Lentidão no TJ-SP e silêncio no CNJ

Frederico Vasconcelos

– Reclamação contra desembargador Armando Toledo poderia ter sido julgada desde setembro de 2013.

– Ex-presidente Ivan Sartori diz que não constatou irregularidade grave no comportamento do relator.

Armando Toledo e Barros Munhoz
Reportagem de autoria do editor deste Blog –publicada nesta terça-feira (17) na Folha— revela que o Conselho Nacional de Justiça ainda não julgou uma reclamação recebida em 2013 contra o desembargador Armando Sérgio Prado de Toledo, do Tribunal de Justiça de São Paulo.

Ele é suspeito de retardar –durante mais de três anos — um processo do qual era relator para favorecer o então presidente da Assembleia Legislativa de São Paulo, deputado Barros Munhoz (PSDB), atual líder do governo Geraldo Alckmin na Assembleia.

Na época, Toledo era diretor de Assuntos Legislativos da Associação Paulista dos Magistrados (Apamagis) e tratava de interesses do tribunal junto a órgãos públicos.

Barros Munhoz foi denunciado sob acusação de desviar dinheiro público quando era prefeito do município de Itapira (SP), entre 1997 e 2004.

Os crimes de formação de quadrilha, fraude à licitação e omissão de informações ao Ministério Público prescreveram enquanto o processo estava com Toledo. Ou seja, o Estado perdeu o prazo para eventualmente punir. O crime de quadrilha prescreveu um mês antes de o relator proferir seu voto.

A corregedoria do CNJ constatou que, “ao longo de mais de três anos e quatro meses, não houve a prática de nenhum ato processual”.

A reclamação contra Toledo entrou em pauta em várias sessões no final do ano passado, mas não foi levada a julgamento pelo presidente do CNJ, ministro Ricardo Lewandowski.

Desde novembro de 2013, o sistema eletrônico do CNJ não registra nenhuma movimentação desse processo.

Reservadamente, alguns magistrados sugerem que há uma rede de proteção para blindar o desembargador Toledo.

O CNJ não respondeu os pedidos de esclarecimentos enviados pela reportagem.

 

Indícios de desvios

Em agosto de 2012, por 18 votos a 1, o tribunal recebeu a denúncia contra Munhoz pela suposta prática de apropriação e desvio de bens e rendas públicas –por 33 vezes.

O órgão Especial adotou o voto divergente do revisor, desembargador Luís Soares de Mello. Único voto vencido, Toledo entendera que a peça de acusação era inepta [não atendia às exigências legais].

Em declaração de voto, o desembargador Samuel Júnior afirmou que “existem indícios suficientes de que José Barros Munhoz teria desviado bens e rendas públicas, em proveito próprio e de terceiros”. O desembargador Amado de Faria também proferiu voto escrito acompanhando o revisor.

Durante duas sessões, Toledo não respondeu as interpelações dos desembargadores Grava Brasil e Urbano Ruiz, que desejavam saber que providências ele havia tomado como relator para justificar o retardamento do processo.

 

Arquivamento no TJ-SP

Em junho de 2013, o então corregedor nacional de Justiça, Francisco Falcão, determinou que a presidência do TJ-SP apurasse os fatos. O presidente à época, desembargador Ivan Sartori, instaurou o procedimento interno e arquivou o caso. Falcão registrou que o arquivamento “impediu o necessário aprofundamento das investigações”.

Aos justificar o atraso, Toledo alegou que exercia várias atividades no tribunal e era diretor da Escola Paulista da Magistratura. A corregedoria do CNJ pediu uma certidão da produtividade do magistrado. Constatou que “não houve atraso no julgamento de qualquer outro processo”, além da ação contra Munhoz.

Em setembro de 2013, Falcão mandou intimar Toledo para a sessão de julgamento. Mas a reclamação só viria a entrar na pauta do CNJ mais de um ano depois, por decisão da nova corregedora, ministra Nancy Andrighi, que examinara o processo.

O julgamento finalmente foi marcado para 18 de novembro último. No dia da sessão, os advogados de Toledo protocolaram no CNJ uma documentação volumosa. Andrighi retirou a reclamação da pauta na véspera da sessão seguinte, justificando a necessidade de analisar os documentos.

 

Arquivamento na PGR

Em janeiro deste ano, analisando a mesma reclamação entregue ao CNJ, a vice-procuradora geral da República, Ela Wiecko de Castilho, entendeu que não havia indícios suficientes para uma investigação criminal por suspeita de prevaricação.

Essa decisão não interrompe a reclamação disciplinar no CNJ.

Toledo alegou à Procuradoria-Geral da República que estava afastado havia muito tempo do julgamento de ações penais, pois atuava desde 2002 na área de Direito Privado.

Disse que contou com o trabalho de uma servidora, a quem solicitou “um detalhado relatório do que ocorreu e dos documentos do processo, além de proceder a uma pesquisa apurada da doutrina”.

Afirmou que essas anotações “em nada alertavam sobre a verificação de eventual prescrição”.

Candidato menos votado ao cargo de corregedor-geral, quando José Renato Nalini foi eleito presidente do TJ-SP, Toledo atualmente representa o tribunal paulista na Comissão Executiva do Colégio Permanente de Tribunais de Justiça.

 

OUTRO LADO

Sartori diz que não houve irregularidade grave

O ex-presidente do Tribunal de Justiça de São Paulo, desembargador Ivan Sartori, afirmou que determinou o arquivamento do processo contra o desembargador Armando Toledo porque “os elementos à disposição não demonstravam irregularidade capaz de gerar aposentadoria compulsória ou disponibilidade, únicas penas a que estão sujeitos os desembargadores”.

Segundo Sartori, “quando muito, seria o caso de advertência ou censura, mas essas penalidades somente podem ser aplicadas ao juiz de primeiro grau”.

“Se estivesse convencido de que teria havido coisa mais grave, como corrupção, na certa, não teria arquivado”, disse Sartori.

O desembargador Armando Toledo afirmou que não comentaria o caso, “em respeito à hierarquia” e porque está “em apreciação pela autoridade competente”. “Seria anti-ético me manifestar”, disse. Seu advogado, Alberto Pavie Ribeiro, também não comentou.

No voto que proferiu, Toledo sustentou que “a denúncia foi formulada de forma genérica”. Não descrevia, segundo ele, como o deputado José Antônio Barros Munhoz “teria se apropriado ou desviado rendas públicas”. Alegou ainda a dificuldade de localizar documentos que “supostamente corroborariam as acusações”.

Consultado sobre seu relacionamento com o desembargador Toledo, o deputado Barros Munhoz afirmou em nota, por intermédio de sua assessoria: “Reafirmo meu total respeito à independência entre os poderes que regem nossa democracia e que são os pilares para o bom andamento de toda sociedade organizada. Tenho a honra de conhecer o desembargador Armando Toledo, assim como, dezenas de desembargadores que honram e dignificam o Poder Judiciário de São Paulo”.

Procurados, os ministros Francisco Falcão e Nancy Andrighi não se pronunciaram.