Rodrigo Janot na berlinda
Os ataques ao Procurador-Geral da República, Rodrigo Janot –promovidos pelo deputado Eduardo Cunha (PMDB-RJ) e pelo senador Fernando Collor (PTB-AL), ambos investigados na Lava Jato– estão produzindo efeitos contraditórios no processo de sua recondução ao cargo.
Internamente, prevê-se uma vitória folgada de Janot, que deverá liderar a lista tríplice na votação promovida pela Associação Nacional dos Procuradores da República (ANPR). Até entre os que criticam o seu estilo de gestão, ele conta com forte apoio e solidariedade diante dos ataques externos a partir da Lava Jato.
Externamente, este será o mais difícil processo de recondução de um PGR. Janot precisará ter seu nome confirmado por Dilma Rousseff, uma presidente enfraquecida e sob pressão. Será sabatinado num Senado hostil e submetido a uma votação secreta, no plenário, onde são eleitores alguns de seus investigados.
Consulta feita a dez membros do Ministério Público Federal sugere que a campanha eleitoral deverá trazer à tona críticas ao estilo de administração do atual PGR, mas insuficientes para ameaçar sua continuidade no cargo [leia, abaixo, trechos de alguns comentários].
A recente eleição do subprocurador-geral Carlos Frederico Santos –não alinhado com Janot– para uma vaga no Conselho Superior do Ministério Público Federal foi vista como um sinal de desgaste para o PGR. Com o lema “Independência e Representatividade“, ele derrotou o subprocurador-geral Nicolao Dino, mais próximo de Janot.
Na PGR, essa avaliação é descartada. Alega-se que Janot foi neutro na disputa. O próprio Carlos Frederico admite pontos positivos na gestão de Janot, mas diz ter “uma visão crítica de questões internas, como a distribuição das promoções”.
Há uma insatisfação silenciosa, agravada com o adiamento do calendário eleitoral, que geralmente é aberto entre abril e maio. A nova diretoria da ANPR marcou a votação para o dia 5 de agosto, com inscrições entre 20 e 24 de junho.
Alega-se que julho é mês de férias da maioria dos procuradores. Isso dificultará a realização de debates e a campanha de eventuais candidatos interessados em firmar posição com vistas à eleição seguinte. Ou seja, Janot seria o único candidato a ter vantagem em se candidatar nesse período.
Em abril, quando a diretoria anterior da ANPR decidiu congelar a corrida sucessória, temia-se fragilizar o procurador-geral como alvo de ataques em final da gestão.
“Manter eventualmente a escolha em abril e maio seria criar um fator de instabilidade, quando ainda faltaria cumprir um quarto do mandato”, diz José Robalinho Cavalcanti. Ele assumiu a presidência da ANPR no último dia 14, colocando como prioridade a definição do processo eleitoral.
Em mensagem na rede interna do MPF, Robalinho pediu aos eventuais candidatos “que compreendam a necessidade deste sacrifício”. “Não é o ideal, diz, mas não foi a ANPR nem o Ministério Público quem definiu a posse do PGR na segunda quinzena de setembro”, registra.
O presidente da ANPR diz que a resolução que rege a escolha impõe um período mínimo de 15 dias de campanha. “Desta vez, serão pelo menos 50 dias”, afirma Robalinho.
Os mais próximos de Janot entendem que o PGR vem cumprindo as três prioridades que definiu na campanha: o combate à corrupção, a redução dos processos no gabinete do PGR e a desconcentração das decisões na cúpula do MPF. Ao montar grupos de trabalhos formados por procuradores –convocados pelo critério de experiência nas áreas de combate à corrupção– ele teria gerado desconforto entre alguns subprocuradores-gerais.
A eleição está na ordem do dia no plano interno, mas Janot evita alimentar o debate externo. Sua assessoria lembra que desde dezembro ele não concede entrevistas. Fala apenas em atos públicos.
Janot já confirmou que pretende disputar o segundo mandato. Mas não quis se manifestar sobre o assunto.
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A seguir, trechos das críticas e comentários feitos pelos procuradores, sob a condição de que teriam seus nomes preservados:
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“A decisão da ANPR de sobrestar a formação e votação da lista tríplice para PGR favorece sobremaneira o PGR Janot, que pretende a recondução. O motivo de a ANPR assim proceder deve-se ao fato de que atualmente a entidade possui um imenso alinhamento com a política do PGR que defere, até mesmo de forma acrítica, todos os pleitos corporativos.”
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“Aceitarem o auxílio moradia como aceitaram, mostra que a instituição ficou como qualquer corporação de servidor público: o cargo é fonte de benesses.”
