Direitos das vítimas e indiferença dos outros
Sob o título “Apontamentos sobre direitos das vítimas no Brasil”, o texto a seguir é de autoria do juiz e poeta gaúcho Jorge Adelar Finatto. Foi publicado originalmente em seu blog “O Fazedor de Auroras”. (*)
A vítima, no Brasil, é aquela pessoa a quem coisas ruins acontecem ou por culpa dela ou por força do destino, ao contrário dos que ainda não caíram e que se julgam protegidos no interior de uma cápsula indevassável.
A vítima tem direito de saber que dificilmente será tratada como merece pelo Estado e pela sociedade, porque há poucos recursos disponíveis para dar-lhe a necessária atenção. O tempo é curto e a vida continua. No caso, a vida dos outros.
A vítima tem direito de ficar só com seu sofrimento.
A vítima tem o inalienável direito de respeitar, até o fim de seus dias, os direitos humanos de seu carrasco.
A vítima tem direito de ser informada que os presídios estão superlotados, não há mais vagas para quem comete crimes.
A vítima, real ou potencial, tem direito de viver aprisionada dentro de si e de sua casa, enquanto os criminosos andam soltos, sabendo que, agora ou num futuro próximo, farão outras vítimas.
A vítima tem direito de entender que aquilo que levou uma vida inteira para construir pode ser destruído em poucos segundos por alguém que não está nem aí para ela e sua família.
A vítima tem todo o direito de fazer um resumo do que lhe aconteceu, desde que evite detalhes desagradáveis e, principalmente, controle sua emoção, porque as pessoas em geral, e autoridades em particular, têm um milhão de coisas para fazer e se chateiam com relatos emocionais. Às vezes, prefere-se acreditar que os fatos não aconteceram bem assim, ou são peças de ficção.
A vítima tem o indiscutível direito de carregar na alma o insuportável sentimento de invasão, impotência, fragilidade e tristeza pelo que passou.
A vítima tem direito de levar sozinha seu trauma pelo resto da vida, com poucos, raros seres humanos para dividir a angústia da violação sofrida.
A vítima tem também o direito de permanecer em silêncio para não importunar a indiferença dos outros.
A vítima tem direito de ouvir que seu caso não é o único e que, por isso, deve ter muita paciência. Dramas como o seu acontecem todos os dias. Seria até melhor poupar-se de falar contra a ineficiência dos públicos poderes.
A vítima tem o irrestrito direito de saber que o principal direito humano que lhe assiste é o recato na dor.
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http://ofazedordeauroras.blogspot.com.br/