Conduta incompatível com a exigida do juiz
Sob o título “O ministro iracundo e a audiência sorrateira”, o texto a seguir é de autoria de Gilton Batista Brito, Juiz Federal lotado em Sergipe, ex-Defensor Público Estadual e ex-Advogado da União.
Foi, numa palavra, estarrecedor ver e ouvir o tratamento desrespeitoso dispensado pelo Senhor Ministro Joaquim Barbosa a magistrados em audiência, como amplamente divulgado pela mídia.
Teve de tudo no comportamento do Senhor Ministro: piadinha de mau gosto quanto à sede dos novos tribunais, com nítido intuito de pautar manchetes; manifesta aversão ao desempenho das associações de magistrados, pejorativamente chamadas de sindicais, a indicar intolerância com o diálogo; invocação de argumentos de autoridade, a revelar desprezo pelo pluralismo de idéias; e citação de custos exagerados e discrepantes de documentos oficiais, demonstrando ignorância.
Um misto, portanto, de desinformação, preconceito, autossuficiência e soberba em conduta incompatível com a serenidade, o equilíbrio, a urbanidade e a cortesia exigidos de um Juiz, mais ainda, de um Juiz que preside um alto tribunal e representa o Poder Judiciário.
Tal forma iracunda de proceder é bem verdade não é nova, contabilizando-se vítimas na advocacia, na imprensa e no próprio Supremo Tribunal Federal.
Em realidade quer parecer pelas circunstâncias que a audiência, solicitada há bastante tempo e só agora realizada, foi sorrateiramente urdida para silenciar sobre temas que preocupam os magistrados e censurar publicamente uma demanda debatida seriamente há vários anos na magistratura federal, no Parlamento, no CJF e até no CNJ, pela só discordância de última hora de Sua Excelência.
Tudo indica que a elevada popularidade alcançada como relator de famosa ação penal originária conferiu ao Senhor Ministro no encontro a certeza da condição de ser quase divino, alçado falsamente aos píncaros da glória. Um super-herói onisciente e onipotente, cujos desejos devem ser obedecidos mansamente, sem discussão.
O Senhor Ministro Joaquim Barbosa, contudo, precisa urgentemente entender que ao falar com magistrados não se dirige a capangas, mas, sim, a seus pares.
A força do Ministro, também, em tese, autônomo, independente e livre, além de garantido como todo magistrado, se expressa justamente no fato de tornar-se aos seus “pares” para praticamente dizer: “essa retórica aí não vai funcionar aqui, porque eu sei que na escala de ´quereres´ que os senhores agora postulam, o interesse público, se é que foi considerado, está em último lugar”. Será mesmo que há tanta “incoerência” na fala desimpedida do Ministro neste caso? Pessoas são pessoas, cozidas no mesmo caldeirão brasileiro, juízas ou não. Entidades de classe são entidades de classe, de juízes ou não.
Parabéns pelo artigo, foi direto ao ponto. Eu me pergunto se o ministro Joaquim Barbosa se comportaria da mesma forma numa audiência, por exemplo, com a Presidente Dilma.
CÓDIGO DE ÉTICA DA MAGISTRATURA NACIONAL
Art. 22. O magistrado tem o dever de cortesia para com os colegas, os membros do Ministério Público, os advogados, os servidores, as partes, as testemunhas e todos quantos se relacionem com a administração da Justiça.
Parágrafo único. Impõe-se ao magistrado a utilização de linguagem escorreita, polida,
respeitosa e compreensível.
Art. 39. É atentatório à dignidade do cargo qualquer ato ou comportamento do
magistrado, no exercício profissional, que implique discriminação injusta ou arbitrária
de qualquer pessoa ou instituição.
O Ministro, o respeito e o Poder
Paula Emília Moura Aragão de Sousa Brasil, Juíza Federal *
Há cerca de 10 anos atrás, quando me preparava para fazer a foto para a galeria dos Juízes Federais da Seção Judiciária do Ceará, ouvi do fotógrafo, enquanto eu tentava arrumar meu cabelo: “Não se preocupe, doutora! A máquina vai registrar a alma.” E assim, pus-me em posição para o registro fotográfico.
Revendo a imagem, depois de tanto tempo, vejo que a minha alegria naquele momento, aliada ao sonho de fazer Justiça no meu país, deixaram minha aparência realmente mais bonita.
Não costumo me apresentar aos demais recitando minha profissão. Não acho relevante nas apresentações. Mas, hoje, permito-me relembrar tantas vidas que cruzaram a minha, em razão deste meu mister. Permito-me também o registro de que me restou, muitas vezes, desses momentos, o gosto bom de saber que tenho feito alguma diferença, por pequena que seja, para amenizar o sofrimento e a angústia de vidas cansadas e sofridas de tanta miséria, desigualdade e abandono. Por isso e por mais alguns pares de razões, devo confessar que me orgulho muito de ser juíza federal.
