Os juízes e as relações com o Supremo

Frederico Vasconcelos

Alguns juízes ficam muito incomodados quando os leitores comparam os magistrados com deuses.

É possível que nem todos tenham a mesma reação.

No último dia 15/3, ao ser empossado como Desembargador do Tribunal de Justiça do Paraná, o juiz Luis Sergio Swiech afirmou em seu discurso:

“Ser magistrado é dedicar a vida ao mais alto apostolado a que um homem pode se entregar neste mundo de Deus. É receber de forma comedida, serena e humilde uma parcela da onipotência divina, representada pelo poder de condenar ou absolver os seus semelhantes”.

Comentários

  1. Vamos com calma…. Religião e Justiça são coisas que devem andar totalmente separadas. Se ainda é visível a forte influência da religião em várias Leis em vigor, nem podemos pensar num Judiciário submisso a princípios religiosos. Aqui ‘embaixo’ é a Justiça dos homens, e assim deve continuar sendo. Historicamente, quando se juntou o poder de julgar com aspectos religiosos, se produziu períodos terríveis da história, como a inquisição, por exemplo, onde se julgava e posteriormente se matava em nome de Deus. Como eu disse, vamos com calma….

  2. Todos os dias pela manhã, logo ao acordar, os juízes da terra devem pedir a Deus proteção e sabedoria para julgar, como fez Salomão. Só assim o apostolado da magistratura será próspero.

  3. Estamos na Semana Santa e não nos custa relembrar um pouco de história do Direito.

    …Que os Juízes tenham coragem de superar os desafios de um novo tempo, tão difícil para todos. Não obstante as piadinhas e imcompreensões, o magistrados corajosos ainda são maioria. Pena que não são ouvidos.

    Trecho do Discurso de Rui Barbosa. Rui lutou muito por um Judiciário forte e cobrou coragem dos bons Juízes.

    Reproduzo o trecho para lhes mostrar como no inconsciente coletivo predomina a visão de Rui Barbosa. Por isso, os comentários do José são pertinentes, não obstante eu não comungue com eles. Todos os comentaristas devem ser respeitados.

    Comentários de Ruy Barbosa sobre a sentença de Jesus Cristo.

    (…)
    “De Annás a Herodes o julgamento de Cristo é o espelho de todas as deserções da justiça, corrompida pelas facções, pelos demagogos e pelos governos. A sua fraqueza, a sua inconsciência, a sua perversão moral crucificaram o Salvador, e continuam a crucificá-lo, ainda hoje, nos impérios e nas repúblicas, de cada vez que um tribunal sofisma, tergiversa, recua, abdica. Foi como agitador do povo e subversor das instituições que se imolou Jesus. E, de cada vez que há precisão de sacrificar um amigo do direito, um advogado da verdade, um protetor dos indefesos, um apóstolo de idéias generosas, um confessor da lei, um educador do povo, é esse, a ordem pública, o pretexto, que renasce, para exculpar as transações dos juízes tíbios com os interesses do poder. Todos esses acreditam, como Pôncio, salvar-se, lavando as mãos do sangue que vão derramar, do atentado que vão cometer. Medo, venalidade, paixão partidária, respeito pessoal, subserviência, espírito conservador, interpretação restritiva, razão de Estado, interesse supremo, como quer que te chames, prevaricação judiciária, não escaparás ao ferrete de Pilatos ! O bom ladrão salvou-se. Mas não há salvação para o juiz covarde”.

