Novos TRFs como polos de divergências
Para ex-presidente do TRF-5, “aventura” vai gerar “brigas paroquianas”.
Sob o título “PEC dos novos TRFs é inconveniente e inconstitucional”, o artigo a seguir é de autoria de Francisco de Queiroz Bezerra Cavalcanti, juiz, ex-presidente do TRF da 5ª Região e professor titular da Faculdade de Direito da UFPE. O texto foi publicado originalmente no site “Consultor Jurídico”
“Nada mais universal que os regionalismos”, a frase exprime um sentimento que atravessa fronteiras. O rio da minha aldeia não é o Tejo, mas é o rio de minha aldeia, já o disse Fernando Pessoa. Juízes de 1º grau sonham em ser alçados aos tribunais de 2º grau, os desse em integrar os Tribunais Superiores. Nada mais natural. Os políticos de cada estado em verem seus estados sediando TRF’s. Assisti, como diretor do foro da seção judiciária de Pernambuco à época, a disputa entre Pernambuco e Bahia pela sede do TRF-5, no final dos anos oitenta do século passado e a apertada votação, no TFR, em cumprimento ao artigo 27, parágrafo 6º do ADCT, que decidiu pela Sede do TRF-5 em Recife.
Esse fato fez com que representantes da Bahia, na sequencia, pleiteassem e conseguissem que a Seção Judiciária da Bahia ficasse vinculada ao TRF da 1ª Região, com sede em Brasília, e não a Recife, como seria mais lógico. Esse é um exemplo de disputas paroquianas que persistem pois são inerentes ao ser humano.
A PEC 544, recentemente aprovada no Congresso Nacional é um flagrante exemplo disso. Fragmenta a Justiça Federal, criando mais pólos criadores de divergências, o que não aconteceria com a mera criação de mais Turmas em TRF´s existentes ( quando necessário for), após exame da conveniência e oportunidade pelos órgãos centrais, CJF e STJ. A citada PEC, por outro lado, é eivada de vários vícios, inclusive que a maculam de inconstitucionalidade, alguns dos quais são aqui apontados:
1) O papel do ADCT é a adequação de situações preexistentes, ou temporárias à nova ordem constitucional. Não pode essa figura ser utilizada para vinte e quatro anos após a promulgação da Carta Constitucional se burlar a regra constitucional, do corpo permanente, no sentido de que a iniciativa de Projeto de Lei criando novos tribunais regionais federais seria, como o é, do Judiciário;
2) O segundo vício gravíssimo é fixar prazo de seis meses para a instalação desses tribunais, olvidando a vedação de criação de despesa sem receita, com a necessidade de criação de cargos em grande escala e despesas com equipamentos, mobiliários etc, ao arrepio do artigo 169, da Constituição Federal.
3) A violação do princípio da eficiência, criando-se tribunais, com elevação absurda de custo fixo, o que seria substituído por meras ampliações, com turmas especializadas nos tribunais existentes, com utilização da mesma estrutura administrativa, ampliando-se apenas alguns gabinetes, e adaptando-se as estruturas das secretarias judiciárias, com custo infinitamente menor. Afinal, eficiência e economicidade são princípios a serem observados inclusive pelo constituinte derivado.
A alegação de distancia entre os Tribunais e as Seções judiciárias é argumento falacioso. Ninguém se desloca do Acre para Brasília por via terrestre, para requerer junto aos Tribunais, para realizar sustentações orais. Além do que, com modernos meios informatizados, poder-se-iam instalar salas para sustentações orais em todas as Seções Judiciárias, com custo infinitamente menor.
Os três estados com situação mais crítica em relação à geração de processos para o 2º Grau são: Bahia e Minas, na 1ª Região; e São Paulo, na 3ª Região. Destacando-se a Bahia para a 5ª Região, com ampliação do quadro de Juízes naquele TRF, com custo reduzido e com a agregação de Minas Gerais à 2ª Região — RJ( ou a criação de um único TRF para esses dois estados), com ampliação de quadro e com ampliação do quadro do TRF-3, ter-se-ia resolvido o problema. Poder-se-ia então destinar um décimo desses recursos para solucionar o maior problema de congestionamento da Justiça Federal, que são as estruturas dos Juizados Especiais Federais, sobretudo das turmas recursais.
Persistindo a aventura da emenda constitucional, outras brigas paroquianas surgirão: poderão concorrer aos novos TRF’s juízes federais de todo o país, ou só os que se encontram nas novas paróquias a serem criadas? Poderão os membros dos outros TRF’s ser removidos para as novas cortes?
Penso que essa PEC merece de todos nós uma grande reflexão acerca do interesse público que deve pautar a ampliação de recursos para o Judiciário, além do necessário, em um país com tantas carências nas áreas de educação, saúde, habitação, que são muito mais importantes que os nossos interesses locais. Destaco apenas em pequena digressão que qualquer posicionamento que se tenha sobre o tema deve ser tratado sem “rusticidade”, pois as divergências são inerentes e salutares em um ambiente democrático.
