Crime eleitoral: MPF pede revisão de resolução
Rodrigo Janot vai propor ação ao Supremo se pedido de revisão não for atendido.
O procurador-geral da República, Rodrigo Janot, pediu a revisão da Resolução 23.3896/2013 do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), que trata dos crimes eleitorais nas eleições de 2014, por considerar que a norma estabelece limites para a instauração do inquérito policial pelo Ministério Público. Caso o pedido não seja atendido, ele vai propor ao Supremo Tribunal Federal (STF) ação direta de inconstitucionalidade (Adin) para questionar a referida resolução. A minuta já foi elaborada.
Nesta terça-feira (14/1), o Grupo Executivo da Função Eleitoral do Ministério Público Federal (MPF) também se manifestou contra a resolução por meio de abaixo-assinado.
Uma moção assinada por todos os membros do grupo pede alteração de parte da Resolução por considerar que a restrição ofende diretamente a Constituição Federal, que estabelece como função institucional do Ministério Público “requisitar diligências investigatórias e a instauração de inquérito policial” (art. 129, inciso VIII).
A moção cita ainda outros diplomas legislativos que vão em sentido contrário à resolução.
Veja a íntegra do documento.
MOÇÃO PELA ALTERAÇÃO DA RESOLUÇÃO TSE 23.396/2013
Os Procuradores Regionais Eleitorais e os membros do Grupo Executivo Nacional da Função Eleitoral do Ministério Público Federal abaixo-assinados, por meio dessa nota, manifestam-se a favor da alteração de parte da Resolução 23.3896/2013, adotada recentemente pelo Tribunal Superior Eleitoral na última sessão de 2013 para regular as ações criminais eleitorais nas Eleições de 2014, por motivos que seguem abaixo.
O Tribunal Superior Eleitoral, ao aprovar a referida resolução, restringiu somente à Justiça Eleitoral o poder de determinar a instauração do inquérito policial para apuração de crimes eleitorais, salvo para casos de prisão em flagrante. Com isso, excluiu a possibilidade de que o Ministério Público possa requisitar diretamente à autoridade policial a instauração do inquérito, como vinha sendo feito até então e como é a prática para crimes comuns (não eleitorais).
A norma inova e contraria as resoluções do próprio Tribunal Superior Eleitoral relativas à apuração de crimes eleitorais de anos anteriores. Nas eleições de 2006, 2010 e 2012 (Resoluções 22.367, 23.222 e 23.363, respectivamente), as normas da Corte Eleitoral eram claras ao estabelecer que o inquérito policial eleitoral poderia ser instaurado tanto por requisição do Ministério Público quanto da Justiça Eleitoral. A nova redação não constava nem mesmo na minuta inicial da resolução de 2013, tendo sido introduzida somente após audiência pública sobre o tema. Nenhuma lei eleitoral foi aprovada em 2013 que pudesse justificar tal inovação.
Essa restrição ofende diretamente a Constituição Federal, que estabelece como função institucional do Ministério Público “requisitar diligências investigatórias e a instauração de inquérito policial” (art. 129, inciso VIII). O que a Constituição determina não pode ser restringido por meio de resolução.
Outros diplomas legislativos também vão em sentido contrário à resolução. O Código de Processo Penal afirma ser atribuição do Ministério Público a requisição de instauração de inquérito policial para apuração de crimes de ação penal pública (artigo 5º, inciso II). O Código Eleitoral dispõe que, recebida notícia de crime eleitoral, caso o Ministério Público julgue necessários maiores esclarecimentos e documentos complementares ou outros elementos de convicção, pode requisitá-los diretamente de quaisquer autoridades ou funcionários que possam fornecê-los.
Tais disposições legais são, como se nota, expressão dos poderes investigatórios do Ministério Público, reafirmados pela rejeição da PEC 37. Negar a um órgão que pode, ele mesmo, investigar, a possibilidade de requerer instauração de inquérito policial (ou seja, de requerer que a polícia investigue) é um contrassenso.
A inovação trazida pela Resolução TSE 23.396 seria uma forma de conferir transparência às investigações sobre crimes eleitorais. Não existem, no entanto, inquéritos policiais eleitorais secretos. Todos os inquéritos policiais requisitados pelo Ministério Público Eleitoral são cadastrados no Judiciário e são, como todos os inquéritos policiais no Brasil, registrados no setor policial competente.
Trata-se de remédio para um mal inexistente, com efeitos colaterais danosos. Em primeiro lugar, submeter a mera instauração do inquérito ao aval da Justiça é macular, de maneira irremediável, a imparcialidade do juiz. O inquérito policial é destinado à formação da convicção do Ministério Público, e não do Magistrado.
Vale lembrar entendimento do Ministro Celso de Mello, para quem “o inquérito policial, que constitui instrumento de investigação penal, qualifica-se como procedimento administrativo destinado a subsidiar a atuação persecutória do Ministério Público, que é – enquanto dominus litis – o verdadeiro destinatário das diligências executadas pela Polícia Judiciária” (STF, H.C 73.271/SP, Relator Celso de Mello).
A atribuição exclusiva de determinar a instauração de inquéritos policiais à Justiça Eleitoral aproxima a função judicial da função acusatória, ao implicar uma avaliação prévia do juiz sobre o caso que analisa, indagando se há ou não necessidade de maiores investigações para que o Ministério Público Eleitoral possa ingressar com uma denúncia criminal. Um juiz hipotético que entende por bem determinar a instauração de inquérito policial estará suspeito para julgar o habeas corpus que defenda a desnecessidade da investigação, por exemplo, por ser o fato atípico. A função judicial na investigação criminal não é a de ajudar a formar a convicção do acusador determinando a instauração de inquérito policial, sim, a de zelar pelas liberdades individuais, função que resta ameaçada pela necessidade de aval judicial para a instauração do inquérito.
