Godot, Janot e o MP de Contas
Sob o título “Janot e Lindoca, um caso de amor e ódio“, o artigo a seguir é de autoria de Gabriel Guy Léger, procurador do Ministério Público de Contas do Paraná. O texto foi publicado na sua página do Facebook e é reproduzido por sugestão de colegas. O artigo trata da Ação Direta de Inconstitucionalidade 5254, em que o Procurador-Geral da República, Rodrigo Janot, sustenta, com base em julgamentos anteriores, que o Supremo Tribunal Federal entendeu “não dispor o Ministério Público especial junto aos Tribunais de Contas, de ‘fisionomia institucional própria, recusando-lhe, consequentemente, as prerrogativas inerentes à autonomia jurídica, tanto na dimensão político-administrativa quanto no plano estritamente financeiro-orçamentário“. A Associação Nacional do Ministério Público de Contas (AMPCOM) pediu seu ingresso na ação na condição de amicus curiae. (*)
Janot agora todos já conhecem, famoso que ficou por uma lista de investigados a serem julgados pelo Supremo. A Lista de Janot, revelando os absurdos do atual modelo político partidário, e seus flertes com a criminalidade para manter estruturas de poder foi finalmente conhecida da população. Todos ansiavam por esta lista, todos esperando Janot. Quando finalmente veio a público a indignação foi geral, tanto dos listados, como da população em geral, embora por motivos e razões antagônicas.
Nos tempos de estudante fui apresentado a uma obra intitulada Esperando Godot, de Samuel Beckett, uma das obras ícones do chamado teatro do absurdo. Como a vida imita a arte, em absurdo se transformou a nosso contexto politico institucional. Tudo gira em torno da mala, ou do homem da mala.
Na ficção esperava-se por Godot, na vida real por Janot.
E Lindoca, quem é?
Vulgo Lindoca é Elivelton Benigno dos Santos, nos diz a juíza prolatora do despacho na ação penal 0001309-21.2012.8.14.0018. A crer no despacho concessivo da liberdade provisória seria meliante de pequeno potencial ofensivo, garimpeiro em Serra Pelada que se envolveu em episódio que resultou em destruição do patrimônio alheio por ocasião de pleito eleitoral.
Na ocasião foi proibido de frequentar bares e boates, bem como permanecer na rua após as 22:00 horas, de se reunir com demais denunciados e de se aproximar por menos de 100 metros das dependências da empresa vítima.
Quase nada mais se sabe de Lindoca, salvo a refrega trabalhista que teve com a Cooperativa de Mineração dos Garimpeiros de Serra Pelada – COOMIGASP. Bem assistido por seu procurador logrou obter acordo já na primeira audiência realizada em fevereiro de 2013 pela 1ª Vara do Trabalho de Parauapebas, nos autos nº 0000917-04.2012.5.08.0114.
Lindoca é pessoa simples, sem maiores pretensões do que a de receber o que lhe caberia de direito, fruto de seu labor. Constrito a não frequentar bares e boates, ou amigos baderneiros, é de se supor que ele se recolheu às suas atividades cotidianas e caseiras.
De lá para cá não se teve mais notícias de Lindoca.
Eis que de repente, do nada surge o nome de Lindoca no Supremo Tribunal Federal, citado em ADI – Ação Direta de Inconstitucionalidade, na qual Janot se investe contra a autonomia orçamentária e financeira do Ministério Público de Contas do Pará, órgão de estatura constitucional que atua junto aos Tribunais de Contas, naquele estado junto aos dois TCs, o do Estado e dos Municípios.
Como? Janot se investe CONTRA a autonomia do Ministério Público? De Contas?
Calma lá, mais adiante explicaremos isto.
Por hora estamos a verificar onde o fio da vida fez com que Lindoca e Janot se encontrassem.
Vladimir e Estragon esperavam por Godot, assim como nós brasileiros esperávamos Janot, não para descobrir o conteúdo da mala de Lucky, mas para desnudar os atos de corrupção que estão a encher as burras dos achegados do poder.
E Lindoca com isto?
Bem Lindoca, ou melhor, Elivelton Benigno do Santos foi citado por Janot como autor de uma representação instaurada na Procuradoria-Geral da República que gerou o processo administrativo nº 1.00.000.005437/2013-15, que dá azo à ADI nº 5254 recém distribuída ao Ministro Roberto Barroso.
Elivelton Benigno do Santos veio a servir a um maligno propósito.
Não que ele saiba, mas seu nome, endereço, e qualificação, incluída o RG, foi utilizado por alguém movido por um severo ranço contra o Ministério Público de Contas do Pará, sabe-se lá por qual razão ou interesse contrariado.
Um covarde movido por cego ódio, utiliza-se da qualificação de Lindoca para destilar seu fel contra o MPC/PA. Um covarde que não se constrange em falsificar uma assinatura como se fosse a de Lindoca.
Janot, que não é Godot, aquele que se faz esperar, não titubeia, e propõe logo uma ADI para acabar com a autonomia do MPC/PA caracterizada nas expressões “independência funcional, financeira e administrativa, dispondo de dotação global própria”, contida na Lei Complementar nº 09/1992 do Estado do Pará.
E Janot, que ama o que faz, acima de tudo ama suas próprias idéias, firma a ADI 5254.
Janot até pode se mover nas sombras, mas delas não gosta. A sua luz é a que deve irradiar, ainda que para isso seja necessário construir por linhas tortas pífios argumentos para desconstituir brilhantes decisões do CNMP, adotadas em gestão passada, quando estas não se alinham a seus propósitos; ainda que seja uma decisão unanime. Pouco importa. Mais que a construção de um Ministério Público brasileiro, forte e uníssono no combate à corrupção, importa é a prevalência de sua idéia, na qual não ha espaço para um Ministério Público de Contas, entidade centenária, cujas raízes mais profundas remontam ao decreto n.º 1166, de 17 de outubro de 1892, que disciplinava a estrutura do Tribunal de Contas da União. Se não estiver sob sua rédea e batuta não pode ser MP. Simples assim. Pobre assim.
Não importa a lapidar lição da Conselheira Thaís Schilling Ferraz proferida na Consulta 0.00.000.000843/2013-39-CNMP. Importa é o seu pensar.
E o amor desmesurado às suas próprias idéias casa-se com o ódio daquele que por Lindoca se faz passar.
Esperemos com serenidade que o STF não se deixe levar por uma ADI baseada em sentimentos de ódio e amor, e saiba reconhecer a grandeza institucional do Ministério Público de Contas Brasileiro.
Vladimir: Então, devemos partir?
Estragon: Sim, vamos.
Eles não se movem.
(*) Texto corrigido às 14h