  4. Caros amigos,

    Eu acredito que moral e direito devem ser separados. Comungo das idéias de Kant e Hegel sobre o tema. Mas as referências históricas do colega José devem ser respeitadas, pois os valores cristãos fazem parte do mundo do colega. No entanto, devemos lembrar que, por muito tempo, Estado e religião andaram interligados. A história da inquisição nos traz tristes recordações. Hoje as garantias processuais da publicidade, da ampla defesa e do contraditório são conquistas históricas que buscam evitar dos tristes tempos dos processos inquisitoriais.
    De fato, o colega Marcello tem razão, a arte de julgar é um ofício muito difícil. Exige muita sensibilidade do julgador, pois o Magistrado, pós-moderno, não é a boca da lei, como era o Juiz dos tempos de Napoleão, fase que floresceu o positivismo-tecnicista.
    O Juiz moderno precisa estar antenado com seu tempo, respeitar as diferenças e as minorias, de um país de dimensão continental como o Brasil.
    Nem sempre é fácil compreender tantas diferenças. Eis o desafio que ressurge a cada dia. A compreensão do outro, mesmo quando vivenciamos o caos.

  5. Para os cristãos (católicos e evangélicos), vale lembrar que a Bíblia tem várias passagens em que reconhece que os magistrados são autoridades constituídas por Deus. Há trechos bíblicos que falam que os juízes são “ministros de Deus”.

    E levantou o SENHOR juízes, que os livraram da mão dos que os despojaram.
    Juízes 2:16

    Por mim governam príncipes e nobres; sim, todos os juízes da terra.
    Provérbios 8:16

    Juízes e oficiais porás em todas as tuas cidades que o SENHOR teu Deus te der entre as tuas tribos, para que julguem o povo com juízo de justiça.
    Deuteronômio 16:18

    Porque os magistrados não são terror para as boas obras, mas para as más. Queres tu, pois, não temer a potestade? Faze o bem, e terás louvor dela.
    Porque ela é ministro de Deus para teu bem. Mas, se fizeres o mal, teme, pois não traz debalde a espada; porque é ministro de Deus, e vingador para castigar o que faz o mal.
    Romanos 13:3-4

    1. Já que o sr. José quer trazer a Bíblia para esta discussão, na tentativa de provar a “divindade” dos juízes humanos, poderia também, por uma questão de honestidade, mostrar os “dois lados da moeda”, fazendo citações ao juiz Caifás. De acordo com alguns trechos do Novo Testamento, Caifás participou do julgamento de Jesus no Sinédrio, supremo tribunal dos judeus, após a prisão deste no Jardim de Getsêmani. Tanto os evangelhos de Mateus e João mencionam Caifás como participante de destaque neste julgamento de Jesus organizado pelo Sinédrio; ele também ocupava a posição de chefe da corte suprema.

      “Os principais sacerdotes e todo o sinédrio buscavam testemunho contra Jesus, para o entregar à morte, e não o achavam.” Marcos – Capítulo XIV

  6. Pode ser feita uma leitura mais generosa do discurso: o ato de julgar o semelhante é muito penoso para o ser humano. Os juízes assumem o difícil encargo de cumpri-lo, em prol da sociedade. Deve portanto exercê-lo com humildade e de forma serena.

    Não é o caso do Brasil, mas imagine-se o drama de condenar alguém à pena de morte. A pena de prisão, embora menos drástica, tampouco é fácil de impor. Igualmente difíceis são outras tantas decisões que definem o rumo da vida das pessoas.

    Os juízes são deuses? Claro que não. Apenas têm algumas vezes de suportar sobre os ombros uma responsabilidade maior do que sua humanidade. E isso costuma ser sofrido.

    1. Parece-me que a interpretação é essa mesma, mas o pessoal aí embaixo (e acima) gosta de ver tudo sob a pior ótica possível. Basta ler.

      1. De fato, quão pesado e terrível é o fardo que Deus colocou sobre os ombros dos juízes!

        Como pode um ser tão frágil — que veio do pó e ao pó voltará — receber parcela da onipotência divina para agir como representante de Deus na terra com o fim de mitigar o crescimento da maldade entre os homens?

        1. Caro José, sou agnóstico. Isso não me impede de reconhecer que julgar um igual é uma atividade intelectualmente penosa para qualquer ser humano. É como eu penso que, com generosidade, deveriam ser recebidas as palavras do magistrado.

