Barroso propõe modelo para eliminar o atraso e os gargalos do Judiciário
Ministro sugere uma onda de desjudicialização, redução do foro privilegiado e do uso abusivo de recursos
Na abertura da XXII Conferência Nacional dos Advogados, nesta segunda-feira (20) no Rio de Janeiro, o ministro Luís Roberto Barroso, do Supremo Tribunal Federal, apresentou três propostas para superar o atraso e os gargalos do Judiciário:
1) Redução drástica do foro por prerrogativa de função; 2) Equacionamento do problema do excesso de litigiosidade e da demora processual e 3) Redefinição do papel Supremo Tribunal Federal.
“O foro por prerrogativa de função, também apelidado como foro priviliegiado, constitui uma reminiscência aristocrática, sem réplica comparável em outras democracias”, diz Barroso.
“Trata-se de uma fórmula não-republicana, que faz parecer que uns são mais iguais do que outros”, diz o ministro.
Segundo Barroso, “o STF não é aparelhado para esse tipo de função, além de sujeitar o Tribunal a um tipo de contágio político que não é bom”.
“O modelo é extremamente disfuncional e se presta a todo o tipo de manipulação de competência da Corte, mediante renúncia a mandato ou desistência de candidatura, entre outros expedientes.”
“Tudo isso compromete a celeridade, induz à prescrição e gera impunidade.”
Barroso propõe que somente um número reduzido de autoridades deveria conservar o foro especial, como o Presidente da República e o Vice, os Presidentes do Senado, da Câmara e do STF, bem como o Procurador-Geral da República.
Para os demais agentes públicos que hoje detêm foro por prerrogativa, ele defende a criação de uma Vara Especializada em Brasília, no 1º grau de jurisdição. O titular seria escolhido pelo Supremo Tribunal Federal, para um mandato de quatro anos. Ao final desse período, o juiz titular seria automaticamente promovido para o Tribunal Regional Federal, na primeira vaga aberta, o que o imunizaria contra qualquer retaliação.
“Haveria tantos juízes auxiliares quantos necessários. Das decisões dessa Vara Especializada, caberia recurso ordinário para o STF, conforme a autoridade.”
Ele aponta duas razões que justificam a criação de uma Vara no Distrito Federal, em vez de a competência ser da Justiça Estadual: a) não deixar a autoridade pública sujeita à má-fé ou ao oportunismo político de ações penais em qualquer parte do país e b) neutralizar a influência do poder local, impedindo-se perseguições e favorecimentos.
“A Vara Especializada continuaria competente mesmo após a autoridade deixar o cargo, assim eliminando as idas e vindas do processo. Um modelo simétrico poderia ser aplicado às ações de improbidade administrativa.”
“Vamos ter que viver uma onda de desjudicialização. A nova advocacia que se desenvolverá terá profissionais especializados em negociação, em como compor os interesses sem necessidade de ajuizamento de uma demanda“, prevê Barroso.
Ao lado dele, florescerá outro tipo de advogado: aquele a quem as partes irão recorrer para que resolva para elas o problema, arbitrando o conflito.
“Vamos ter que diminuir as possibilidades de recursos e coibir o uso abusivo deles.”
“Teremos que desenvolver a cultura de que o acesso à Justiça e o devido processo legal se realizam em dois graus de jurisdição. E, aí, o processo termina. Só irá para um tribunal superior se houver uma questão que interesse ao país, à sociedade ou a um número expressivo de pessoas.”
E, mais à frente, ao receber a inicial, o juiz fixará a data em que os autos irão conclusos para a sentença. Para Barroso, seis meses é o prazo que as partes terão para produzirem, por conta própria, suas provas e seus argumentos.
“O Supremo Tribunal Federal não deve funcionar como a terceira ou quarta instância da Justiça brasileira. Este não é o papel de nenhuma corte suprema ou tribunal constitucional do mundo.”
Segundo o conferencista, “o papel do Supremo Tribunal Federal é o de julgar as grandes questões que afetam à sociedade brasileira, à luz da Constituição, bem como fornecer as linhas jurisprudenciais que vão orientar os demais juízes e tribunais do país. Para tanto, precisa julgar com tempo de reflexão, qualidade e visibilidade”.