Faço essa confissão para dizer que, segunda-feira passada (8-abr-2013), amargurou-me o episódio divulgado em rede nacional, em que o Presidente do Supremo Tribunal Federal, em atitude de extrema agressividade e deselegância, destrata publicamente um magistrado consigo reunido, aliás mais de um, muito mais de um…
Pudesse eu dialogar com o aludido Ministro, far-lhe-ia meu desabafo, falando baixinho para não constrangê-lo e bem devagar para ter tempo de pensar antes de proferir minhas palavras.
Começaria dizendo:
– Ministro, Vossa Excelência, que é um homem de imensa bagagem intelectual, multiplamente pós-graduado, integrante da mais alta Corte do país, que preza a imagem de homem honesto e independente, recorda a estória do moleiro de Sans-Souci, certamente conhecida por Vossa Excelência, que inclusive estudou na Alemanha?
Então, eu continuaria:
– Excelência, essa estória cala-me fundamente, pois se trata de um episódio em que o homem simples do povo, demonstra fé genuína na magistratura de seu país. O moleiro, diante do Rei Frederico II, nega-se a entregar sua casa, o chão das sucessivas gerações de sua família; e às ameaças reais de esbulho, retruca afirmando ao Rei, que sua casa está resguardada, pois ainda há juízes em Berlim.
Senhor Ministro, com todo respeito, apesar do constrangimento que foi para mim assistir ao Presidente do Supremo Tribunal Federal desrespeitar escandalosamente um juiz, na frente de jornalistas, encontrei alento na resposta do meu colega juiz, Dr. Ivanir César Ireno Jr., porque nos fez lembrar, a todos nós, que ainda há juízes no Brasil.
Juízes, como eu, Excelência, trabalhadores, honestos, que abraçam a causa da Justiça, que batalham todos os dias contra uma avalanche de demandas que nos batem às portas, expressivas do clamor de uma sociedade, democrática sim, mas sofrida, desesperançada e abandonada por muitos de seus governantes.
Juízes, como eu, Excelência, que deixam a família em casa e vão para o fórum tentar fazer sua a parte, a parte que a Constituição do país lhes incumbiu, para tentar resguardar a dignidade de tantas outras famílias.
Juízes, como eu, Excelência, que se empenham no trabalho pela consciência do dever de virtude, que respeitam seus pares, sejam eles de instâncias inferiores ou superiores, mas que podem se dar ao luxo de falar o que deve ser dito, pois não pautam sua conduta pelo desejo de ascensão funcional.
Juízes, como eu, Excelência, uma ex-estudante esforçada e sonhadora, que logrou aprovação em concurso público para o ingresso na magistratura, um ingresso isento, democrático, justo, meritocrático e nada mais.
Juízes, como eu, Excelência, que olham nos olhos do jurisdicionado durante o interrogatório e dele despedem-se, dizendo-lhes um “seja feliz”; que sonham com o dia em que, no Brasil, nosso povo possa falar como falou o moleiro, pois, se nossa gente assim não fala, não é porque faltam juízes no Brasil, mas porque a muitos interessa que o povo não saiba do valor da magistratura nacional.
Esperava eu, Sr. Ministro, talvez ingenuamente, que Vossa Excelência, mesmo nunca tendo sido juiz, sendo Ministro Presidente do Supremo Tribunal Federal, não estivesse engrossando a fileira desses muitos.
Todos nós, Sr. Ministro, todos nós juízes merecemos respeito. É apenas o quanto pedimos dos outros, os outros como Vossa Excelência, que nunca foi juiz. Como Vossa Excelência mesmo ressaltou, Vossa Excelência é Ministro, Ministro Presidente do Supremo Tribunal Federal.
Juíza sou eu, o Dr. Ivanir César, o Dr. Nino Toldo, tantos de nós, que temos nomes sim, que desejamos e merecemos, como qualquer cidadão respeitado, ser chamados por ele. E que temos voz também, uma voz que repercute profundamente no seio da sociedade e que não precisa de permissão de nenhum homem ou mulher para se fazer ecoar. Uma voz, que não pode se fazer calar pelos gritos exaltados do destempero do Poder. Uma voz, que a Constituição quis que falasse pelo cidadão, no resguardo dos seus direitos, principalmente quando todas as outras vozes calassem ou dissessem o contrário.
Por fim, Ministro, se Vossa Excelência puder, peço que aceite o desabafo dessa juíza de primeiro grau ao Senhor Ministro Presidente do Supremo Tribunal Federal. Com todo respeito que devo a Vossa Excelência, que é o mesmo que desejo para mim mesma, para os meus pares e para os meus concidadãos. Seja feliz.
A beleza da democracia êh a efeméridade nos cargos ocupados! Logo o cafezinho êh servido frio e a figura sequer lembrada …
Excelente texto. Pelo visto o Min. Joaquim não representa os Magistrados brasileiros, sequer magistrado de carreira é.
Incauto, desrespeitoso para com os Juízes presentes ao encontro.
Fico a imaginar o tratamento dispensado aos advogados.
Ele recebe advogados, como determina a LOMAN?