Em segundo lugar, eliminar um poder constitucional do Ministério Público, expresso literalmente no art. 129, VIII da Constituição, era insegurança jurídica e pode ocasionar recursos tanto das vítimas – interessadas na investigação – quanto dos infratores, gerando mais recursos no sistema de justiça.
Em terceiro lugar, restringir a instauração de inquérito à determinação da Justiça é uma clara ofensa à igualdade de todos perante o sistema de justiça: crimes não eleitorais sujeitos a ações penais públicas continuam a ser apurados mediante requisição de instauração de inquérito pelo Ministério Público.
Por fim, a limitação criada prejudica a agilidade que deve pautar todas as apurações, mas especialmente a investigação dos crimes eleitorais, que demanda atuação célere sob pena de perecimento dos elementos de prova, o que se torna mais provável quanto mais distante o período eleitoral.
A criação de uma “etapa de autorização” não prevista pela Constituição e pelas leis, sem nenhum ganho, conspira contra a desburocratização que pauta a investigação contemporânea, que deve ser voltada a apuração de fatos e destinada ao convencimento do Acusador. Novamente, cabe ao Judiciário zelar pelas liberdades e autorizar – ou não – as medidas de efetiva restrição de direitos fundamentais como a determinação da prisão ou mesmo interceptação telefônica e, para isso, deve ter tempo e imparcialidade.
Nas Eleições de 2014, além de todas as imensas tarefas dadas pela legislação à Justiça Eleitoral, como o deferimento do registro das candidaturas, o julgamento das ações de impugnação, o acompanhamento do alistamento dos eleitores e a organização mesma do procedimento de coleta do voto, os juízes terão que lidar com matéria que não lhes compete e se imiscuir em atividade que tem sido exercida a contento pelos órgãos do Ministério Público Eleitoral. Essa medida, além de outros graves defeitos, em nada contribuirá para a celeridade processual, prevista como garantia do cidadão.
Criar embaraços para o MP é dificultar a apuração de graves ilícitos eleitorais, como a compra de votos, as fraudes no alistamento eleitoral e na coleta dos votos e o uso da máquina administrativa em prol de candidatos. É em nome do eleitor que o Ministério Público Eleitoral atua. É dele, o eleitor, o maior interesse em eleições limpas e transparentes. A Resolução do TSE fecha, desnecessariamente, uma porta que até hoje se encontra aberta para o cidadão votante.
À guisa de conclusão, o Direito Eleitoral Criminal hoje padece de vários problemas gravíssimos, como a falta de recursos humanos e materiais do corpo policial federal, a obsolescência dos crimes previstos no Código Eleitoral (de 1965!) incapaz de tipificar adequadamente a sofisticação do “Caixa 2” e da corrupção eleitoral da atualidade, a dependência quase que absoluta da prova testemunhal na falta de outras formas de inteligência eleitoral, a prescrição rápidas de tais delitos, entre outros. Oxalá a questão da instauração de inquérito policial eleitoral não se some a tais problemas.
Por tais razões, os Procuradores Regionais Eleitorais (membros do Ministério Público Federal) e os membros do Grupo Executivo Nacional da Função Eleitoral do Ministério Público Federal abaixo-assinados entendem ser necessária a alteração da Resolução TSE n.º 23.396/2013, para que se cumpra a Constituição Federal (art. 129, VIII) e se restabeleça de forma clara a possibilidade de instauração de inquérito policial por requisição do Ministério Público.
André de Carvalho Ramos, Procurador Regional Eleitoral e Coordenador Nacional do Grupo Executivo Nacional da Função Eleitoral do Ministério Público Federal (GENAFE)
Ageu Florêncio da Cunha, Procurador Regional Eleitoral e Coordenador Regional do GENAFE
Ana Paula Mantovani, Procuradora da República e Coordenadora Regional do GENAFE
Fábio Bento Alves, Procurador Regional Eleitoral e Coordenador Regional do GENAFE
João Bosco Araújo Fontes Junior, Procurador Regional Eleitoral e Coordenador Regional do GENAFE
Lívia Nascimento Tinôco, Procuradora da República e Coordenadora Regional do GENAFE
Mauricio da Rocha Ribeiro, Procurador Regional Eleitoral e Coordenador Regional do GENAFE
Rodrigo Antonio Tenório Correia da Silva, Procurador da República e Coordenador Regional do GENAFE
Com um bom discernimento, vê-se que os partidos políticos brasileiros, já se igualam às facções criminosos, com o diferencial que atuam dentro da legalidade!
Parabens para o poder judiciário pela iniciativa, esta colocando as coisas nos devidos lugares.
Ninguem esta proibindo ninguem de fazer, simplesmente exige-se que se requera e comunique ao judiciário sobre determinado crime eleitoral.
Num pleito eleitoral onde partidos disputam, ha de imaginar que fatos podem alterar a dinamica e mudar as posições nesta corrida.
Agora imaginamos numa vespera eleição a midia publique que foi instaurado inquerito, procedimento, investigação ou qualquer outro nome. A pessoa envolvida não tera tempo de defender-se para o eleitorado.
Porque no final quem vai julgar e o mesmo juiz eleitoral que recebera o requerimento.