Ajufer: “pizza com massa grossa”

Frederico Vasconcelos

Reportagem publicada nesta sexta-feira (12/7) na Folha revela o resultado do julgamento, pelo Tribunal Regional Federal da 1ª Região, de processo disciplinar contra quatro ex-presidentes da Ajufer (Associação dos Juízes Federais da 1ª Região) acusados de usar o nome de 157 colegas magistrados para desviar recursos da Fundação Habitacional do Exército.

O resultado, depois de quatro sessões –num julgamento que começou em fevereiro e foi concluído no final de junho–, aparentemente confirma o que previam vários juízes federais.

Em abril de 2011, eles entregaram à corregedoria do TRF-1 um abaixo assinado [reprodução abaixo], pedindo “julgamento célere” e afirmando que seus nomes foram utilizados “de forma irresponsável, temerária e fraudulenta pela Ajufer”.

Na ocasião, eles diziam temer que o caso “acabasse em pizza”. Na avaliação de um juiz que acompanhou as investigações desde o início, e que pede para não ter o nome revelado, o julgamento concluído em 27/6 terminou em “pizza com massa grossa, com tempero ruim e de difícil digestão”.

O Ministério Público Federal acusara os ex-presidentes de utilizar de forma fraudulenta o nome de 157 juízes –sem que eles soubessem– para desviar, por meio de 700 contratos de empréstimo fictícios, mais de R$ 20 milhões enquanto exerceram a presidência da Ajufer.

A Folha revelou o desvio de dinheiro em março de 2011. Entre os beneficiários estão associados fantasmas. Cheques da Ajufer foram descontados na boca do caixa e depositados em outras contas para dificultar o rastreamento. Empréstimos para juízes foram depositados em nome de construtoras, de concessionárias de veículos e de laranjas.

O julgamento de um caso com essa gravidade resultou na aposentadoria compulsória (com vencimentos proporcionais ao tempo de serviço) de um ex-presidente que está aposentado por invalidez há dois anos (Moacir Ferreira Ramos) e na aplicação de penas brandas a outros três ex-presidentes: censura (Hamilton Sá Dantas e Solange Salgado) e advertência (Charles Renaud Frazão de Moraes).

Discute-se, agora, se teria havido equívoco na proclamação do resultado. Ou seja, se o resultado anunciado seria condizente com os votos proferidos.

A juíza Solange Salgado, por exemplo, recebeu 7 votos pela aposentadoria compulsória e 3 votos pela disponibilidade. Não houve os dez votos necessários para nenhuma das duas penas. O TRF-1 decidiu aplicar a censura, pena dada por 5 juízes.

Como foram 10 votos favoráveis a uma pena grave (7 pela aposentadoria e 3 pela disponibilidade), há quem entenda que deveria ter sido aplicada a pena de disponibilidade (ou seja, quem vota pela aposentadoria, pena mais grave, vota obviamente pela disponibilidade).

A discussão envolve o entendimento adotado pelo Supremo Tribunal Federal em relação ao artigo 21 da Resolução 135 do Conselho Nacional de Justiça (ADI 4638).

Resta aguardar se o Ministério Público Federal vai oferecer embargos de declaração para esclarecer essa questão obscura.

À reportagem, o juiz Moacir Ferreira Ramos alegou que sofreu “extremo cerceamento de defesa”. “Eu nem sequer fui interrogado e não pude apresentar as minhas alegações finais”, afirmou.

A juíza Solange Salgado disse que foi “vítima”, e que foi “enganada”.”Assinei contratos em confiança, mas houve liberação de dinheiro com contratos em branco. Em alguns casos, falsificaram minha assinatura”, afirmou a magistrada.

A reportagem não conseguiu ouvir Hamilton de Sá Dantas e Charles Renaud Frazão de Moraes.

Comentários

  1. Então precisa de 10 votos a 0 para se punir um juiz? O Ministro Joaquim Barbosa estava certíssimo quando disse que temos uma inteligente burocracia da impunidade. A punição existe no papel, mas se criam tantas normas, subnormas, recursos, tipos absurdos de VOTAÇÕES que fica impossível qualquer tipo de punição verdadeira. Afinal de contas que raio de punição é um censura?

    1. E quando alguém reclama da impunidade, lá vem a gritaria histérica sobre a violação da independência do judiciário, ditadura, “a quem interessa isso?” etc.