    2. Marcello, julgar é tão dificíl que, quando Deus apareceu a Salomão e deu-lhe a oportunidade de pedir qualquer coisa (sim, qualquer coisa: dinheiro, riquezas, glória, poder sobrenatural para curar, etc), Salomão pediu sabedoria para julgar o povo. Isso demonstra que julgar é a atividade mais difícil que existe para um ser humano.

  7. Oração imprópria com também são essas “solenidades” em que se revivam o beija-mão.

    A propósito: o que dirão os médicos que têm poder para curar ou matar “os seus semelhantes”.

    1. Marcelo, já que você citou “Deus”, lembro que o discurso do eminente desembargador encontra respaldo bíblico.

      Julgar é tão dificíl que, quando Deus apareceu a Salomão e deu-lhe a oportunidade de pedir qualquer coisa (dinheiro, riqueza, glória, poder para curar, etc), Salomão pediu sabedoria para julgar o povo. Isso demonstra que julgar é a atividade mais difícil que existe!

      1. Prezado José,

        A propósito, gosto muito dessa passagem bíblica citada por V.Sa. De fato, naqueles tempos as coisas exigiam esse poder divino memso, porque os reis eram considerados representantes de Deus na terra. Hoje no entanto, não obstante, o Juiz ser um protegido do Senhor ( Deus ), como todos nós somos, não há mais essa necessidade de invocarmos esse preceito religioso para julgar, eis que as leis, regulam os atos, fatos juridicos, e as condutas das pessoas, o que leva a um julgamento a ser pronunciado de forma bem concreta, ou seja, baseado e lastreado em provas, contidas nos autos. O que dispensa essa divindade por parte do Juiz. È o que aprendir. Grande abraço e obrigado pela citação biblica, pois, sou cristão fervoroso.

        1. Marcelo Fortes,

          como cristão fervoroso que disse ser, provavelmente conhece ser o dever de todos os homens orar por aqueles que estão em posição de autoridade na terra, pois todo o poder é dado por Deus aos homens.

          Jesus disse a Pilatos: “Nenhum poder terias contra mim, se de cima não te fosse dado” (João 19:11).

          Ou seja, Deus é a fonte de todo o poder entre os homens. O coração dos reis (reis em sentido amplo, ou seja, todas as pessoas que estão em posição de autoridade terrena) é como ribeiros de água e está nas mãos do Senhor, que os inclina para qualquer lugar (Prov. 21).

          E levantou o SENHOR juízes, que os livraram da mão dos que os despojaram.
          Juízes 2:16

          Por mim governam príncipes e nobres; sim, todos os juízes da terra.
          Provérbios 8:16

          Juízes e oficiais porás em todas as tuas cidades que o SENHOR teu Deus te der entre as tuas tribos, para que julguem o povo com juízo de justiça.
          Deuteronômio 16:18

          Porque os magistrados não são terror para as boas obras, mas para as más. Queres tu, pois, não temer a potestade? Faze o bem, e terás louvor dela.
          Porque ela é ministro de Deus para teu bem. Mas, se fizeres o mal, teme, pois não traz debalde a espada; porque é ministro de Deus, e vingador para castigar o que faz o mal.
          Romanos 13:3-4

          Em Salmos 82.4, Deus diz para os juízes: “Vós sois deuses”.

          Deus está na congregação dos poderosos; julga no meio dos deuses.

          Até quando julgareis injustamente, e aceitareis as pessoas dos ímpios? (Selá.)

          Fazei justiça ao pobre e ao órfão; justificai o aflito e o necessitado.

          Livrai o pobre e o necessitado; tirai-os das mãos dos ímpios.

          Eles não conhecem, nem entendem; andam em trevas; todos os fundamentos da terra vacilam.

          Eu disse: Vós sois deuses, e todos vós filhos do Altíssimo.

          Todavia morrereis como homens, e caireis como qualquer dos príncipes.

          Levanta-te, ó Deus, julga a terra, pois tu possuis todas as nações.

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