Latrocínios em alta e menoridade penal
Magistrado alerta sobre o aumento de latrocínios cometidos por menores.
Sob o título “Tanto fez, tanto faz…”, o artigo a seguir é de autoria do juiz de direito Gustavo Sauaia, de São Paulo.
Com a suspeita de que um menor tenha sido o autor do covarde latrocínio (como se existisse latrocínio corajoso…) de um estudante universitário, reforça-se o constrangimento de parte da sociedade, autoproclamada mais esclarecida, ao comentar a menoridade penal. Fica difícil se segurar na desonestidade intelectual de que “não há provas de que isso diminuiria a criminalidade”, desviando o tema de seu âmago: a notória capacidade que estes menores têm de compreender a gravidade do ato. Sob o temor de serem equiparadas a Datenas e afins, insistem na tese tida como “ponderada”. Porque ser ponderado, no Brasil, é achar que “não é bem por aí”. O resto, incluindo este que vos escreve, será rotulado como “radical”.
Além de fugir do tema, o argumento tradicional é falacioso. Salta aos olhos como os latrocínios se multiplicam, sendo cada vez mais cometidos por menores. Talvez o motivo seja simples demais para que as sumidades compreendam: com a superproteção jurídica, não há acréscimo de gravidade quando o menor, além de roubar, tira a vida de outrem. A conduta de roubo, por ser cometida com violência ou grave ameaça, já é ato infracional passível de internação. A partir disso, matar é um plus que, aos olhos da Lei, nada representa. De qualquer jeito, em até três anos o autor voltará ao meio social sem anotações. Se cometer um crime na maioridade, o ato infracional de morte nem poderá ser tomado como antecedente, muito menos reincidência. O suficiente para revoltar familiares, amigos e colegas das vítimas. Mas não toca, ao menos por ora, os legisladores.
O Direito comparado mostra que não existe padrão, nem de desenvolvimento ou ideologia, para fixar a idade na qual começa a responsabilidade penal. Países ricos e pobres, de direita ou esquerda, ficam entre os costumeiros 18 anos e parâmetros inferiores, sem contar aqueles em que é o próprio juiz que, no caso concreto, determina a imputabilidade. Isto deveria representar uma licença para jogar no lixo diferenças políticas e se concentrar no bem comum. Está claro que este modelo é falho. Ainda que a Fundação Casa fosse um monumento à recuperação social e psicológica, prevaleceria a intolerável distorção acima apontada. O adolescente continuaria podendo matar um, dois ou mais indivíduos, ficando com os mesmos três anos – no máximo – de internação. É óbvio que ele entende esta brecha e dela se aproveita. Neste caso, inimputável deveria ser quem não percebeu esta aberração até hoje.
Mais uma vez, infelizmente, deveremos ouvir os anseios por mudanças legais sendo rebatidos com a máxima de que não se deve discutir alterações no calor do momento. Assim, os momentos acalorados surgem em intervalos sucessivamente menores, mas continuam querendo adiar o debate com os mesmos subterfúgios. Não vou me valer do chavão de perguntar quantos terão que morrer para mudanças serem discutidas. A questão está mais para quem precisa morrer, pois parece que só se permite legislar “no calor do momento” quando o atingido é famoso – vide a Lei Carolina Dieckmann. Enquanto isso, restam os aplausos do auditório a alguma palavra de ordem do apresentador indignado. Até começar a novela…
A proposta da redução da idade penal é uma das atuais pérolas do popularismo penal brasileiro, cuja realização no presente quadro constitucional brasileiro é impossível. Na Constituição Federal, a inimputabilidade do menor de 18 anos é um direito individual do adolescente, sendo, portanto, cláusula pétrea que não pode ser abolida por emenda constitucional, tendo em vista o disposto no art. 5.º, § 2.º c/c arts 60, § 4.º e 228 da Constituição Federal.
Outra propaganda enganosa, bem ao gosto dos popularistas penais na defesa da redução da idade penal, é a de que não existe justiça para os menores de 18 anos que cometem crimes, imperando, assim, a impunidade.