  2. Fim do foro previlegiado, autorização para que a policia faça as investigações de forma geral e irrestrita.

  3. Caro senhor Fred,
    Cabe aos procuradores decidirem se embargam a decisão ou não. Lembrem-se que o dominus litis é o Ministério Público.
    Recordem-se que o Poder Judiciário é composto por homens e mulheres passíveis de erros. Se há equívocos é necessário propor recursos ou recorrer ao Conselho Nacional de Justiça.
    Os acusados cometeram crime de estelionato contra colegas, magistrados. O caso envolveu colegas de trabalho e instituições privadas. Os fatos interessam as partes que estão envolvidas.
    Os juízes acusados ficaram mal vistos entre os colegas, o nome dos acusados foi revelado pela imprensa para toda a sociedade e os colegas deixaram a magistratura maculados e isolados. A vergonha dos fatos também é uma severa punição. Cabem as partes recorrerem e pedirem ressarcimento por danos morais e materiais.
    Se os magistrados não são mais juízes e o MP pode recorrer, por que o título do artigo?
    Qualquer um do povo tem direito à ampla defesa e ao contraditório.
    Há outros temas muito importantes para a cidadania que poderiam ser debatidos no seu blog. Alguns colegas fizeram ótimas sugestões. abs.

    1. Também nao entendi onde a Pizza. Os responsáveis foram punidos administrativamente,alias é sobre isso a noticia; o MP poderá e devera propor a ação penal apropriada. É incrível: até para noticiar uma punição de juiz, diz-se que a pena é uma fatia de pizza. Assim nao da para levar a serio a imprensa.

    2. Caro (a) CSS, sugiro ao leitor (a) que, antes de afirmar que há “outros temas importantes para a cidadania que poderiam ser debatidos no blog”, refaça o percurso seguido durante vários meses por este repórter: procure ouvir magistrados que um dia descobriram ter dívidas milionárias, não assumidas por eles, e pergunte se, ao saberem que foram vítimas de fraudes praticadas por colegas magistrados, concordam com sua leitura condescendente de que “os fatos interessam apenas às partes que estão envolvidas”; ou que foi feita Justiça porque os “acusados ficaram mal vistos entre os colegas”. Juízes foram acusados de usar o nome de juízes para forjar contratos fictícios e desviar recursos que somam mais de R$ 20 milhões. É miopia sugerir que se trata de uma fraude menor porque o caso “envolveu instituições privadas”. O que surpreende é ver a magistratura não se indignar diante desse escândalo, e silenciar em nome da preservação da imagem do Poder Judiciário. Gostaria de receber manifestações das vítimas, concordando que, nesse caso, “a vergonha dos fatos é uma severa punição”. A propósito, já que a pergunta foi feita, o título do artigo reproduz a avaliação de magistrados sobre o julgamento. Abs. Fred

      1. A Magistratura está indignada, mas não há necessidade de exposição. Os fatos serão apuradas e isso é o que importa para todos. As vítimas estão atentas aos fatos, elas recorrerão no momento oportuno. att.

        1. Se a exposição não fosse necessária, o julgamento não seria público. Se as vítimas não temessem a pizza, não teriam protocolado abaixo-assinado na corregedoria, em 2011, pedindo celeridade nas investigações. A indignação silenciosa e intramuros favorece a impunidade. A divulgação ampla do episódio, e de seus desdobramentos, atende ao interesse público. Att.

          1. Frederico, meu caro,
            A publicidade do ato não é feita para expor as pessoas, disso eu divirjo. Ela é concretizada para que as decisões sejam democráticas, por isso elas são públicas.
            As partes deveriam ter recorrido ao Conselho Nacional de Justiça, esta é a minha opinião.
            O caso interessa às partes por isso elas o procuraram. Eu acho todo o episódio lamentável. Eu não entendo porque eles não entram com ações por danos morais e materiais, este é o caminho lógico. Quanto aos magistrados acusados, eles perderão o cargo quando a decisão definitiva transitar em julgado. Cabe ao Ministério Público fazer a sua parte; para que o afastamento aconteça com a maior brevidade possível deveríamos estar debatendo a PEC da impunidade, este é um assunto muito importante para todos.
            De fato, concordo com você sobre a importância da imprensa para transparência das instituições e para o combate à impunidade. Espero não tê-lo ofendido. att. CSS.

