Mordaça na OAB de Pernambuco

Frederico Vasconcelos

José Paulo na CNVSob o título “Afasta de mim esse cale-se”, o artigo a seguir é de autoria do advogado José Cavalcanti Filho, formado pela Faculdade de Direito do Recife, membro da Comissão Nacional da Verdade e da Academia Pernambucana de Letras.

A pedido do Blog, ele avalia a resolução da OAB-PE, que limita as entrevistas de advogados à imprensa. “Agora temos em Pernambuco uma nova Lei da Mordaça”, diz.  “Difícil defender um mostrengo desses.”

 

Trata-se de mais uma herança portuguesa. No fundo é só isso. Reminiscência dos tempos da colonização, em que a tutela sobre o cidadão era absoluta. E que perdura mesmo hoje, espalhada pelas instituições. Ai de ti, Brasil. Fico em só um exemplo. No mundo todo,  educar os filhos é responsabilidade básica das famílias. Cabendo, ao Estado, função apenas supletiva. Em qualquer país civilizado, filho entra com os pais em qualquer cinema. Se estiver sozinho é que o porteiro pede sua carteira de estudante. Aqui não. Se o coitado tiver 17 anos, e mesmo estando com pai ou mãe, não entra em filme de 18. Ainda que eles, conhecendo o filho, atestem já ter maturidade para poder estar ali. Não entra e pronto. Ai de ti, Brasil.

Os exemplos são incontáveis. E estão por toda parte. Inclusive no Bolsa-Família. Ou na OAB, sem muitas surpresas, neste caso se diga, depois que o Conselho Federal apresentou pomposamente, ao país, um modelo de reforma política desastrosa. Desalentadora. Maravilha curativa para todos os males da má-política hoje instalada em Brasília. E com que cara se apresentam seus autores nas televisões!, senhores meus. Com que cara.

Achando pouco, agora temos em Pernambuco uma nova Lei da Mordaça. Feita, provavelmente, com os melhores propósitos. Problema é que nem sempre intenção e gesto andam juntos. E essa Resolução 08/2013 é, para resumir, ruim. Apenas isso. Muito ruim. E Nefelibata, que se vê de algumas regras – como a regulação do cartão de visita contendo o número de inscrição na OAB. Sem que se perceba como algum advogado possa enricar fazendo propaganda em cartão de visita.

Para não ir mais longe, apenas fico no exame (breve) de uma regra dessa Resolução, a do art. 7º – que diz ser vedado, ao advogado, “analisar casos concretos em questões onde não esteja envolvido ou atuando como advogado constituído, como assessor jurídico ou parecerista”. O que põe em varas quase todos os advogados no Brasil. Basta ver o Ação Penal 470 (Mensalão). Em que (quase) nenhum de nós é advogado. Nesse caso, e valendo a Resolução,  fica proibido falar sobre isso. Era só o que faltava. Não se pode falar de corrupção, porque seria propaganda. O país pegando fogo, com membros ilustres das elites indo para a cadeia, e os advogados calados pela OAB. Todos podem falar. De todos as profissões. Médicos, arquitetos ou pedreiros. Menos advogados. Só mesmo rindo. A menos que seja dirigente da OAB (art. 2º, III, § 4º), claro – que, neste caso, não serão sujeitos a essas restrições.

Difícil defender um mostrengo desses. Muito difícil. Pena só que tenha se dado em Pernambuco – que tem, como Presidente, um advogado honrado. Represente legítimo de nossas melhores tradições jurídicas. Como dizia Chesterton, “O mais terrível do erro é que ele tem heróis sinceros”. Lembro mestre Eduardo Spínola, ilustre ex-ministro do Supremo, que dizia sempre: “Quando se vai demasiado longe, o progresso consiste em regredir”. Com toda razão. Que nem sempre voltar atrás é prova de fraqueza. Ao contrário, é também prova de sabedoria. E de grandeza. Ainda é tempo, amigos meus. Ainda é tempo.