O caráter pedagógico da decisão do CNJ

Frederico Vasconcelos

Ineficiência que permite desvios em tribunais deve ser responsabilizada.

Tem caráter pedagógico a decisão do Conselho Nacional de Justiça de afastar um presidente e dois ex-presidentes dos tribunais estaduais da Bahia e do Paraná, no espaço de um mês.

Segundo o conselheiro Rubens Curado, a medida introduz no Judiciário a cultura de que não há direito à má gestão. Presidir tribunal não é apenas cargo honorífico. A ineficiência que abre espaço para desvios e fraudes também deve ser responsabilizada.

A maioria do colegiado entendeu ser “socialmente inaceitável” a permanência na Corte do atual presidente do TJ-BA, Mario Hirs, e da ex-presidente Telma Britto, até o final das investigações.

O presidente do CNJ, ministro Joaquim Barbosa, disse que Hirs foi alertado previamente e não tomou nenhuma medida para impedir “interferências externas” no pagamento de precatórios inflados.

Em sua estreia no Conselho, a procuradora da República Luiza Frischeisen votou pelo afastamento, para garantir a preservação de provas e evitar que a presença desses desembargadores no tribunal atemorize servidores em futuros depoimentos.

Alguns votos vencidos atribuíram os precatórios milionários a “falhas estruturais no tribunal”. O argumento não convenceu.

A tese de que presidente de tribunal não tem competência para modificar decisões e cálculos de primeira instância foi contestada pela conselheira Ana Maria Brito. Ela citou despacho de Hirs, que indeferiu a impugnação de um precatório, determinou a retirada de documentos do processo e mandou renumerar as páginas. Os cálculos foram refeitos em menos de 24 horas, com valores “que causam espécie”, disse a conselheira.

Nos tribunais da Bahia e do Paraná, havia resistência a decisões determinadas ainda na época dos ex-corregedores Gilson Dipp e Eliana Calmon. Aparentemente, essa desobediência era estimulada por pedidos de vista e adiamentos nos julgamentos do CNJ.

Por cautela, o atual corregedor, ministro Francisco Falcão, aguardou a formação do novo colegiado para desengavetar casos antigos. Até ontem, havia o risco de pressões políticas e o temor de que o julgamento dos desembargadores baianos fosse embaraçado por pedido de vista.

Comentários

  1. Por favor, é muita maldade achar que esta decisão tem relaçao com a candidatura de Eliana Calmon ao senado pela Bahia. Um absurdo achar que aguardaram a proximidade de eleições para esta decisão liminar. Tudo tem limite…sem conspirações.

  2. Concordo com Rubens Curado quanto ao caráter educativo da medida. Assumir a presidência de um Tribunal não é obrigatório. Quem o faz deve responsabilizar-se pela administração ainda que isento de má-fé, salvo questões excludentes (observação que coloco).
    A história que se conta, porém, revela um paradoxo. Choca a naturalidade com que se diz: 1.) uma aparente protelação dos feitos por composições anteriores do CNJ; 2.) o Corregedor aguarda nova formação para só então desengavetar esses casos.
    Pergunto: 1.) doravante seria correto o Relator de determinado feito, mesmo em outras esferas da Justiça, aguardar nova composição da Turma (supostamente mais favorável ao pensamento dele) para só então mandar seu voto à sessão de julgamento? 2.) agindo assim, há insenção para conduzir e decidir o processo? 3.) não há violência ao princípio do juiz natural? 4.) o destino dos litigantes não estaria submetido ao que pensa o julgador (o indivíduo) do dia (e conforme o dia) sobre o que dizem leis, Constituição e o próprio direito? 5.) vale lançar mão de todos os meios para que se justifique o fim pretendido? E qual fim? E de acordo com quem? 6.) atos dessa natureza não teriam os mesmos vícios daqueles que se pretende condenar? 7.) a atitude é legal? É moral? É honesta? Não se estaria deslegitimando um tribunal criado justamente para coibir essas situações? 8.) sendo legítima e correta a atitude, não caberia a investigação e eventual procedimento quanto aos membros anteriores do tribunal ou turma, inclusive na mesma linha de raciocínio que aqui se prega? 9.) a ser verdade esse relato, não teríamos em tese, ato de prevaricação no primeiro ou então no segundo caso? 10.) desprezar tudo isso, seria enfim, educativo?

    1. Sérgio
      A resposta a tudo isso será dada pelo STF, quando dos recursos dos prejudicados. Aí veremos se o STF aprova isso. Mas compartilho de suas dúvidas.

    2. Embora alguns fiquemos chocados, Sérgio, a naturalidade dessa conduta é estimulada por ficar bem diante da opinião pública (e publicada), a quem aqueles que se preocupam com suas indagações sempre parecerão interessados na continuidade dos desmandos de forma corporativa. Diante desse maniqueísmo, somado aos holofotes que iluminam alguns (ou serão muitos?) vaidosos, a caça continua… Parabéns por suas colocações.

    3. Olá! Caros Comentaristas! E, Fred! Olá! Sérgio, como vai., ótimas questões. Olá! Paulo, como vai., ótima argumentação. Olá! José Tadeu Picolo Zanoni, como vai., é isso mesmo. Aguardemos o que dirá o STF. O cnj não me encanta. Por sinal, me desencanta! Que o STF diga, sobre. OPINIÃO!

  3. Fica claro que a presença de membros oriundos da magistratura na Conselho, quando integrantes ou ex-integrantes de Diretorias de associações classistas, tem o único propósito de buscar postergar indefinidamente qualquer decisão do Conselho que leve, no mínimo, ao afastamento de suspeitos, das instituições a que pertencem. É notório o fato e a própria decisão de aguardar o novo colegiado corrobora esta constatação. É o habitual modus operandi, que espero tenha sido eliminado, que ocorreu em quase todas as investigações envolvendo juízes ou desembargadores, nas Corregedorias dos TJs e TRFs, nos últimos vinte anos. Mais que tudo, a decisão do CNJ parece ser um claro recado de que esta era de tergiversação e leniência pode estar chegando ao fim no Judiciário brasileiro. Mas conhecendo a persistência dos maus costumes na história brasileira, acredito ser preciso aguardar para ver.

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