          2. Caro (a) CSS, não me ofendi. O debate em termos elevados é saudável e deve ser estimulado. Raramente opino ou respondo aos leitores, por entender que disponho de espaço desproporcional e condições desiguais para alimentar polêmicas. Mas julgo importante o leitor saber, de vez em quando, quais sãos motivos da escolha de determinados temas, e por que tiveram destaque, para não parecer simples sentimento persecutório. Receba meu abraço. Fred

    3. A pizza está exatamente nas penas aplicadas. Sinceramente, se fosse para “qualquer um do povo” estariam gritando cadeia. Mas quando os estelionatários são representes da magistratura censura está de bom tamanho. Claro, não dá para prejulgar sem ver o processo e os próprios “condenados” não concordam com o resulto e se manifestaram na própria reportagem (dois deles ao menos), mas há algo de MUITO errado aí. Com todo o respeito, uma conduta com essa gravidade, cometida exatamente por quem deve ser exemplo, humano sim, mas exemplo, o descrédito e a “vergonha” não são punição o suficiente.
      Admiro o fervor do (da?) CSS em defender a magistratura, o que sempre faz com desenvoltura nos comentários deste blog, mas uma postura um pouco mais isenta seria mais útil ao debate.

  4. Onde foi parar o dinheiro? Quem ficou com o prejuízo? Podemos suportar quadrilha de malfeitores no judiciário? O que o Joaquim Barbosa e o Gilmar mendes acham disso? Como chamar o suposto mensalão de crime diante de uma “coisa” dessas? Cadeia é só para pobre, preto e prostituta? Resposta: é, porque o andar de cima não rouba, apropria-se, incorpora, aglutina ao patrimônio. Só pobre é ladão.

  5. É por conta de fatos como esse que sinto vontade de chorar quando alguém defende que ocupantes de cargos eletivos devam “ter preparo”… As maiores rapinagens deste país foram feitas por “Doutores”!
    Já passou da hora de mudar a Legislação aplicável a tais casos, pois quem se desvia deve ser punido com dureza, independente do diploma que ostenta ou do cargo que ocupa.

  6. E o pior de tudo é que: Foi aposentado com proventos proporcionais ao tempo de serviço, isso lá é castigo????????? Isso é prêmio, que será apgo com o meu o seu dinheiro, aliás, com o dinheiro de todo povo brasileiro. E ainda, vem o Tal de SENADOR BLAGIO MALA( sic), que está querendo deixar tudo como está, ou seja, continuar aposentado Juízes e promotores corruptos, faltosos, prequiçosos etc. se liga cara, as ruas não querem isso mais não. Fiquem espertos Senadores e Deputados, nós vamos colocar pressão nisso.

    1. Marcelo, se o cidadão aposenta é porque contribuiu para isso, durante anos, certo? Ou então que sejam devolvidas ao servidor todas as contribuições vertidas! Sejamos coerentes.

      1. Prezado Godoy,

        No Sistema previdenciário brasileiro como é sabido, existe o principio da compensação entre os entes, nada contra o Magistrado punido, pegar seu tempo de contribuição e juntar com outro tempo aqui fora, e aposentar. O tempo de previdência não é perdido, ao contrário deve-se juntar a outro tempo de contribuição para que o mesmo possa aposentar pelo INSS, como, aliás, todos os servidores fazem. O que não dá é aposentar com esse tempo proporcional, com salários altíssimos as custas do contribuinte, até qdo esse sistema vai aguentar isso? Qdo se defende isso, joga-se todo o pudor de uma categoria para o lixo.

  7. Como se aposenta alguem ja’ aposentado? Premia-o com uma segunda aposentadoria?
    Quem toma esse tipo de decisao?

  8. O resultado apenas confirma a necessidade de aprovação da PEC que põe fim a este descalabro. Ou seja, o próprio Poder Judiciário é incapaz de punir com o rigor necessário aqueles entre seus membros que transgridem a Lei. O que este Poder não vê é que cedo ou tarde as manifestações de rua se voltarão explicitamente contra o Judiciário e manobra ou lobby algum nos bastidores do Congresso será de grande valia pois o povo está atento a este estado de coisas.

    1. Por esse raciocínio então o Judiciário não poderia julgar seus membros em todas as esferas. Inclusive criminal. E se já não conseguem julgá-los a eles próprios por que poderiam julgar outros? Logo, é melhor acabar com esse tal de Judiciário. Tomada a exceção como regra, com certeza as ruas voltar-se-ão contra o Judiciário. Aí serão elas as responsáveis pelos julgamentos. Que tal?
      Dê uma olhada na entrevista de Jarbas Vasconcelos, hoje na Folha e preste atenção à penúltima resposta sobre a lorota das reformas do Renan.