Parece que o Desembargador do TRF5 esqueceu-se de mencionar que o Poder Judiciário não tem iniciativa de proposta de emenda à Constituição. O parlamentar tem. a EC 45, que alterou profundamente a estrutura do Poder Judiciário, extinguindo os Tribunais de Alçada e criando o CNJ, que, a propósito, já teve oportunidade no passado de se manifestar a favor da PEC 544, é inconstitucional? Não houve iniciativa do Poder Judiciário e foi declarada constitucional pelo STF referida emenda. Deixe-se de lado, pois, essa retórica sem fundamento jurídico. Quanto ao mais, os números estão aí para quem quiser lê-los: quem atua na Justiça Federal sabe que há uma taxa de congestionamento altíssima (a mais alta do país) por absoluta falta de recursos materiais e humanos. Com atendimento aos advogados muito bom, na média, e com número altíssimo de processos julgados, mesmo assim aguarda-se bem mais do que 5 anos para se ter um recurso de sentença de mérito julgado no 2º grau da 1ª Região (atualmente, há um mutirão lá para julgar somente os processos ajuizados de 2007 para trás. Esse mutirão ainda não terminou…). Isso porque, não obstante o trabalho árduo de todos os servidores, Desembargadores e os muitos magistrados de 1º grau convocados para mutirão, não há como dar-se conta da demanda. A necessidade de descentralização, assim, é clara. Basta perguntar aos advogados que efetivamente atuam perante esses tribunais e aos jurisdicionados que aguardam por vezes quase 10 anos para terem um recurso de mérito julgado (isso se não houver recurso ao STJ e ao STF…). Esses, infelizmente, não são formadores de opinião.
Muito sensato os comentários dos leitores,
Os números da Justiça em números são usados para cobrar as estatísticas dos Magistrados.
Mas os Magistrados não podem usar os números e as estatísticas para fomentar um debate sobre a melhoria do sistema jurídico.
Certo é deixar tudo como está e atacar a moral e a honra dos Magistrados. Temos, no Brasil, uma cultura de encontrar os culpados. A culpa é sempre do outro. Ninguém quer resolver o problema, quer apenas se justificar. Por causa disso, o sistema não evolui.
Pergunta que não quer calar:
Que tipo de Justiça a sociedade almeja?
Uma justiça em que os Magistrados são atacados moralmente?
Realmente o Brasil é um país em desenvolvimento. Vejam os números da criminalidade e dos valores envolvidos com a lavagem de dinheiro? O crime se especializa e aumenta os seus índices. A Justiça se justifica. Luta para se aprimorar. Mas o Poder Judiciário depende do Legislativo e do Executivo. Não obstante a existência das garantias constitucionais, que, em tese, dão independência ao Poder Judiciário. As leis são garantistas para os meliantes, mas para os Magistrados são apenas simbólicas.
A sociedade defende o MP e ataca os Magistrados.
Amigos, do que adianta todo o aparato dos Promotores e da Advocacia sem a independência e o respeito aos Magistrados?
A sociedade brasileira está perdida.
Depois, não reclamem. O povo terá a Justiça que merece ter.
Caro articulista,
pergunta que não quer calar:
Quanto custa para o país e para as partes a morosidade do Judiciário? Muito mais caro para o cidadão do que os novos TRFs.
O articulista deve deixar claro para o leitor que a Câmara dos Deputados, que representa o povo brasileiro, já decidiu sobre a temática. A Lei que será promulgada pelo Presidente do Senado teve o apoio da OAB e de toda a sociedade.
O orçamento do Poder Judiciário, do Ministério da Educação e do Ministério saúde são distintos, não confunda o leitor, por favor.
Outrossim, investir em Justiça é investir em toda a sociedade. Vide os valores de precatórios e RPVs pagos aos cidadãos.
Todos nós merecemos um Judiciário mais célere e eficiente.
A sociedade já decidiu o tema. O debate está encerrado.
Devemos respeitar o princípio da separação de poderes. Isso é democracia.
Endosso a spalavras da comentarista Beatriz.
Quem tem a razão a seu lado não precisa de muitas digressões numéricas.
o articulista pode me explicar objetivamente por que a Bahia não seria sede da 5a região se tem o pib 1,5 vezes maior que Pernambuco, e movimentação processual duas vezes maior?
http://daleth.cjf.jus.br/atlas/Internet/MovimProcessualJFINTERNETGRAFICOS.htm
http://pt.wikipedia.org/wiki/Anexo:Lista_de_estados_do_Brasil_por_PIB
Me parece que ele já explicou no texto. Fato é que a sede já está em Recife. Se a ideia é economizar e ser eficiente, mudar a sede não se coaduna com a premissa maior.
Não há dúvida dos dados colacionados pelo esclarecido comentador, mas insistir na criação de tribunais locais somente confirma a tese do articulista: viés regionalista.
Parabéns ao articulista. É a primeira manifestação sensata que leio sobre essa matéria.