Presídios e “pacto de mediocridade”
Para associação de juízes do Maranhão, “é inaceitável atribuir ao Judiciário a caótica situação prisional”.
Sob o título “Caos no sistema prisional: Afinal, de quem é a culpa”, o artigo abaixo é de autoria do juiz Gervásio Santos, presidente da Associação dos Magistrados do Maranhão – AMMA e Coordenador da Justiça Estadual da Associação dos Magistrados Brasileiros – AMB.
Diz o velho ditado português: “amarra-se o burro à vontade do dono”. Significa que o melhor meio de convencer alguém de que está errado é deixá-lo seguir seu caminho cometendo os mesmos erros. Só que um dia os resultados desses erros serão cobrados, resta saber na conta de quem será debitada a fatura.
É mais ou menos isso que acontece hoje no sistema prisional do Maranhão, cujo caos instalado vem sendo amplamente noticiado em rede nacional e internacional. Tal cenário é fruto de um comportamento apático e visão distorcida sobre a forma de gerenciar o Complexo Penitenciário de Pedrinhas, o que gerou certa acomodação não apenas por parte dos governantes que ocuparam a principal cadeira do Palácio dos Leões, como, também, de todos aqueles que tinham o dever de cobrar dos Poderes constituídos que estes fizessem a sua parte.
É como se durante anos os protagonistas dessa história estivessem preocupados apenas em manter os seus “criminosos” enjaulados em cárceres, contentando-se com a falsa sensação de segurança. Só que, agora, estes deixam as “masmorras”, muito mais ferozes e violentos, para assombrar a sociedade e tirar o sono daqueles que têm a responsabilidade de resguardar-lhes a integridade física.
O que posso afirmar, com total convicção, é que deste infeliz e malfadado pacto de mediocridade que afundou o sistema prisional maranhense o Poder Judiciário nunca corroborou. Muito pelo contrário. Representada pela Associação dos Magistrados do Maranhão, ao longo dos anos a Magistratura tem sido incansável nas denúncias sobre as péssimas condições estruturais e a superlotação no Complexo Penitenciário de Pedrinhas.
O Judiciário se manteve alerta, sendo exigente no cumprimento do que prevê a Lei de Execução Penal para a efetiva ressocialização daqueles que cumprem pena em seus presídios.
De 2007 a 2013, a Associação dos Magistrados protocolou inúmeros requerimentos junto aos órgãos de Segurança Pública cobrando condições estruturais adequadas, denunciando a superlotação e exigindo a construção de presídios no interior do estado. A regionalização do cumprimento da pena foi apontada, no decorrer dos anos, pelos juízes das Varas de Execuções Penais, como uma das saídas eficazes para a efetiva ressocialização.
Então, por que agora a governadora do Maranhão, Roseana Sarney, vem atribuir ao Judiciário a responsabilidade da caótica situação prisional? Ao afirmar que a superlotação no Complexo de Pedrinhas é decorrente do grande número de presos provisórios, a governadora tenta retirar dos seus próprios ombros o peso da responsabilidade, jogando a culpa sobre os ombros dos juízes. E isso é inaceitável.
Para cada falácia dita há números que provam o contrário e fazem com que o dedo seja tocado diretamente na ferida do verdadeiro responsável pelo caos instalado: o Executivo.
Basta ver que o Maranhão tem um total de 5.384 presos, o que corresponde apenas 1% da massa carcerária do País, portanto, o caos do sistema penitenciário não é decorrente da lentidão da Justiça.
Também não é correto o discurso de que “a polícia prende e a justiça solta”, pois de acordo com o Banco Nacional de Mandados de Prisão, mantido pelo CNJ, há 5.539 mandados de prisão expedidos pela justiça maranhense aguardando cumprimento, o que demonstra que a nossa Polícia é que prende pouco, até porque, no Maranhão, há a menor proporção policial por habitantes.
Outro ponto que merece ser destacado é que o déficit atual entre o número de presos e de vagas no sistema prisional é superior a dois mil, mas esse número alcançaria facilmente a casa dos oito mil se todos os mandados de prisão fossem cumpridos. E aí eu pergunto: haveria espaço para este contingente de presos?
Contra fatos, não há argumentos. Está mais do que claro que o problema do sistema prisional maranhense é a ausência de gestão técnica ao longo dos anos, o que fez com que o Estado perdesse o controle sobre a administração dos presídios.
Quando o sistema penitenciário é mal gerido propicia-se a criação de facções criminosas e isso tem repercussão nas ruas. É erro pensar que apenas encaminhar o preso para o sistema penitenciário é suficiente para garantir segurança à sociedade. É necessário que nas penitenciárias existam políticas adequadas, e o primeiro passo para a adoção dessas políticas é evitar a superlotação, assegurando condições de promover a ressocialização do preso.
Agora, se nada disso for feito, o sistema prisional continuará em estado caótico e a fatura permanecerá pendurada na parede aguardando quem pague a conta.