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“Sinceramente, não consigo divisar intenção de favorecer ou prejudicar qualquer candidato. A peculiaridade dessa vez é que o mandato do atual PGR encerra mais tarde no ano, creio que por conta da demora maior ocorrida para sua nomeação. No final das contas, porém, os tempos de candidaturas e campanhas (na classe) serão os mesmos”.
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“De antemão sabido que Janot será, disparado, o primeiro e, igualmente disparado, a mais complicada, na provável hipótese da indicação por Dilma, aprovação de todos os PGRs pelo Senado. Tudo aponta pela celeridade, não o adiamento [da lista tríplice].”
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“A estratégia nesse adiamento reside no fato de que julho é um mês totalmente esvaziado na nossa instituição em razão das férias. O único candidato que teria vantagem para se lançar nesse período é o PGR, que possui toda a máquina administrativa a seu favor (…) Os demais eventuais candidatos terão sérias dificuldades de se expressar e serem efetivamente ouvidos nesse período de férias.”
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“Há uma resolução da ANPR, que estabelece prazos e esses estão relacionados ao final do mandato, que é 17 de setembro. A consulta era feita em maio porque o final do mandato era junho. Ocorre que do primeiro para o segundo mandato de Gurgel houve interinidade e do segundo mandato para o de Rodrigo outra interinidade. Então os prazos estão de acordo com isso.”
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“O adiamento da votação da lista tríplice deve ser manobra, para deixar mais em cima da data limite a escolha da Dilma.”
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“A data da consulta dificultará a habilitação de candidatos, a realização de campanha, consequentemente a realização de debates e consequentemente a formação de uma lista tríplice. (…) Tudo indica que, agora, a ANPR quer forçar uma lista “una” artificialmente dando a entender que a “classe” em peso apoia seu “líder”.
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“Essa fragorosa derrota, com a eleição do Carlos Frederico, é forte indicativo de que Janot perdeu prestígio perante a classe, insatisfeita com o engessamento da investigação política da Lava Jato”.
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“Acho que as investigações no STF estão a passo de cágado e até com vista à recondução em setembro. E retardar a formação da lista tríplice está de acordo com essa visão. Evita que venham críticas externas. Internamente, é um cala boca geral.”
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“A nossa instituição, sob a gestão do atual PGR, não se mostra uma instituição plural e não há espaço para qualquer tipo de crítica.”
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“Essa manipulação antecipada do resultado da consulta, assim como várias características do “Jeito Janot de Governar”, para dentro, esmagando qualquer divergência ou crítica, ainda que de aliados, tentando controlar com mão de ferro todos os órgãos de governança interna, como o Conselho Superior (onde acaba de perder 2 vagas em eleições nesta semana) e as Câmaras temáticas, não tem agradado espíritos mais críticos.”
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“Vários colegas, sempre reservadamente, disseram estar decepcionados com a condução de Janot na investigação do núcleo político da Lava Jato (…) Já deveria ter denunciado alguns políticos, inclusive e principalmente Dilma”
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“Qualquer nome que figurar na lista tríplice estará habilitado a atuar nos inquéritos relativos à Operação Lava Jato” (…) Há uma equipe de procuradores que estão auxiliando o PGR, o que propiciará que um novo titular do cargo possa logo se inteirar dos processos em andamento, não havendo qualquer prejuízo.”
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“Não vejo como ele [Janot] esteja mais exposto do que os que estão em primeiro grau. É o trabalho da primeira instância que está alimentando o trabalho dele.”
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“No plano da atuação externa, Rodrigo Janot conta com forte apoio e solidariedade dos colegas a partir da Lava Jato e outras atuações. Os ataques externos a ele fortalecem sua liderança. Também não há dúvidas de que ele seria o mais votado de uma lista tríplice”.
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“Ele está em campanha desde o início do ano. O calendário eleitoral proposto não permitirá campanha de outros eventuais postulantes.”
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“Janot inflou seu gabinete com um grande número de procuradores e procuradores regionais, que se transferiram para Brasília com diárias e passagens. (…) Apesar de restrições orçamentárias, não há limites para gastos com esses escolhidos, inclusive em viagens internacionais muito frequentes. Isso tem gerado insatisfação entre os Subprocuradores-Gerais, não tanto por esses aspectos, mas porque esses colegas estão assumindo tarefas nos tribunais superiores.”
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“Há uma insatisfação silenciosa internamente, mas também uma maioria que, por ora, o aplaude considerando as forças contra quem atua.”
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