O tribunal realmente é uma Corte

Frederico Vasconcelos

Corregedores em Salvador

Em novembro último, o Tribunal de Justiça da Bahia realizou o “67º Encontro do Colégio de Corregedores Gerais dos Tribunais de Justiça do Brasil“. Durante o evento, cada corregedor estadual ingressou acompanhado por um militar que portava a bandeira da respectiva unidade da federação.

O corregedor exerce um cargo administrativo –“uma das mais nobres e relevantes funções do Judiciário brasileiro”, no dizer de Vladimir Passos de Freitas, ex-presidente do TRF-4. Mas a cerimônia do TJ da Bahia ilustra bem as formalidades comuns em atos públicos –como a posse de dirigentes, de desembargadores, distribuição de medalhas, colocação de fotografias de ex-gestores etc.– ou reuniões administrativas, como é o caso.

Segundo já constatou o ministro Gilmar Mendes, ex-presidente do Conselho Nacional de Justiça, “até as pedras sabem que as corregedorias nos Estados não funcionam quando se trata de investigar seus próprios pares”.

O TJ da Bahia aprovou em dezembro uma resolução que regula os atos do cerimonial da Presidência. (*)  O cidadão comum pode conhecer como são organizadas essas solenidades, costumes que talvez sejam herança da monarquia, e avaliar o tempo e os recursos gastos para sua realização. Esses rituais são semelhantes em outras Cortes e envolvem instituições externas para providências que às vezes afetam a população, como o desvio do trânsito e o reforço da segurança.

Eis alguns exemplos dos cuidados protocolares previstos na resolução do TJ-BA:

– Para todas as sessões especiais do Tribunal Pleno e eventos solenes, são enviados convites para 24 autoridades e personalidades, do governador ao presidente da Academia de Letras estadual. Para as sessões especiais, são acrescentados a essa lista convites para 14 autoridades federais e de outros Estados, incluindo-se os comandantes militares da região.

– Para as sessões de posse dos dirigentes, acrescentam-se às duas listas anteriores convites para mais 17 destinatários, incluindo-se senadores e deputados federais.

– Cabe ao cerimonial indicar a localização de cada autoridade, observando-se a precedência. Entre os presidentes dos tribunais estaduais a precedência é determinada pela ordem de constituição histórica das Cortes, lista encabeçada pelo tribunal da Bahia.

– A resolução estabelece que “em almoços e jantares oficiais, tendo o presidente do Tribunal como anfitrião, nenhum convidado poderá fazer-se representar”.

– Nas cerimônias de posse, entregas de medalhas, placas e outras condecorações, o homenageado poderá dispensar o caráter solene, “sendo facultativa a execução de fundo sonoro composto de música clássica orquestrada”.

– “Na hora ajustada para o início da sessão especial ou evento de caráter solene, o Presidente do Tribunal se deslocará em cortejo até o elevador que dá acesso ao auditório, tendo à frente o Assessor de Cerimonial, que sinalizará o caminho”.

O protocolo do Judiciário baiano foi para o espaço, no ano passado, quando dois desembargadores ex-presidentes do TJ da Bahia –afastados pelo Conselho Nacional de Justiça e ainda sob investigação por suspeitas de graves irregularidades– reassumiram o cargo em evento público. Eles foram homenageados com foguetório e a presença do governador da Bahia e do prefeito de Salvador.

Na avaliação do ministro Gilson Dipp, ex-corregedor nacional de Justiça, o episódio “mostra a imagem de sensação de impunidade, de enfrentamento do sistema legal”. Segundo Dipp, “esse acinte, de serem recebidos com festa, parece que é para desmoralizar a Justiça”.

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(*) Resolução nº 20, de 17 de dezembro de 2014