Quando o juiz pede preferência ao advogado
Do juiz Fernando Tourinho Neto, do Conselho Nacional de Justiça, em telefonema ao também conselheiro Jorge Hélio Chaves, ao comentar ter enviado por descuido a uma lista de juízes federais e-mail em que o magistrado tratava do pedido que fez a Chaves para acelerar a análise de um processo de interesse da filha:
“Fiz uma merda. E coloquei você em uma merda”.
Na sessão do colegiado na última terça-feira, o episódio já era do conhecimento dos conselheiros, pois havia sido discutido na véspera em sessão administrativa reservada, mas o tema incômodo não foi tratado no plenário.
O caso foi revelado na edição desta quinta-feira (21/3), em reportagem de Felipe Recondo, no jornal “O Estado de S. Paulo“.
O telefonema foi narrado por Jorge Hélio nesta quinta-feira. Ele alegou ter sido levado a erro pelas informações da filha de Tourinho, tendo cassado a liminar que concedera anteriormente.
Tourinho, por sua vez, alegou que fez “um pedido de pai”.
“Não vejo problema em um pedido de preferência”, disse o ministro Gilmar Mendes, ex-presidente do CNJ.
Em entrevista à Folha em agosto de 2008, concedida ao editor deste Blog, o atual presidente do CNJ, Joaquim Barbosa, criticou essas práticas:
“Nós temos na Justiça brasileira o sistema de preferência, tido como a coisa mais natural do mundo. O advogado pede audiência, chega aqui e pede uma preferência para julgar o caso dele. O que é essa preferência? Na maioria dos casos, é passar o caso dele na frente de outros que deram entrada no tribunal há mais tempo”.
Tourinho e Chaves inverteram os papéis: o juiz foi quem pediu preferência ao advogado, representante da OAB no Conselho.
Esse Tourinho….
Completando: “Esse Tourinho”… mostra agora sem disfarces o bezerriinho mamador que é, eheheheh. Entende-se agora a razão de tanto empenho para o “alpinismo”, tanto beija-mão nas carreiras jurídicas. Faz lembrar a frase famosa daquele dono de jornal quando confrontado por um jornalista, “Nosso negócio são negócios”. Pano, rápido!
Senhor Luiz Fernando,
O Senhor não conhece o Desembargador Tourinho. Ele nunca precisou usar o expediente citado pelo Senhor. Ele é um grande professor e sempre foi muito conceituado no mundo jurídico.
Um outro grande professor de direito penal do Largo do São Francisco costumava comentar em aula que cada pessoa representa um mundo da vida “lebenswelt”. O professor citava o conceito de “mundo da vida” do filósofo Edmund Husserl:
“… mundo da vida descreve mundo subjetivamente experimentado por uma pessoa, enquanto que as condições de vida descrevem circunstâncias reais da pessoa na vida. Por conseguinte, pode dizer-se que mundo da vida de uma pessoa é construído de acordo com as suas condições de vida particulares. Mais precisamente, as condições de vida incluem o material e as circunstâncias de vida imateriais, como por exemplo, situação de emprego, disponibilidade de recursos materiais, condições de habitação, ambiente social (amigos, inimigos, conhecidos, parentes, etc), bem como a condição de pessoas física (gordura / magro, alto / pequeno, feminino / masculino, saudável / doente, etc.) A vida real, em contraste, descreve a subjetiva percepção dessas condições.
Todos nós temos a nossa história de vida particular e as nossas crenças e julgamentos revelarão quem somos e o que somos, segundo a lição do citado filósofo.
Assim sendo, cada um de nós costuma julgar as outras por suas referências pessoais, seu mundo da vida.
Por isso que a profissão de Magistrado é tão difícil. Temos que ter uma visão global de mundo, enxergar que cada um tem seu mundo da vida e compreender as diferenças e as maldades reproduzidas.
