poder da República transformado em serviçal, isso com a ajuda e o “empurrão” (zão) de vaidosos intestinos.
Só para concluir essa “estória”, onde o tradicional “e viveram felizes para sempre” não tem vez, o que se pode esperar é que finde com a frase “era uma vez a magistratura”, cujo golpe de martelo final sobre seu destino, por convite do Zeus de plantão do Supremo Tribunal Federal, será dado pelos atuais presidentes da Câmara dos Deputados e do Senado Federal, morto o “senatus consultum”.
A eterna sanha totalitária nestas plagas. Administrar o mais comezinho cotidiano dos brasileiros a partir dos “umbigos de Brasília”.
Não sou juiz em São Paulo, mas não existe magistratura no Brasil mais altaneira que a velha magistratura do Estado de São Paulo. De longe. Orgulho dos magistrados acuados pela União Brasil afora.
Sou suspeito para falar, mas tenho que concordar contigo. A magistratura bandeirante é altaneira e não se curva facilmente diante de ataques à ordem jurídico-constitucional. Mas isso não é novidade alguma, pois basta lembrar a revolução constitucionalista de 1932, em que o Estado de São Paulo exigia uma Constituição, quando vários juízes paulistas literalmente penduraram a toga e pegaram em armas (consta que alguns simplesmente saíram durante a audiência quando viram a tropa passando para segui-la). Atualmente, a magistratura de São Paulo, apesar dos intensos ataques, está mais altiva do que nunca, em razão da gestão vibrante do eminente Desembargador Ivan Sartori, digníssimo Presidente do secular Tribunal de Justiça bandeirante.