Pérolas e alegorias do novo CPC
Sob o título “Novo CPC?“, o artigo a seguir é de autoria do Juiz Federal Roberto Wanderley Nogueira, de Pernambuco.
Dizem que vão trocar o Código de Processo Civil editado em 1973 e atualizado, em variável constante, desde os anos ’80.
Penso que o código que temos é perfeitamente satisfatório. Mas, precisa ter quem saiba aplicá-lo em toda a sua extensão. Se fosse para aproveitar algum ou outro artigo, para que mudar? O atual CPC já vinha sendo razoavelmente atualizado desde a década de ’80.
Dentre outras pérolas, não faz sentido arrancar da Teoria do Processo o Livro das Cautelares. Essas “inovações” vão causar retrocesso ao sistema jurídico-processual, se entrar em vigor o chamado novo CPC. Aliás, mudanças legislativas desnecessárias têm o signo do conservadorismo. Às vezes, esse conservadorismo atende por interesses corporativos bem específicos que resultam da luta de extratos sociais bem definidos, os quais atuam nos mesmos espaços sociais. O novo CPC permite ser interpretado mais como um manual de rotinas corporativas do que um diploma normativo que sirva à Nação.
Outrossim, os problemas de inadequação processual correntes que geram dificuldades no provimento eficaz e qualificado da atividade forense e que acabam revelando a incapacidade do sistema para responder com justeza às exigências da Constituição e da contemporaneidade, decorrem muito mais da falta de massa crítica judicial satisfatória, quer no quantitativo quer no qualitativo, muitíssimo mais do que do regramento legal do processo. Desvia-se, pois, do foco antropológico, raiz de toda a crise de Estado e, por extensão, do processo brasileiro, e parte-se para soluções meramente simbólicas, a exemplo de mudar por mudar a lei, fazendo de contas que se alterou um feixe de paradigmas, quando em verdade nada foi de fato transformado e tudo vai estar como antes.
Adicione-se a isso as dificuldades pelo emprego de rotinas corrigentes também adequadas e satisfatórias, um ciclo que continua agravado e parece mesmo imutável, haja vista as brechas autoritárias que insistem em conservar na Constituição da República, sem solução de continuidade.
Falta estímulo às carreiras judiciárias e todo o sistema permite o privilégio dos mais favorecidos. Os lobbies atuam nesse limbo com riscos à saúde institucional e ética do sistema, sobretudo à independência funcional dos juízes e à compostura profissional dos advogados. Isso tudo reflete no regular funcionamento da Administração da Justiça e na eficiência dos processos.
Acesso à Justiça sem defensoria pública suficiente, por exemplo, é apenas uma alegoria. Processo Judicial eletrônico, enfiado goela abaixo da Nação sem interoperabilidade (requisito essencial da virtualização dos processos), traduz um outro dislate que alija do processo legiões de cidadãos e muitos operadores. O PJe é proibido aos advogados cegos, por exemplo, para realçar o absurdo! Ofende-se com isso o superior pensamento de Mauro Cappelletti, mas sobretudo ofende-se o plexo de valores encartados na Constituição da República. Em nada disso se mexeu. Muito curioso, além de intrigante.
Culpar, dessa forma, a legislação por um histórico já cronificado de desafeições às exigências sociais relacionadas com o devido processo legal é tão impróprio como tentar empanar a excelência do Código de Processo do genial Alfredo Buzaid, que nenhum jurista, até agora, conseguiu jamais reescrever.
Se vingar o tal novo CPC, ao fim e ao cabo, um claro desserviço à Nação, mas um triunfo de editoras e escrevinhadores repetitivos, vamos ter apenas que repetir também uma velha parêmica: É MAIS DO MESMO!