Emendando: … como determina a LOMAN, o Estatuto da OAB e decisão já antiga do controle externo do judiciário, o CNJ. Vai esperar o Papa também mandar???
Lembram da colocação de que os juízes não poderiam ser tratados como motoristas de ônibus formulada “brilhantemente” pelo então representante da AJUFE?
Juízes não sabem pedir mesmo. Confundem atribuição de responsabilidades distintas com direito à diferenciação moral e social.
Caros leitores,
Se Magistrado é um trabalhador comum ou um servidor comum. Ele deverá receber ordens do patrão. Quem é o patrão? O governo. Se Magistrado se transformar num trabalhador qualquer. Ele não terá mais autonomia para decidir. Ele decidirá apenas o que o governo determinar. Então quando a população precisar de remédio, vaga em creche, aposentadoria.O JUiz não terá liberdade para decidir conforme a sua convicção, mas deverá decidir o que o patrão mandar. Por isso as manchetes de jornais dizem para a população que o STF causará prejuízo de milhões ao governo. Que os TRFs trarão prejuízo à nação. Por isso é perigoso dizer que Magistrado é um trabalhador/ servidor qualquer. Isso é uma falácia.
O problema do min. Barbosa, é que ele parece ainda guardar rancor da infância pobre que teve, buscando tratar esse rancor adotando um comportamento agressivo, grosseiro e despropositado contra todos que discordam de seus pensamentos. Em certa sessao do STF, o Min. Gilmar Mendes disse que o min. Barbosa tinha complexos. Na época achei um exagero. Agora, respeito e acredito na análise “mendesiana”, até porque foi feita por quem diuturnamente convivia com ele. É impensável que um juiz queira falar para as pessoas que quiser e bem entender e proibi-las de falarem o que ele nao quer escutar. Só no Brasil mesmo…
Por quê se refereir à associação de magistardos como “sindical”, soa pejorativo? Os juízes não saõ trabalhadores? São uma classe aacima do bem e do mal? Não podem levar um “bronca”? Sempre têm razão? Não podem ser contrariados? Por favor parem de reclamar e vão estudar os processos de suas instãncias!!!!
Francisco,
Os magistrados não podem fazer greve. Eles não são trabalhadores comuns, por isso não há sindicato de Magistrados. Existe apenas associações de Magistrados. Em tese as garantias constitucionais da Magistratura deveriam ser suficientes para proteger os Juízes de situações bizarras como as que foram descritas no blog.
Apenas por curiosidade: a França, que é para muitos modelo de democracia, tem os magistrados vinculados ao Executivo, mais precisamente ao Ministério da Justiça, e lá existe, sim, um sindicato de magistrados. Em caso de dúvida, consultar http://www.syndicat-magistrature.org/.
Luiz Fernando,
A constituição francesa não prevê garantias da Magistratura. A estrutura francesa é diversa da nossa. Nossa inspiração é a Constituição Americana.
O mesmo fato ocorre na Espanha, Portugal e Itália. Em todos os países citados há sindicatos de Magistrados. A Constituição espanhola prevê a garantia da inamovibilidade e da vitaliciedade para os Magistrados. Na Espanha, Portugal e França ocorreram greves da Magistrados.
Os colegas europeus e os americanos estranham muito quando conversamos sobre a condição do Magistrado brasileiro.
…”A constituição francesa não prevê garantias da Magistratura”…, mas nem por isso ali se diz que os magistrados são parciais, que as decisões deles não são confiáveis, que eles adotam atitudes censuráveis ou que eles são vítimas de abusos e perseguições políticas ou econômicas.
Pois é, Francisco, vivem em um mundo imaginário, no qual não podem ouvir não, não podem ser contrariados , não têm chefe e são melhores e mais importantes do que todos os outros agentes públicos, até mais do que o Presidente da República. Quanta bobagem, acordem senhores juízes, o chefe de todos , desde o Presidente da República até o mais humilde de servidor público é a senhora chamada Constituição Federal, simples assim.
Sra. Carlla,
Estamos esperando fundamentos jurídicos consistentes. Chega de mais do mesmo.
O que você faz com a sua cota de livros?
E nos 60 dias de férias que ela tem e reclama que outras carreiras jurídicas como o MP e a magistratura tem? Ela bem que poderia se dedicar, em
Apenas 30 dos 60, a ler um pouco.
Qual a profissão da Sra. Carlla?
Defensoria. Nao duvido que o ódio destilado contra a magistratura tenha por causa, a mesma de um advogado bastante frequente neste blog, a reprovacao em concursos. No caso deste advogado, apenas em 1 estado da Federaçao, houve 3 reprovacoes. E todas, toodaaas, na provinha preambular. Assim, fica óbvio que a frustracao dá lugar à serenidade.
A pergunta que não quer calar: sindicato é algo pejorativo? Qual o problema em associá-las às associações (com o perdão da suposta redundância).
Pelo menos ele e coerente. Não respeita nada nem ninguém e se julga acima das banalidades terrenas. Esta sentado à direita de Deus Pai Todo Poderoso ….