      1. Sérgio,

        Aquele Jarbas Vasconcelos, também não tá com nada. O que ele já fez de bom par ao país? Qual o legado dele? É um politico profissional, como todos do PMDB, o Renan não vale muita coisa, mas a turma lá, com exceções raríssimas, a turma lá não tá com nada. Ruim como estar prefiro o Renan, pelo ao menos algo foi votado, e quer inclusive ajudar resolver essa questão das aposentadorias vergonhosas do poder judiciário e do MP, vcs criticam, criticam queria ver uma linha escrita sobre esses malfeitos. Se fossem advogados, vcs subiriam às telhas. Vitaliciedade, não poderá ser confundida com despotismo, corrupção, crimes. Tudo muda nesse mundo, so o PJ e o tal MP não querem mudança, eu como pagador de imposto, não aceito mais isso, e acho que os demais brasileiros também não.

        1. Caro Senhor Marcelo Fortes, Tudo se transforma no sistema, mas as garantias constitucionais e o Poder Judiciário existem para garantir os seus direitos e de todos os brasileiros, por isso alguns direitos são imutáveis, eles são denominados de cláusulas pétreas, tais direitos só podem ser alterados mediante golpe de Estado ou revolução.
          As garantias da magistratura têm essa natureza de garantia democrática.
          Em relação aos corruptos e bandidos
          , leis existem e devem ser aplicadas com rigor. Este é o desejo dos juízes, dos promotores e da sociedade. Não é necessário mudanças da lei, basta o funcionamento do sistema. Leia Habermas. att.

        2. Marcelo,
          Lembra-se de uma notícia aqui no blog sobre o afastamento e a aposentadoria de juízes que teriam recebido mala preta? Pois é. Eu postei três vezes aqui no blog: e os advogados donos da mala? Quem são? O que aconteceu com eles? Ninguém respondeu. E pelo jeito não vão responder. No Conjur ocorreu a mesma coisa com outro que teve essas dúvidas.
          Muitas vezes tenho a impressão que só há a figura do juiz na justiça, sobretudo quando não funciona. É raro ver matérias sobre advogado.
          Então ouso dizer que essa sua percepção está equivocada.
          No mais, nem adianta argumentarmos muito. Seríamos repetitivos. Conversa sem ouvidos. Mas eu ainda prefiro o Jarbas (o Vasconcelos) ao Renan.

  9. É por essas e outras que defendi a PEC37 porque é preciso ter presente que sem uma sentença condenatória, de nada adiante o MP eficiente nas investigações.
    De nada adianta um processo regular e que acabe sendo sentenciado porcamente.
    É por isso que o “gigante que acordou agora” deveria bater às portas dos Tribunais, porque grande parte dos problemas está na qualidade da nossa Justiça.

  10. Mais um motivo de desânimo e desalento. Serão necessárias muitas manifestações nas ruas e o término da impunidade para que os que se acostumaram à imoralidade pensem antes de serem desonestos. Continuarão sem-vergonhas, mas pelo menos terão medo das consequências e quem sabe seremos poupados de notícias como essas.

  11. Que nome se pode dar a uma organização que utiliza de tais procedimentos?mais triste é encontrar quem os defenda. Definitivamente, este nosso país não tem futuro.

  12. Triste episódio, colegas lesaram colegas.
    Os acusados eram colegas admirados por todos; um deles completará setenta anos esta semana. Não há o que dizer, apenas que o episódio envergonha a todos os juízes federais.

    1. A idade não isenta a culpabilidade, apesar das nossas leis permissivas e indulgentes.

      1. Acho que o meu texto não ficou claro: Informo que a referência à idade significa que todos se decepcionaram com o episódio. O referido juiz idoso e todos os demais acusados sempre foram admirados pelos colegas e advogados. Lamentável o episódio em todos os aspectos. Ele demonstra para todos que os homens são falíveis, por isso existem as leis e os meios de controle do sistema. O senhor está correto, de forma alguma, a idade isenta o agente de responsabilidade criminal.
        Em relação às leis permissivas, elas são permissivas para todos os brasileiros e não apenas na esfera criminal. att.

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