Velho coronelismo no aparato do Estado
Sob o título “Um Estado Pra Chamar de Seu – O que está por trás do PLC 25″, o artigo a seguir é de autoria de Márcia Semer, presidente da Associação dos Procuradores do Estado de São Paulo.(*)
Está na Assembleia Legislativa do Estado projeto de lei complementar (PLC 25) enviado pelo governador Geraldo Alckmin que, ao propor alterações na lei orgânica da Procuradoria Geral do Estado, promove escandaloso e perverso aparelhamento dessa instituição, que é o coração jurídico da administração pública estadual.
A Procuradoria do Estado é o órgão de advocacia da administração pública e, nos termos da Constituição de 88, constitui função essencial à Justiça, assim como o Ministério Público e a Defensoria Pública.
Seus membros ingressam no serviço público por concurso e têm a missão constitucional de representar o Estado em juízo e de prestar consultoria jurídica ao ente federado.
Ao conceber as procuradorias dos Estados como função essencial à Justiça (e também a Advocacia Geral da União), o legislador constituinte, além de dotar o Estado brasileiro de advogados públicos para defesa de seu patrimônio e interesses, deixou claro aos poderes constituídos e seus dirigentes que não lhes é permitida a contratação de advogados de sua confiança privada ou particular para a condução da coisa pública.
E por que o constituinte assim procedeu? Para assegurar que a defesa e a orientação jurídica dos atos e negócios do Estado tenham como primado o comprometimento maior, primeiro e fundamental com os valores inscritos na Constituição e não com interesses ou idiossincrasias de pessoas, grupos de pressão, agremiações, partidos ou coisa que o valha.
O projeto do Governador Alckmin, o PLC 25, no entanto, subverte essa lógica e submete os procuradores do Estado de São Paulo não à Constituição e às leis, mas a esses interesses ou idiossincrasias, atribuindo ao comando institucional comissionado dispor subjetiva e imotivadamente sobre a ocupação, permanência ou desocupação de cada um dos mais diversos postos de trabalho dentro da Procuradoria, em especial e estrategicamente na área das consultorias jurídicas, aquelas mesmas que devem analisar a legalidade das licitações, dos contratos, dos convênios, etc. Isso para não falar da área de cobrança judicial dos sonegadores.
Promove e implanta com isso uma subespécie perigosíssima do velho coronelismo, só que agora instalando-o nas entranhas do próprio aparato de Estado, sob o manto, vilipendiado e falsificado, da legalidade.
Constituindo a decisão pessoal do chefe da instituição como critério definidor do destino dos procuradores dentro da advocacia do Estado, o PLC 25 assaca contra os mais comezinhos princípios republicanos, transforma o Estado em propriedade particular dos comandos de plantão e cria ambiente dos mais propícios ao desmando, ao desmonte e à corrupção.
É monstruoso que proposição com esse conteúdo seja apresentada à sociedade paulista e que o governo de São Paulo ainda invista junto à Assembleia Legislativa para sua aprovação.
Mais monstruoso ainda é que se tenha a tranquilidade de encaminhá-la num tempo em que tantos foram e têm ido às ruas exatamente para protestar, entre outras coisas, contra a apropriação indevida do Estado por alguns poucos; quando o que se espera dos governantes é honestidade e compromisso público e quando o que se quer do Estado é eficiência. Talvez a aposta na dificuldade de compreensão da gravidade do ato explique, mas definitivamente não justifica a iniciativa.
Deformando e manietando instituições de Estado como a PGE/SP não acreditamos que será possível alcançarmos os sonhados e legítimos objetivos populares. Como tampouco concretizaremos os próprios comandos constitucionais.
O povo brasileiro não precisa de governantes que usem o Estado para chamar de seu; queremos apostar em homens e mulheres públicos que edifiquem um Estado que seja de todos e para todos.
É por isso que os Procuradores de São Paulo têm dito reiteradamente NÃO ao PLC 25/2013.
A Constituição reconheceu a necessidade de haver uma instituição voltada a garantir que as ações e as políticas públicas empreendidas pelo Estado permaneçam confinadas aos quadrantes estabelecidos pela ordem jurídica e desenvolvam-se segundo a constitucionalidade, a legalidade, a legitimidade e a licitude.
