Trabalho externo no regime semiaberto

Frederico Vasconcelos

Barbosa, Janot e JucaO procurador-geral da República, Rodrigo Janot, entende que a concessão de trabalho externo para presos em regime semiaberto, com pena inferior a oito anos, não precisa do cumprimento de um sexto da pena.

Em abril, Janot já havia se manifestado a favor da autorização para o ex-ministro José Dirceu deixar o presídio durante o dia para trabalhar em um escritório de advocacia.

No dia 27 de novembro de 2013, quando o assunto ainda não havia sido abordado pela imprensa, o Blog recebeu, em caráter reservado, o seguinte comentário de um juiz:

“Estou vendo toda essa movimentação da execução das penas dos mensaleiros em regime semiaberto. Ninguém falou nada, porém, que para que o preso em regime semiaberto possa trabalhar fora da cadeia tem que ter antes cumprido pelo menos um sexto da pena (art. 123, II, da Lei  7.210/1984)”.

O Blog consultou o advogado de Dirceu, José Luis Oliveira Lima, preservando o nome do magistrado que levantara a questão.

A seguir, a resposta do defensor, que reuniu jurisprudência colecionada pelo sócio, o também criminalista Rodrigo Dall’Acqua. Oliveira Lima informou que no dia seguinte encaminharia petição a respeito da questão ao relator da ação penal do mensalão, ministro Joaquim Barbosa.

 

 

Sobre o tema, a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça consolidou entendimento no sentido de que é desnecessário o cumprimento de um sexto da pena, no mínimo, para a concessão do benefício do trabalho externo ao condenado a cumprir a reprimenda no regime semiaberto, desde que satisfeitos os demais requisitos necessários, de natureza subjetiva, mesmo quando se tratar de regime inicial.

Confira-se, a propósito, o seguinte trecho do voto do eminente Ministro Gilson Dipp, acolhido pela Quinta Turma por unanimidade, por ocasião do julgamento do HC n.° 19.156⁄RS, in verbis:

“[…] Na presente impetração, sustenta-se que o paciente teria direito ao trabalho externo, além de que estaria preso em regime fechado.

Merece prosperar a irresignação.

Já firmei posição no sentido de admitir o trabalho externo aos condenados ao regime semi-aberto, independentemente do cumprimento de 1⁄6 da pena – ainda mais quando constatadas condições pessoais favoráveis do agente.

Incide, na hipótese, a lógica do critério da razoabilidade, que se faz necessário na adaptação das normas de execução à realidade social e à sua própria finalidade, ajustando-as ao fato concreto – daí porque o caráter programático de certas normas constantes da Lei de Execução, ao qual se deve atentar sempre.

A individualização da solução, portanto, não pode ser tida como ilegal, em atenção ao propósito final da sistemática penal.

Nesse sentido, Júlio Fabbrini Mirabete, in Comentários à Lei n.º 7.210⁄84, 6.ª Edição, São Paulo, Atlas, 1996, págs. 107⁄108:

‘O trabalho externo é uma atenuação gradativa inserida no regime de execução da pena em estabelecimento fechado, determinando-se ainda que se exija do condenado o cumprimento de pelo menos um sexto da pena’; […] ‘Embora na jurisprudência, se tem exigido que, iniciando o condenado o cumprimento da pena em regime semi-aberto, há necessidade também que tenha cumprido um sexto da pena, existe orientação diversa fundada na inexistência de regra expressa a respeito do tempo de cumprimento de pena no regime semi-aberto, deixando a concessão ao prudente critério da oportunidade e conveniência do juiz da execução […].'”

No mesmo sentido:

“HABEAS CORPUS. EXECUÇÃO PENAL. REGIME INICIAL SEMIABERTO. BENEFÍCIO DO TRABALHO EXTERNO. DIREITO DO CONDENADO INDEPENDENTEMENTE DO CUMPRIMENTO DE PERCENTUAL DA PENA, DESDE QUE PRESENTES CONDIÇÕES PESSOAIS FAVORÁVEIS, AINDA NÃO APRECIADAS PELO JUÍZO DAS EXECUÇÕES PENAIS. CONCESSÃO DO BENEFÍCIO. DESCABIMENTO. ORDEM PARCIALMENTE CONCEDIDA.

1. Admite-se a concessão do trabalho externo desde o início ao condenado em regime semiaberto, desde que verificadas condições pessoais favoráveis no caso concreto pelo Juízo das Execuções Penais. Precedentes do Superior Tribunal de Justiça.

2. Ordem parcialmente concedida para, afastada a necessidade de cumprimento de percentual mínimo da pena no regime intermediário, determinar ao Juízo das Execuções Penais que prossiga na análise dos requisitos subjetivos necessários para a concessão do benefício do trabalho externo ao ora Paciente.” (HC 133.350⁄RS, 5.ª Turma, Rel. Min. LAURITA VAZ, DJe de 12⁄04⁄2010.)

“HABEAS CORPUS. TRABALHO EXTERNO. REGIME PRISIONAL SEMIABERTO. EXIGÊNCIA DO CUMPRIMENTO DE 1⁄6 (UM SEXTO) DA REPRIMENDA. REQUISITO DESNECESSÁRIO. ASPECTO SUBJETIVO. AUSÊNCIA DE MANIFESTAÇÃO PELO TRIBUNAL A QUO. SUPRESSÃO DE INSTÂNCIA.

