Juiz diz que jurisdição criminal não compensa

Frederico Vasconcelos

Do juiz federal Marcello Enes Figueira, do Rio de Janeiro, sobre a decisão da Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal de recomendar ao Conselho Nacional de Justiça investigar se o juiz federal Sergio Fernando Moro, de Curitiba, cometeu falta disciplinar em ação penal que condenou um doleiro no Caso Banestado:

À luz dessa notícia, sugiro que reflitam sobre o diagnóstico do Ministro Joaquim Barbosa acerca dos juízes, a tal mentalidade pró-impunidade (contraposta ao pendor progressista dos membros do Ministério Público).

Se é que existe essa tal mentalidade (isto é, existe um estado de ânimo, subjetivo, em cada juiz ou na maioria dos juízes voltado para a impunidade ou há uma sistema que objetivamente desfavorece a efetividade do processo penal?) de onde ela emana?

De todo modo, para os juízes sérios –-que acredito serem a maioria-– é duro receber as palavras do presidente do Supremo, que se demite da função de chefe da instituição e acredita que achincalhar os seus membros é produtivo.

De minha parte, tomei a providência recomendável: abandonar a jurisdição criminal. É ela, e não o crime, que não compensa.

Comentários

  1. vendo de fora realmente nao compensa, a justiça criminal e a parte “feia” do judiciario e so verificar o numero de varas em comparação com as civis.
    Os juizes criminais deveriam ganhar mais pelo risco que correm

  2. Razão assiste ao magistrado. A Justiça Criminal no Brasil é frustrante desde o momento em que se tenta fazer um boletim de ocorrência na repartição policial até a fase da execução criminal. É uma decepção atrás da outra.

  3. Não se acovarde juiz. Seja firme e tenha um postura pro-sociedade. Isso faz parte, essa pressão, é porque o réu é banqueiro, duvido que o Dr. Sergio Fernando Moro abandone a jurisdição criminal, duvido. Acho que ele manterá firme nela.

    1. Não se trata de acovardar-me, meu caro. Quando ingressei na Magistratura poderia ter optado por outras carreiras mais rentáveis e cômodas. Não quis assim. Nunca quis amarrar o boi na sombra e tampouco meu objetivo é ficar rico. O que eu pretendia ingressando na Magistratura era fazer justiça, nos limites da ordem jurídica.

      No entanto, para isso é necessário que o Poder Judiciário e suas garantias dêem respaldo à atuação dos juízes. Ameaças externas são previsíveis, mas devem esbarrar na fortaleza de uma instituição republicana. Não é o que acontece. O Poder Judiciário não vela por essas garantias e a própria sociedade não quer assim. Daí porque o custo pessoal fica muito elevado para o meu gosto. O benefício para a sociedade, por outro lado, é mínimo, porque a maior parte do que se faz se perde. É difícil assim alcançar inclusive satisfação profissional.

      Não abandonei a magistratura nem a minha dignidade, apenas removi-me para uma especialidade menos custosa. Como eu, asseguro, muitos outros. Admiro muito e solidarizo-me com outros tantos colegas que persistem.

      1. Prezado Marcello,
        Eu entendo perfeitamente a insatisfação diante das críticas do Ministro Joaquim, aliás , ninguém, gosta de ser criticado( não seriam os juízes diferentes), em especial pelo chefe do Poder no qual se está inserido. Mas abstraindo se tem ou não razão o Ministro Joaquim em suas críticas ( particularmente penso que as críticas em parte são de fato injustas ), não me parece que tais críticas ( ou mesmo procedimentos abertos pelo CNJ, afinal foi criado para isso) atinjam garantias do Judiciário, qual garantia estaria violada em razão de críticas aos juízes ou da atuação constitucional do CNJ? Entender o contrário, seria o mesmo que defender que o Judiciário não pode ser criticado e nem investigado, o que não me parece democrático e muito menos republicano. Com todo o respeito, você acaba sempre desmerecendo outras carreiras e de certa forma demonstrando que talvez não tenha a necessária vocação para a magistratura, ao dizer por exemplo “que poderia ter optado por outras carreiras mais rentáveis e cômodas”. Ademais, em nível federal , carreira mais rentável que juiz federal talvez só o MPU ( tem alguns privilégios “extras”…) e uma ou outra carreira isolada do Congresso Nacional. Mais cômodas… bem, aí já é mais complicado aferir…, até porque, como disse o poeta Caetano, “cada um sabe a dor e a delícia de ser o que é”. Att.

  4. É oportuna a colocação do magistrado. Mesmo não sendo juiz, compartilho com ele do sentimento de frustração no tocante à jurisdição criminal.
    Procurar razões jurídicas para isso é inútil (essas já são fornecidas pelos advogados criminalistas, basta colocar de lado o discernimento).
    A postura elitista de nosso Judiciário se reflete muito mais em sua “conformação hierárquica” (é suficiente pra chegar a essa conclusão uma rápida leitura da jurisprudência do STJ e do STF), do que em sua composição. Juízes que atuam seriamente no combate a crimes do colarinho branco não têm outro destino senão a reação institucional. Evidentemente, nunca serão nomeados para vagas na cúpula do Poder, salvo por “erros de cálculo” jamais vistos, como foi a nomeação de Joaquim Barbosa…

  5. Infelizmente, a verdade dói mas tem que ser dita: sabemos todos que existem inúmeros magistrados que “se vendem”. E os que são flagrados constitui um número diminutivo. Talvez o pecado do presidente do STF, ao tocar no assunto, tenha sido o modo pouco cortês e ofensivo ao abordá-lo, fato que, aliás, já está se tornando rotina. Lembre-se o tratamento dado a um jornalista e o ataque gratuito ao horário em que advogados paulistas acordam.

