Eleições diretas e subordinação nos TJs

Frederico Vasconcelos

Os comentários a seguir são trechos de artigo de autoria do juiz aposentado e, hoje, advogado Ovídio Rocha Barros Sandoval. O autor foi Juiz Corregedor da Corregedoria-Geral da Justiça e Juiz Auxiliar da Presidência do Tribunal de Justiça de São Paulo. O texto foi publicado em opúsculo de circulação restrita.

EDITADO: Para ler a íntegra do texto, baixe-o aqui: Eleições 

 

Existe uma tendência de defesa das eleições diretas para os cargos diretivos dos Tribunais, sob os mais variados argumentos, sendo o mais usado de que, uma vez instituídas, haveria uma maior democracia interna da Magistratura.

Todavia, trata-se de tema a exigir madura e serena reflexão por todos aqueles que se dedicam ao estudo do Poder Judiciário e, por consequência, da Magistratura.

(…)

Existe uma certa tendência à novidade, com reclamos de modernidade e anseios ditos democráticos.

Todavia, novidades, modernidades e avanços ditos democráticos podem se constituir em um risco capaz de colocar em xeque, não apenas a independência, como também a harmonia de propósitos que ditam, entre outros valores, a atuação dos Juízes.

A Política sempre teve, como raiz, a disputa e os contrastes se afloram. A possível amplitude de eleições, para cargos diretivos dos Tribunais de Justiça estaduais, com a participação de todos os magistrados, inexoravelmente, irá aumentar e distender a disputa e, por via de consequência, acirrar divisões entre os membros do Poder Judiciário.

“Quando a política penetra no recinto dos tribunais –lembra Guizot– a Justiça se retira por alguma porta”.

Formam-se diversos grupos de política interna dentro do Poder Judiciário, prejudicando uma serena atividade judicante. Plantam-se candidatos, à espera de um possível lançamento na disputa dos cargos. A oferta de favores ou troca de benesses, em negociações de apoio político, são inevitáveis, como inevitável, muitas vezes, a cizânia e com ela a divisão entre os juízes, com o cultivo das desavenças que a ninguém aproveita.

(…)

De outra parte, não haverá como evitar a entrada, no palco das lutas internas, da Política externa a influenciar magistrados e grupos dedicados à conquista do poder. Aí, então, as consequências serão nefastas: políticos, de fora, a influenciar as eleições internas dos cargos diretivos dos tribunais. Muitos magistrados passarão a ter suas imagens identificadas e moldadas pelas diversas correntes políticas e partidárias.

(…)

Deveriam os juízes ter seus olhos voltados para a nobre instituição do Ministério Público, onde há eleição geral, a começar para o cargo de Procurador-Geral de Justiça. As lutas internas são claras e, na maioria das vezes, desastrosas para a unidade de tão respeitada instituição, sem falar na influência exercida pelas correntes político-partidárias externas.

(…)

Permanecendo a escolha para os cargos diretivos nas mãos de integrantes de cada Tribunal, há e haverá sempre um relacionamento de coordenação, jamais de subordinação.

(…)

Com a abertura das eleições, para todos os Juízes, ao lado do relacionamento de coordenação entre os integrantes do Tribunal de Justiça passariam a existir relações de subordinação entre os desembargadores e os demais magistrados.

(…)

Será bom para o Poder Judiciário a eleição dos cargos diretivos dos Tribunais de Justiça por eleitores-juízes?

Estaremos a avançar, ou abraçando uma perigosa modernidade de uma pseudo democratização do Poder Judiciário?

Haverá, pela só razão de instituir-se eleições gerais, uma melhoria para a atuação jurisdicional dos juízes, bem como dos seus serviços auxiliares?

Haverá melhoria na atuação jurisdicional e administrativa dos Tribunais de Justiça, com a implantação das eleições gerais?

A universalidade dos votantes será motivo de aplausos ou, ao contrário, veículo de preocupações pelos diversos riscos que encerra?

São perguntas que estão a exigir, a partir de uma serena reflexão, respostas conscientes por parte de todos aqueles que almejam um Poder Judiciário independente, altivo e capaz de defender a soberania de suas decisões e sem se deixar influenciar por correntes políticas internas e externas.

(…)

A luta política, ao invés de trazer melhores caminhos à Magistratura, irá introduzir em seu seio a disputa, a divisão, a desgraça de minar entre seus membros desavenças, muitas vezes irreversíveis e de vestir Juízes, não com a toga da independência e da serenidade, mas com os ternos dos políticos desejosos de “fazer carreira“.

Comentários

  1. O argumento é discriminatório, voltado apenas para excluir a base das decisões dos tribunais, pois a disputa política já existe, sendo “privilégio” das cúpulas. Ademais, preservar o atual estado de coisas, como se estivéssemos no melhor dos mundos, é ignorar o estado de caos, miséria e serviço público medíocre e ineficiente que se presta (?) à população.

  2. Enganam-se aqueles, que a exemplo do articulista, consideram a política, a priori, como um campo de batalha do qual inexoravelmente brotam a discórdia e o confronto. Nesse sentido trata-se antes da luta pelo poder político. Pelo contrário, uma das características do espaço político “é inclusividade do ser humano e sua ação nas esferas possíveis de atividades dos membros da comunidade e a possibilidade de encaminhar tais atividades aos fins desejados ou de desviá-las de um fim não desejado”. Esta é a diferença da política para a policagem. Mas o conceito que rege as mudanças propostas é a Democracia e não a Política e creio que este primeiro conceito causa calafrios a alguns “Deuses” encastelados nas cortes superiores de justiça que devem seus lugares a alguns conchavos intracorporis.

  3. A subordinação decorre do compromisso assumido por ocasião do pedido de voto. E não é anda gratificante ver repetido episódio ocorrido no MP, segundo chegou a meu conhecimento, em que um promotor substituto, ao rebelar-se a propósito de uma designação teria afirmado ao assessor que a aceitaria, mas que na eleição seguinte votaria na candidatura de oposição. E vou mais alémn (confortavelmente, porque sempre tive esse entendimento: os magistrados integram o podere judiciário. Os tribunais, não, pois são integrados pelos desembargadores. Que assinam termo próprio de posse, ao contrário do que ocorre nas promoições anteriores, em que a posse se dá pela simples assunção das funções do novo cargo.

  4. O assunto é de muito interesse para os brasileiros, e me interessa particularmente. No entanto, fico frustrado e não posso comentar sobre a matéria porque o texto base foi editado, figurando partes deles apenas, o que impede a visão de conjunto. Trechos retirados do todo podem dar margem a interpretação inadequada.

  5. O que o artigo omite é que disputa já existe, vez que o Presidente é eleito pelo Tribunal, somente pelos votos dos Desembargadores.
    Além disso, não há relação de subordinação entre o Presidente e os juízes, pois o Presidente não dá ordens a Juiz, e a função de fiscalização é exercida pelo Corregedor, que será escolhido somente pelos Desembargadores.
    A necessidade de mais atenção ao 1 Grau (composto somente de juízes) – que todos pregam em seus discursos, mas quase ninguém põe em prática – é também uma justificativa para mudança, pois o orçamento é escasso e sempre investido em favor daqueles que detém o poder de voto…..E vejam, melhoria em 1 grau é melhoria para o jurisdicionado, pois a população é atendida fisicamente em 1 grau, ou seja, pelo juiz….

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