Mantida nos lindes constitucionais e legais, a atuação estatal logicamente se predispõe-se a realizar as esperanças sociais escritas em bela retórica no próprio texto constitucional.
As funções de cautela, promoção e defesa do interesse público constitucionalmente atribuídas com exclusividade à Advocacia Pública representam verdadeiro fator de contrabalanço dentro do Poder Executivo, porque nem sempre o desígnio político dos governantes encontra esteio jurídico.
O diálogo entre ministros, secretários e demais agentes políticos com competência decisória, de um lado, e advogados públicos, de outro, possui, assim, a inegável virtude de conduzir a uma clarificação e maior correção jurídica das decisões de governo, notadamente em sede de políticas públicas, mas desde que os membros da Advocacia Pública não estejam coarctados por mecanismos inibitórios de sua competência constitucional, que deve ser desempenhado com autonomia e estabilidade funcional.
A previsão da inamovibilidade atenuada, contida no Projeto de Lei Orgânica da PGE-SP (PLC nº 25, de 2013), afigura-se inconstitucional, por legitimar o Procurador Geral do Estado a empreender alterações arbitrárias na designação de Procuradores do Estado, notadamente no âmbito das consultorias jurídicas das Secretarias de Estado, colocando-os a serviço de políticas e governos de ocasião. Para se manterem “designados” em dada consultoria jurídica, os consultores jurídicos do Estado haverão de dobrar-se às vontades e às orientações políticas que lhes são inculcadas pelos detentores do poder político e transigir com projetos e políticas de governo que nem sempre encontrarão respaldo no ordenamento jurídico. Ou se curvam ou podem ser “sancionados” com a redesignação para outra consultoria, com as quais muitas vezes não têm afinidade nem habilidade, a fim de não “atrapalharem” o administrador.
É certo que a nós cabe viabilizar, na medida do juridicamente possível, as políticas públicas, apontando alternativas e não somente negativas. Mas não podemos ser ameaçados ou punidos por desempenhar o nosso ofício com independência técnica.
A ausência de critérios objetivos, tanto quanto a falta de motivação, enseja favoritismos e perseguições, e dá ensejo ao cometimento de ilegalidades e de irregularidades funcionais. Basta imaginar o deslocamento compulsório de advogado público que, exatamente por estar no exercício regular de sua função consultiva, venha a contrariar interesses individuais, políticos ou econômicos eventualmente afetos, por exemplo, ao governante. A que ou a quem serve o aniquilamento das garantias e prerrogativas dos Procuradores do Estado?
Prezado conselheiro, o seu longo texto se resume no trecho: “É certo que a nós cabe viabilizar, na medida do juridicamente possível, as políticas públicas, apontando alternativas e não somente negativas. Mas não podemos ser ameaçados ou punidos por desempenhar o nosso ofício com independência técnica.”
Resume-se neste trecho e se condena por ele, porque não há no texto do projeto nada que indique que haverá ameaças ou punições; o texto sequer permite ou facilita que estas haja. A verdade é que se pretende criar um clima difamatório, sob um silogismo capenga e baseado em premissa mentirosa: O atual PGE, Elival da Silva Ramos, apresentou o PLC; o PLC enseja ameaças e punições; logo, o PGE e o governo que ele compõe se dá a ameaças e punições.
A PGE sempre funcionou sob o sistema de “inamovibilidade mitigada” (vocês adoram um nome pomposo, hein?). Em que pese fofocas que eventualmente varrem a carreira – e dou de barato que são fofocas, porque nunca se desdobraram em o que quer que fosse – nada há de concreto a indicar perseguições, reprimendas ou represálias. O senhor se arrisca a dar aqui algum exemplo, com nome e atividade dos envolvidos?
A verdade é que a associação e o conselho, em sua gestão anterior, deram as costas à discussão. Ao que parece, deliberadamente, para agora cobrarem diálogo – diálogo que, insisto, rejeitaram. Tudo a fim de criar um factóide, que em nada contribui para o assim declarado engrandecimento da carreira e que está expondo, por meio das celeradas palavras da representante da associação, uma visão alucinada e escandalosa de todos nós, procuradores do Estado.