Sem pretender polemizar com o comentarista CSS, para não contrariar o blogueiro, observo que ele dá ao juiz TOURINHO o título de “desembargador” que este corretamente recusa, sendo um dos poucos membros de tribunais federais de segundo grau a assim proceder. E aproveito para contar um causo: numa sessão de julgamento do TRF-1, um dos maiores criminalistas do País sustentava oralmente seu recurso e, como é habitual, enfrentava o pouco-caso com que muitos juízes costumam tratar esse ato processual, para eles mera perda de tempo porque ou já têm voto no sentido da sustentação ou não se animam a rever o voto em sentido contrário; na metade do tempo o brilhante advogado percebeu que apenas sua excelente técnica seria insuficiente e habilmente introduziu comentários acerca de evento que organizara e de que participara o juiz TOURINHO, fazendo-se “identificar” por este. Quase imediatamente o julgador mudou de expressão, releu o voto preparado, consultou os autos e, finda a sustentação, proferiu um capenga voto oral que provia o recurso. Foi notável (e notada) a mudança de atitude dele. Não, não me contaram. Isto pode ser uma “referência pessoal”??? Ou uma “maldade”???
O atual presidente do CNJ, Joaquim Barbosa, criticou essas práticas:
“Nós temos na Justiça brasileira o sistema de preferência, tido como a coisa mais natural do mundo. O advogado pede audiência, chega aqui e pede uma preferência para julgar o caso dele. O que é essa preferência? Na maioria dos casos, é passar o caso dele na frente de outros que deram entrada no tribunal há mais tempo”.
Por que ocorre o pedido de preferência?
No cotidiano forense, muitas pessoas pedem preferência no julgamento, porque há causas mais urgentes do que outras.
Pessoas que estão muito doentes, questões econômicas urgentes, prisões, guarda de criança, questões que pela demora perderão o objeto. Enfim, a vida cotidiana é muito rica em exemplos. Não é humano exigir que o Magistrado não dê preferência para os casos que são urgentes. Nos Hospitais há também urgências que devem ser resolvidas antes de outras questões. No mundo jurídico acontece o mesmo fato. Lidamos com questões sociais imprevisíveis. Percebam que o problema é o excesso de demanda. Por mais que o magistrado trabalhe, as demandas se multiplicam. O fenômeno é tão cruel que acontece no primeiro grau, nos Tribunais, nas Cortes Superiores e no Conselho Nacional de Justiça. As varas, via de regra, têm problemas estruturais mais graves. Há poucos servidores, eles adoecem, tiram férias, licenças, e, etc… A vida é assim, tem suas contingências. Sei que o Presidente do E. STF nunca passou pela experiência de trabalhar numa vara mista, no interior do Brasil, com todos os problemas que eu descrevi. Espero que ele apresente soluções para desatar o verdadeiro nó do sistema: o grande número de demandas. Espero que ele pare de ver maldade e erros em tudo e que comece, de fato, a combater a impunidade e a reestruturar a esfera pública. A vida é muito mais ampla, muito mais bela. Temos que ter uma visão holística do sistema.O Judiciário que eu vejo, no dia a dia, é fantástico. Magistrados jovens, inteligentes, pais de família, avós, homens e mulheres corajosos que enfrentam as adversidades, que cumprem a sua missão institucional. Que abrem mão de muita coisa, desde cedo, para cumprir uma nobre missão, no Brasil. As intrigas palacianas estão muito distantes da verdadeira Magistratura do Brasil. A Magistratura que produz estatísticas enfrenta a criminalidade, a falta de estrutura, o colapso social do Brasil.
Essa é a verdadeira Magistratura.
Magistrado vive o drama da parte, sofre com os tudo isso. E cumpre a lei mesmo quando não concorda com ela. Porque sabe que a verdadeira justiça não é dos homens, mas de Deus.
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Com razão o comentarista CSS quando elogia os magistrados que são dignos da toga. “A coisa” começa a desandar quando eles não são tão dignos assim dos elogios e piora quando eles se dão o direito de cometer ilicitudes, fazer o que recriminam nos outros, fazer o que a lei censura ou mesmo proíbe… e piora de vez quando os colegas “fazem-se de mortos” diante das ilicitudes, pouco ou muito graves. É comum o juiz ausentar-se do fórum antes de terminado o expediente e o substituto legal dele reclamar por ter que despachar medida urgente; mas é incomum esse mesmo substituto postular providências disciplinares contra o colega faltoso, fujão, cabulador. E então?
Caro Luiz Fernando,
Com tanta coisa mais importante para analisarmos? E o grande problema é o Juiz que não está na comarca? O caso não foi despachado?