  6. Enquanto isso, no Brasil, para os pequenos traficantes:
    (notícia do ESP, Editorial, “O Pequeno Traficante”, 28/05/2013.) O tema sobre criminalidade organizada e tráfico de drogas é tão controvertido que recentemente para tentar coibir a disseminação do tráfico de drogas e os crimes violentos dele resultantes, o E. Superior Tribunal de Justiça (STJ) está recomendando aos juízes criminais que apliquem a Lei de Crimes Hediondos ao julgar os pequenos traficantes de drogas. Editada em 1990, essa lei aumentou as penas para vários tipos de crime, como sequestro, tortura, homicídio e tráfico de entorpecentes, e atendeu à determinação da Constituição, cujo artigo 5.º determina que esses delitos são “inafiançáveis e insuscetíveis de graça ou anistia”. A decisão do E.STJ foi comunicada este mês aos tribunais de segunda instância e servirá de orientação para os recursos que forem impetrados na última instância da Justiça Federal. Pela legislação penal comum, os condenados pelas Varas de Execução e Câmaras Criminais podem passam do regime fechado para o semiaberto depois de cumprirem 1/6 da pena. Já a Lei dos Crimes Hediondos, além de vedar o perdão da pena e negar indultos aos condenados, determina que a passagem do regime fechado para o semiaberto só pode ser concedida após o cumprimento de 2/5 a 3/5 da pena. A justificativa do E. STJ é de que o pequeno traficante é um elo importante na divisão do trabalho do crime organizado, exercendo o papel de varejista. A ideia é que, independentemente da quantidade de droga que venda, ele é tão pernicioso quanto os chefes da quadrilha. As Justiças estaduais têm o mesmo entendimento. Das 16 Câmaras Criminais do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP), por exemplo, 12 vêm condenando os pequenos traficantes ao regime fechado e negando a aplicação de penas alternativas para condenações abaixo de quatro anos. Esse entendimento colide frontalmente com as posições do governo federal e dos governos estaduais, que há muitos anos sugerem à magistratura criminal que puna os pequenos traficantes e os condenados por crimes com baixo potencial ofensivo e baixo valor com penas alternativas, que incluem serviços comunitários. Ministros e secretários da Justiça e da Administração Penitenciária costumam dizer que as penas alternativas ajudam a reeducar os presos. Na realidade, o argumento é um pretexto para ocultar a resistência dos governos federal e estaduais em expandir o sistema prisional, que tem 310,6 mil vagas e abriga 548 mil presos. Essas autoridades temem que, se a orientação do E. STJ for seguida e os juízes criminais passarem a condenar os pequenos traficantes ao regime fechado, o déficit do sistema prisional – que hoje é de 237,4 mil vagas – aumentará ainda mais. Além de alegar que a expansão do sistema prisional é atribuição do Executivo, os ministros do STJ e de tribunais superiores afirmam que a substituição de penas privativas de liberdade por penas alternativas, só para economizar recursos, põe em risco a segurança pública. “Onde o traficante, disseminador de vício nefasto no seio da sociedade, cumpriria prestação de serviços à comunidade ou entidade pública? Nas escolas? Nas creches? Nos orfanatos? Nos abrigos? Nos hospitais?”, indaga o desembargador Eduardo Chaib, num caso em que o réu foi condenado a um ano e 8 meses de reclusão por estar com quatro pedras de crack e 5 porções de cocaína.”Traficantes de substâncias entorpecentes, sejam de pequeno, médio ou grande porte, não têm perfil para iniciar o cumprimento de sua pena que não seja em encarceramento. Mesmo o pequeno traficante merece punição severa. Basta que a venda de drogas seja realizada uma única vez, para que cause uma série de malefícios ao consumidor, o que repercutirá em toda a coletividade”, diz o desembargador Toloza Neto, em outra decisão. Ao julgar um caso semelhante ha sete meses, o ministro Luiz Fux, do STF, manifestou o mesmo ponto de vista, afirmando que, se tratarem os pequenos traficantes de forma leniente, os tribunais estarão disseminando o sentimento de que o crime compensa. A orientação do STJ e a política adotada pelo TJSP mostram que, nessa matéria, estão chegando ao mesmo entendimento. (notícia do ESP, Editorial, “O Pequeno Traficante”, 28/05/2013. A recomendação do E. STJ tem uma clara conotação de política criminal, fato absolutamente admissível para a doutrina moderna. Juízes ao aplicar uma pena conduzem uma política criminal erigida pelo legislador).

  7. Há um detalhe curioso sobre a questão:

    Há mais de cinco anos o Habeas Corpus, noticiado no blog, está em tramitação.
    Pergunta que não quer calar: Por que noticiaram no site a necessidade de fiscalização de um juiz com a capacidade e inteligência do Dr. Sérgio Moro? Não há necessidade de publicidade nessas questões. Esse tipo de notícia desmoraliza o judiciário perante a população brasileira e o mundo.
    Por que os Ministros nunca manifestam nos seus votos a insatisfação com advogados que participam de forma direta ou indireta da criminalidade organizada? Por que não oficiam à OAB.
    Por favor, divulguem essas notícias e incongruências para a imprensa internacional.

    O Supremo Tribunal Federal hoje defende os poderes do Ministério Público e desmoraliza o Poder Judiciário.

    No mundo inteiro a criminalidade organizada é tratada com mais seriedade.
    O Brasil está muito próximo de se transformar num país com graves problemas democráticos, como tantos outros na américa latina.

    O pior cego é o que não quer ver.

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