1. A jurisprudência desta Corte consolidou o entendimento de que independentemente do cumprimento do lapso de 1⁄6 (um sexto), presentes as condições pessoais favoráveis, deve ser concedido, ao condenado em regime semiaberto, a autorização para o trabalho externo.

2. Não tendo as instâncias ordinárias se manifestado sobre o preenchimento do requisito subjetivo, não há como este Sodalício decidir sobre a concessão do benefício, sob pena de incorrer supressão de instância.

3. Ordem concedida em parte tão-somente para afastar o óbice referente a exigência do cumprimento de 1⁄6 (um sexto) da reprimenda no modo semiaberto para a concessão do trabalho externo, devendo os demais requisitos serem analisados pelo Juízo das Execuções Criminais. (HC 118.678⁄RS, 5.ª Turma, Rel. Min. JORGE MUSSI, DJe de 03⁄08⁄2009.)

“HABEAS CORPUS. PROCESSO PENAL. AGRAVO EM EXECUÇÃO. TRABALHO EXTERNO. CONDENADO EM REGIME INICIAL SEMI-ABERTO. CUMPRIMENTO DE 1⁄6 DA PENA. DESNECESSIDADE. PRECEDENTES.

1. Este Superior Tribunal de Justiça tem firme jurisprudência no sentido da ilegalidade de se exigir o cumprimento de 1⁄6 da pena em regime inicial semi-aberto para lhe permitir o trabalho externo.

Ressalvado o ponto de vista da Relatora.

2. Ordem concedida para, restabelecendo a decisão de 1ª instância, permitir ao paciente o trabalho externo, desde que aferida pelo Juízo das Execuções a manutenção dos demais requisitos para a concessão do benefício, sendo prescindível o cumprimento de 1⁄6 da pena.” (HC 78.557⁄RS, 6.ª Turma, Rel. Min. MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA, DJ de 26⁄11⁄2007.)

JULGADOS DO TJ/DF:

RECURSO DE AGRAVO EM EXECUÇÃO. AUTORIZAÇÃO DE TRABALHO EXTERNO EM EMPRESA DA FAMÍLIA DO APENADO. INEXISTÊNCIA DE VEDAÇÃO LEGAL. PREENCHIMENTO DOS REQUISITOS OBJETIVOS E SUBJETIVOS. CASSAÇÃO DO BENEFÍCIO. INVIABILIDADE.

Conforme entendimento jurisprudencial sufragado no âmbito desta eg. 2ª Turma, a execução criminal tem por objetivo a reeducação e ressocialização do condenado, com o fim de reinseri-lo no convívio social, sendo o trabalho essencial para esse processo, desde que atendidos aos requisitos (objetivos e subjetivos) constantes do art. 37 da LEP.

A jurisprudência do STJ passou a entender que o requisito objetivo de cumprimento de 1/6 (um sexto) da pena não é aplicável ao preso em regime semiaberto, que tenha proposta de emprego particular.

Desse modo, uma vez preenchidos pelo apenado em regime semiaberto os requisitos subjetivos do art. 37 da LEP (aptidão, disciplina e responsabilidade), o simples fato de a empresa pertencer a seu familiar não constitui óbice para a concessão do trabalho externo, até porque inexiste vedação legal nesse sentido.

Recurso conhecido e não provido.

(Acórdão n.608823, 20120020147714RAG, Relator: SOUZA E AVILA, 2ª Turma Criminal, Data de Julgamento: 02/08/2012, Publicado no DJE: 13/08/2012. Pág.: 185)

RECURSO DE AGRAVO. EXECUÇÃO PENAL. CONDENAÇÃO POR CRIME DE ROUBO. MINISTÉRIO PÚBLICO. INDEFERIMENTO DE TRABALHO EXTERNO EM EMPRESA DA FAMÍLIA DO SENTENCIADO. INVIABILIDADE. PREENCHIMENTO DOS REQUISITOS LEGAIS. RECURSO CONHECIDO E NÃO PROVIDO.

1. Conforme entendimento jurisprudencial, o requisito do cumprimento de 1/6 (um sexto) da pena não é aplicável ao preso em regime semiaberto, que tem proposta de emprego particular.

2. A execução criminal visa o retorno do condenado ao convício social, com o escopo de reeducá-lo e ressocializá-lo, sendo o trabalho essencial para esse processo. Se o sentenciado atende aos requisitos subjetivos, o fato de a empresa pertencer ao seu filho não constitui óbice à concessão do trabalho externo, sob o argumento de fragilidade na fiscalização, até porque inexiste vedação na Lei de Execução Penal.

3. Recurso conhecido e não provido para manter a autorização do benefício do trabalho externo ao sentenciado.

(Acórdão n.575473, 20120020029069RAG, Relator: ROBERVAL CASEMIRO BELINATI, 2ª Turma Criminal, Data de Julgamento: 22/03/2012, Publicado no DJE: 30/03/2012. Pág.: 198)