Como eu sempre digo: As pessoas nunca estão contentes. Em qualquer lugar, as pessoas devem marcar hora. Eu já precisei conversar com o segurança de um shopping e tive que marcar hora. O Juiz tem que estar à disposição dia e noite. E a população nunca está satisfeita. Sobre o Juiz fujão e o seu amigo. Ele provavelmente não comentou o fato à corregedoria porque ele sabe que é humano. E que ,em algum momento da vida, precisará sair mais cedo para resolver um problema urgente. Neste dia, ele proderá contar com o apoio do amigo. A vida é assim. Um dia precisaremos um do outro. Assim, como todos precisam da Justiça.
Esclareço ao comentarista CSS que a referência que fiz a juízes que reclamam da saída precoce de seus colegas, antes do fim do expediente, diz com hábitos assentados, mais que costumeiros, e de que decorre sobrecarga de trabalho frequente, em especial na apreciação de casos e questões urgentes. Daí a reclamação do juiz assíduo contra a atitude o juiz fujão, mas da qual não resulta a provocação da apuração de responsabilidades funcionais. Se ele prefere aceitar a sobrecarga de trabalho, que pare de reclamar; se quer reclamar, que o faça à corregedoria, ao controle externo, menos à parte, aos servidores!
Sem emitir qualquer juízo de valor sobre o ocorrido, penso que o episódio apenas serviu para mostrar que o CNJ definitivamente não é a panacéia para os problemas da Justiça.
Para frustração de quem pensava que o CNJ era composto apenas por “ungidos” (a expressão entre aspas foi utilizada pelo Ministro Marco Aurélio, durante sua entrevista no programa Roda Viva, da TV Cultura), o CNJ agora se vê atingido pelos mesmos males que (ao menos teoricamente) serviram de justificativa à sua criação, como por exemplo a possibilidade de usar prestígio e influência para interferir no andamento dos julgamentos.
Será que agora terão que criar um outro órgão para fiscalizar o CNJ? Mas quem fiscalizaria esse órgão fiscalizador do CNJ?
Simples. Tirem os juízes do CNJ, aí sim teremos um verdadeiro órgão externo com a vantagem de se diminuir os conluios.
Caro Senhor Maurício,
Eu não entendo o seu comentário, pois o episódio envolveu um advogado, não? Acho que temos que acabar com o CNJ, então? Ou podemos acabar com a justiça. Todos irão fazer justiça com as próprias mãos. Vamos viver tempos de muita emoção.
Muito facil. Se o CNJ faz, como podemos crer nas pessoas que julgam para fazer justiça? Todavia é muito simples saber onde existem os erros da justiça que de um modo geral a praticam sem denodo. Tenho o poder de julgar e por isso julgo.
A minha sujestão é simples: sou recem formado, 23 a 25 anos, não tenho nenhum bem, e agora, com 15 ou 20 ou 30 anos como magistrado tenho um patrimônio invejavel. Viajo em primeira classe, europa de preferencia, hotel cinco estrelas, festa de casamento gratuito e tudo bem. Sou por isso impoluto. Nariz empinado e pronto. Viu como e fácil? E so querer. Serve para outr\as profissões que militam a justiça.
Complemento: pedir qualquer um pode, mas para conceder a preferência o juiz deve ter um apoio legal ou fático (excepcional) justificado. A propósito, o Congresso poderia aproveitar a deixa do M. Fux e impor, por lei, que os processos sejam julgados em conformidade e na ordem dos correspondentes nºs de registros.
Isso seria um caos. Existem milhares de ações repetitivas, cujo processamento é idêntico, ao passo que outras dependem de provas periciais complexas, por exemplo. Às vezes até para conseguir perito é dificílimo. De nada adianta reter as ações repetitivas. O sistema de metas de nivelamento do CNJ atende bem.
Defendir aqui nesse Blog o Desembargador Tourinho Neto. Contudo, apesar de não demonstrar nenhuma evidência de fraude, discordo da prática realizada. O Problema Fred e demais leitores está no concurso. Na realização do concurso, vez que não se sabe o que ocorreu e ocorre nesse Brasil afora, com relação a participação de familiares de Juízes, Desembargadores, Ministros do Tribunais Superiores nos concursos da Magistratura. Os vícios estão na chegada, na entrada do familiar e não na transferência, já que esta é apenas um apêndice da coisa, mormente se tem notícia que a sistuação é mais dramática do que se imagina.
Parafraseando a música do grande Emílio Santiago “se ela fez com ele vai fazer comigo”, deduzimos que “onde passa um boi, passa uma boiada”.