Alto lá!
Inaceitável que as manifestações contra o PLC 25/2013 se baseiem na premissa de que, sua aprovação permitirá que um PGE inescrupuloso (oriundo da carreira) monte uma Consultoria Jurídica inescrupulosa (com membros da carreira) para perpetrar fraudes contra o erário ….
Não foi ultrapassado a linha do plausível?!
Que imagem querem “colar” à nossa Carreira?! Não estamos construindo um caminho sem volta? Esse processo não é autofágico? Quem resgatará a nossa abalada imagem depois? Venhamos e convenhamos: há um intransponível limite ético a ser respeitado…. e que deve ser retomado.
Excelente o texto!
No futuro uma grande quantidade de operadores do direito apontarão minha carreira como desvirtuada e corrupta. Isto é, se vingarem os esforços irresponsáveis da Associação, concentrados numa campanha contra o PLC 25/2013 que, na verdade, mascara picuinhas e politicagenzinhas internas da carreira.
Saiba-se que a APESP é aparelhada por um grupelho de esquerdistas desocupados que pretendem golpear de morte o governo “burguês”, “fascista” e “reacionário” (acrescentem, a gosto, demais ofensas progressistas) do PSDB.
Coronelismo? Aparelhamento? Idiossincrasia? Ora essa!
Esquece-se a nobre presidente de esclarecer que os temas tratados PRATICAMENTE JÁ SÃO ASSIM ATUALMENTE. Não se está criando nada de novo. E acrescente-se: ATÉ A GESTÃO ANTERIOR, A PRÓPRIA PRESIDENTA OCUPAVA CARGO COMISSIONADO DE DIREÇÃO NO GABINETE DA PGE, QUE, COMO DITO, GERIA A CARREIRA DA FORMA COMO É E SEMPRE FOI.
É plenamente aceitável a divergência. É totalmente produtiva a crítica. É de se esperar a colaboração na construção da carreira. A Associação nada fez a este respeito. Pretende-se dona do consenso das idéias e quis impor a sua visão à Administração Pública, obviamente sem sucesso, o que lhe determinou uma torção radical no tratamento do tema.
A Associação, e sua presidenta, que tem assinado diversos textos a respeito, é irresponsável, tendenciosa e temerária em suas palavras.
O Projeto, ainda que se torne Lei, não denigre minha carreira. A atuação tresloucada de uma associação marcada pela irrelevância, sim, e como!
Olá! Caros Comentaristas! E, Fred! O ESTADO brasileiro nas três esferas está instrumentalizado para atender os interesses de apenas alguns, em detrimento de milhões de brasileiros. Mais uma razão para INSISTIR no “””VOTO FACULTATIVO”””. Entretanto, vou perdendo de 10X0. Os brasileiros/as precisam entender que: Só e, somente só: O VOTO FACULTATIVO como início para uma mudança pacífica e ordeira poderá ajudar como ponta pé inicial para promover MUDANÇAS tão desejadas pela POPULAÇÃO, nós brasileiros/as. A sensação atual que tenho do conjunto geral é PÉSSIMA como sinalização para o futuro. OPINIÃO!
Primeiro gostaria de saber se os procuradores de estado de SP também podem advogar como ocorre em vários estados .Acho isto um absurdo.Depois gostariabde saber se ganham honorários sucumbenciais e de que forma isto e realizado .
Os Procuradores do Estado de São Paulo não podem advogar e nem tem direito aos honorários que ganham perante a justiça. Parece-me que absurda é a proibição à advocacia e a vedação aos honorários, direito de todo advogado brasileiro. A única legítima vedação à advocacia é aquela que se dá contra seu próprio cliente.
Interessante que esse projeto não gere indignação igual ao outro similar que tramitou no Congresso… Será pq a “Imprensa isenta” não dá a mesma atenção, pois atingiria o “ninho de aves impolutas”?
Parabéns, Frederico Vasconcelos, por desnudar a questão e praticar um serviço real a população. Sou seu fã, inconteste.