Márcio Thomaz Bastos (1935-2014)

Frederico Vasconcelos

“Eu nunca ia ser um bom juiz. Eu sou parcial. Eu escolho lado. Não tenho aquela distância dos fatos.”

Márcio Thomaz BastosMárcio Thomaz Bastos foi o mais influente advogado de uma geração de famosos criminalistas que participou ativamente do processo de redemocratização do país. Trocou uma bem-sucedida banca de advocacia pelo cargo de ministro da Justiça no primeiro mandato de Luiz Inácio Lula da Silva como presidente da República.

Conheceu o então líder sindical em 1979, numa palestra no ABC. Apoiou sua candidatura, sustentando que um operário não somente podia, como devia ser Presidente.

Deixou o governo em 2007, no começo do segundo mandato de Lula. Passou a trabalhar em parcerias com advogados amigos.

Vestiu a beca  na ação penal do mensalão, defendendo um diretor do Banco Rural e liderando um grupo de notáveis advogados que não conseguiu evitar que o Supremo remetesse lideranças do Partido dos Trabalhadores, dirigentes de partidos da base aliada, publicitários, empresários, entre outros, para a prisão da Papuda, no Distrito Federal.

Foi apontado como o inspirador da tese de que o mensalão seria apenas caixa dois de campanha eleitoral. Mais recentemente, articulava a defesa de duas grandes empreiteiras envolvidas no petrolão: a Odebrecht e a Camargo Corrêa.

“Eu defendo os meus clientes da culpa legal. Julgamentos morais eu deixo para a majestosa vingança de Deus”, afirmou em 2009, citando o criminalista norte-americano Edward Bennett Williams.

Márcio Thomaz Bastos nasceu em 30 de julho de 1935. Estudou em escolas públicas e formou-se advogado pela Faculdade de Direito da USP, na turma de 1958.

Era chamado de “God” [Deus] por advogados amigos. Nos anos 70, atuando em júris, tinha o apelido de “Menino Jesus“. Entre familiares, era o “Grilo Seco“. Um amigo de Cruzeiro (SP), sua terra natal, referia-se ao criminalista como “Bico Doce“.

Elegante nos gestos e nos trajes, o filho do médico José Diogo Bastos e de Salma, descendente de libaneses, iniciou sua trajetória política em 1964, como vereador em Cruzeiro, pelo Partido Social Progressista, partido do governador paulista Ademar de Barros (aquele que inspirou o lema popular “rouba mas faz”).

Thomaz Bastos apoiou o golpe militar.

Foi presidente da OAB-SP (1983-1985), onde se aproximou dos movimentos sociais. Participou das “Diretas-Já” e atuou na OAB Nacional (1987-1989) no período da Constituinte. Em 1990, integrou o governo paralelo criado pelo PT após a eleição de Fernando Collor de Mello. Com o jurista Evandro Lins e Silva, participou da redação da petição que resultou no impeachment de Collor.

Em 1996, defendeu movimento da OAB para cobrar dos candidatos a divulgação dos financiadores de suas campanhas eleitorais. Anos depois, seu escritório atenderia grandes financiadores de políticos.

Thomaz Bastos dizia que entraria para a história como o ministro que fez a reforma do Poder Judiciário e que promoveu uma revolução na Polícia Federal.

Quando foi ministro da Justiça, doze famosos criminalistas lançaram manifesto público condenando as chamadas operações pirotécnicas da Polícia Federal.

Uma portaria que assinou não evitou a exposição midiática nas diligências da PF.

Thomaz Bastos é um dos fundadores do IDDD – Instituto de Defesa do Direito de Defesa. Mas atuou na acusação do cantor Lindomar Castilho, do jornalista Pimenta Neves e dos assassinos de Chico Mendes.

Defendeu acusados de corrupção, atentado violento ao pudor, sonegação fiscal, assassinato, tráfico e uso de drogas. Não atuou na defesa de presos políticos.

O advogado também ficou conhecido como adepto do direito da defesa bem remunerada, qualidade admitida por parentes e amigos.

“Por quanto o senhor se vendeu?”, perguntaram a Thomaz Bastos, num programa de televisão, sobre os honorários que recebera, em 1985, do empresário Mario Garnero, do grupo Brasilinvest. Garnero foi acusado de provocar um rombo nos cofres públicos naquele que teria sido o primeiro grande escândalo financeiro a irrigar grandes somas para escritórios de advocacia.

“Eu respondi que estava cumprindo o meu dever, o sagrado direito de defesa”, afirmou em 2009 ao jornalista Luiz Maklouf Carvalho, para reportagem na revista “Piauí“.

A primeira causa que o enriqueceu, segundo Maklouf, foi a de Ivo Morganti, em 1982, na qual defendeu a viúva e o filho do fazendeiro e usineiro, acusados de assassiná-lo.

O advogado foi defensor, entre muitos outros famosos, de Antônio Carlos Magalhães, do bispo Edir Macedo e da ex-prefeita Luiza Erundina.

Indicou vários ministros para o STF. Poderia ter sido membro do Supremo.

“Não tenho vocação de juiz. Eu nunca ia ser um bom juiz. Eu sou parcial. Eu escolho lado. Não tenho aquela distância dos fatos.”