Procurador que criticou o auxílio-moradia também requereu o benefício

Frederico Vasconcelos

Davy Lincoln Rocha diz que seria “heroísmo idiota” não receber o auxílio que definira como um “deslavado jabá”.

Folha de Pagamento Davy Lincoln Rocha

O Procurador da República Davy Lincoln Rocha, de Joinville (SC), que em outubro do ano passado condenou o auxílio-moradia –por considerá-lo “um vergonhoso privilégio” e “deslavado jabá”– requereu o pagamento do benefício, tendo recebido R$ 15.467,98 –valor correspondente aos meses de setembro [parcial], outubro, novembro e dezembro de 2014.

Ele não rejeitou o auxílio –como informou este Blog, quando reproduziu texto em que Rocha afirmou que teria dificuldade de explicar a Deus que “esse vergonhoso auxílio-moradia era justo e moral”.

Consultado nesta quarta-feira (21), o procurador disse que “seria um heroísmo idiota meu não receber, sabendo que [o auxílio] veio no lugar de um aumento que deveria ter obedecido o princípio da igualdade”.

“Eu nunca falei que não ia poder receber”, diz Rocha.

O comprovante do pagamento –reproduzido neste post– está disponível no Portal da Transparência.

O auxílio-moradia no Ministério Público da União foi instituído por simetria pelo Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP) a partir da liminar concedida pelo ministro Luiz Fux, do Supremo Tribunal Federal.

Em dezembro, o Ministério Público Federal elaborou uma folha de pagamento complementar, correspondente a 3,5 vezes o valor mensal do benefício (porque a decisão passou a vigorar em meados de setembro). Para preservar a coerência de quem eventualmente fosse contra o benefício, o Procurador-Geral da República, Rodrigo Janot, determinou que o auxílio deveria ser requerido pelos membros do Ministério Público. Ou seja, não houve pagamento automático.

Questionado se ainda achava que o auxílio-moradia é “um deslavado jabá”, Davy Lincoln Rocha disse que não vai “abrir mão” do pagamento, mas que continua criticando o benefício.

“A injustiça está em dar aumento apenas para alguns. Houve grande egoísmo, pois, no açodamento, abandonaram os juízes e os procuradores aposentados”, diz. “Não me intimidarão, continuarei criticando. Sinto vergonha de receber porque não estão pagando para todos”, afirma.

Em artigo publicado neste blog em outubro, Rocha afirmou:

Tomara, mas tomara mesmo que Deus não exista, porque Ele sabe que eu tenho casa própria, como de resto têm quase todos os Procuradores e Magistrados e que, no fundo de nossas consciências, todos nós sabemos, e muito bem, o que estamos prestes a fazer.

(…)

A partir de agora, no serviço público, nós, Procuradores da República dos Procuradores, e eles, os Magistrados, teremos a exclusividade de poder conjugar nas primeiras pessoas o verbo MORAR.

Fica combinado que, doravante, o resto da choldra do funcionalismo não vai mais “morar”. Eles irão apenas se “esconder” em algum buraco, pois morar passou a ser privilégio de uma casta superior.

Rocha confirma que possui apartamento próprio, de quatro quartos.