Essa falácia foi refutada de modo inquestionável pela a Promotora de Justiça da Infância e da Juventude Beatriz Regina Lima de Mello, ao demonstrar que, se tomarmos como exemplo os maiores de idade que cometem crimes dolosos contra a vida, que vão a júri popular, como os homicídios: 50% deles são absolvidos e, dos que são condenados, a pena gira em torno de 9 anos de prisão.
Se considerarmos que, cumpridos 1/6 da pena, poderá haver a progressão de regime, então, após um ano e oito meses em regime fechado, o condenado poderá ser colocado em liberdade. Enquanto que, por outro lado, os homicídios praticados por adolescentes têm um índice de condenação superior a 80% e a manutenção dos mesmos em regime fechado dificilmente é inferior a 3 anos.
Nesse sentido, o mestre Beccaria, lá no século XVIII escreveu com maestria: Um dos maiores travões aos delitos não é a crueldade das penas, mas a sua infalibilidade (…). A certeza de um castigo, mesmo que moderado, causará sempre uma impressão mais intensa do que o temor de outro mais severo, aliado à esperança de impunidade.
ótimo artigo que sai do lugar comum e da mesmice…
Irretocável. Espero que este artigo se junte a outros e ao final comece a criar o caldo de cultura que favoreça a rediscussão não sómente da maioridade penal como também da revisão deste garantismo penal que tem servido sómente para aumentar a sensação de impunidade. É preciso por exemplo rediscutir a progressão de pena e o sistema de regime prisional. É inconcebível que a maior pena seja de 30 anos já que estatísticamente houve mudança na expectativa de vida da população brasileira. Já está passando da hora de debater a aprovação de uma emenda constitucional estabelecendo a prisão perpétua para determinados crimes.
Boa noite a todos,
Vi na uol que apenas 0,9% dos internos da fund. casa praticaram latrocinio.
Algo em torno de 82 individuos. Sera que e realmente o real problema criminal de sao paulo e do brasil. Nao vejo atribuicao do governador para esse feito… Talvez ele fosse mais efetivo dentro de sua atribuicao fazendo com que a policia civil investigue, fazer com que a policia militar cumpra as leis, e cesse a guerra civil dentro do estado. Que o governador gaste verbas em escolas ao inves de publicidade (2011) que em sp agora era proibido venda a menores, o que nao era nenhuma novidade…
Apos isso talvez ele se candidatasse a um cargo no legoslativo e encabecasse tal discussao, mas por enquanto que cumpra suas atribuicoes
Venda de bebidas
Agradeço, mais uma vez, ao Blog pela publicação de um artigo meu. Se há um espaço que compreende o termo “pluralismo”, é este.
Sem adentrar o mérito da discussão, só queria saber de qual fonte foi tirada a informação de que cresce o número de latrocínios praticados por adolescentes. Será que a mídia, que faz questão de frisar a ocorrência desse tipo de ato infracional, não gera uma sensação de insegurança sem motivo? Aliás, não me recordo de ter lido ou ouvido, recentemente, qualquer outra notícia a respeito de ato infracional análogo ao latrocínio praticado por adolescente.
Boa noite. A notícia abaixo não responde por completo, mas pode ajudar a demonstrar que não inventei esta gravidade. http://g1.globo.com/sao-paulo/noticia/2013/04/sao-paulo-tem-83-detidos-por-latrocinio-na-fundacao-casa.html
Independente de maioridade penal, vácuo normativo, opinião de defensores disso ou daquilo, é meu direito natural, defender-me da mesma forma (e com as mesmas armas) que me atacam; vida só tenho uma! É um desrespeito à sociedade, esse negócio de menor poder tudo impunemente; o fato de ser menor, não lhes da o direito de tirar a vida alheia. É preciso fazer algo sobre isso, e urgente!
Um passeio comigo (de no máximo meia hora) na grande São Paulo em um fim de semana qualquer, o fará mudar de ideia rapidinho! Se você não tem conhecimento de fatos assim e quer saber de estatísticas, de um pulinho ao IML de Osasco e região e confirmará os dados.
A diminuição da idade para responsabilização penal visa permitir a real retribuição a quem cometeu um crime, pois jovens de 16 anos tem a mesma capacidade de compreensão dos que tem 18 anos. Simples assim.
Concordo plenamente com o ponto de vista do magistrado, mas, infelizmente o que prevalece no paraíso da impunidade é a voz daqueles que têm, há décadas, o mesmo discursinho enfadonho e demagógico de lengalenga do tipo, é “pobrema social”, a diminuição da maioridade não diminui a violência e outras baboseiras que o povo já está cansado de ouvir e aqueles que se contrapõem a estes pseudo-humanistas são tidos como radicais e reacionários, enquanto isso os nenéns bandidos, carinhosamente chamados de “menó infratô” vão estuprando, seqüestrando, matando e chefiando quadrilhas e às pessoas de bem só restam viverem em regime fechando, sem direito a progressão de pena, banho de sol e saidinhas temporárias pra ver o coelhinho da Páscoa e o Papai Noel.
lúcido, este o adjetivo que pode ser atribuído a este texto.
Sou juiz e cumprimento o colega pela lucidez. Se apoiar a punição severíssima e exemplar dos menores infratores, com cadeia por muitos anos, é ser radical, então sou radical. Com certeza, a punição exemplar desestimularia muito os demais “de menor” que estão à solta por aí com armas na mão e matando como gente grande, com a tranquilidade que a frouxidão da lei atual garante.
Gostaria de sugerir que fosse publicado um artigo de um outro Juiz, mas em sentido contrário, fomentando o debate.
Excelente proposta ! Mas gostaria que os argumentos da defesa da imputabilidade penal viessem embasado em dados. P. Ex: Qual o crime que os menores mais cometem, em percentual; índice de “reincidência” etc.
Assim não fica um “defesa” vazia, baseado nos “achômetros” e na defesa do que é politicamente correto. Quero dados e soluções.
Onde se lê “imputabilidade”, leia-sê INIMPUTABILIDADE.
Acho que na Folha de quarta ou quinta foi publicado um
foi mesmo, colocando-se no mesmo balaio juízes e débeis mentais. Agora somam-se os adjetivos bandido, prevaricadores e inimputáveis todos aplicados aos juízes. Viva a imprensa livre.
Finalmente um lampejo de lucidez sobre o obscurantismo dos bem pensantes insensíveis.
No Jornal da Cultura de ontem assistimos impotentes à sustentação dessa tese furada de que a diminuição da maioridade não vai reduzir a criminalidade. Não é esse o foco. A redução só ocorrerá quando tivermos um povo altamente educado, todos sabem disso. Ou seja, daqui a 100 anos se começarmos agora.
Enquanto isso, no mesmo jornal eram exibidas imagens de duas crianças de 10 e 11 anos sendo levadas algemadas para a prisão. Elas haviam sequestrado e matado uma menina de 2 anos. Provavelmente vão pegar prisão perpétua, conforme as leis americanas.
Em alguns países mais avançados não existe idade mínima. Matou, vai para a cadeia como qualquer criminoso. Mas no país dos intelectuais que adoram posar de superiores, pregar essa tese seria o mesmo que oferecer a cara ao revólver das teses defendidas por eles.
Enquanto isso, um latrocínio ocorre a cada dois dias em SP.
Estou no grupo dos radicais.
Excelente, Gustavo. Brilhante texto!!
Como Promotor de Justiça que sou, perfeito o artigo, um tapa na cara do politicamente correto que domina o país.
Parabéns Frederico, por publicar muito sem dizer nada.
Exmo. Dr. Gustavo, sinta-se apoiado em sua posição e use sua autoridade para defender a parte vítima da sociedade, pois nós (a parte vítima) estamos abandonados.