Eliana: “CNJ foi bom enquanto durou”
“Projeto transforma a Corregedoria Nacional em um apêndice da Presidência”, afirma a ex-corregedora.
A seguir, avaliação sobre o “desmanche” do Conselho Nacional de Justiça, em artigo da ex-corregedora nacional Eliana Calmon publicado com exclusividade no site “Jota“, sob o título “Os dez anos do CNJ“. Sem citar nominalmente o atual presidente do órgão, a ministra aposentada do STJ critica as propostas de Ricardo Lewandowski para a nova lei orgânica da magistratura.
***
Vejo com preocupação o desmanche do CNJ, com a paralização de programas importantíssimos como por exemplo os Mutirões Carcerários, o Justiça Plena, o Espaço Livre, o Projeto Pai Presente; com a desativação ou falta de manutenção de cadastros e bancos de dados tais como Cadastro Nacional de Adoção, Justiça Aberta; com a falta de fiscalização dos cartórios extrajudiciais, dos setores de precatórios nos tribunais e sobretudo com o afrouxamento da atividade censória aos magistrados. Mas a preocupação maior está no porvir, quando estamos com um anteprojeto de lei orgânica da magistratura que colocará uma pá de cal sobre tudo que conseguimos nestes dez anos.
Está bem claro no anteprojeto a ideologia da auto limitação, quando desconsidera o CNJ, colocado como o último dos órgãos a integrar o Poder Judiciário; também ignora inteiramente a forma e estrutura organizacional, gestão financeira e orçamentaria justamente do órgão criado para uniformizar e dinamizar a administração; com a nova lei as sanções disciplinares só poderão ser aplicadas pelo CNJ por maioria absoluta, o que deixa a função disciplinar única e exclusivamente nas mãos dos magistrados porque, dos quinze conselheiros, cuja maioria absoluta é oito, nove são juízes; o procedimento disciplinar regulado no projeto, transforma o CNJ em um órgão recursal, ao prever a competência do Tribunal e do órgão especial para as sindicâncias e procedimentos administrativos, com prejuízo da atuação do CNJ, que só poderá apreciar o feito como órgão administrativo recursal; até a competência avocatória foi limitada, reservada, excepcionalmente, nos casos de inércia, omissão ou irregularidade na atuação dos tribunais; a competência do CNJ está no anteprojeto expressa em números “clausus”, deixando explicitado ser proibida a criação de outras atribuições por resolução; também está expresso que o CNJ não terá nenhuma interferência sobre a vida financeira dos tribunais, com a só possibilidade de emitir parecer técnico; as metas do CNJ, para serem implantadas deverão contar com a aprovação dos Tribunais. Deixa o parágrafo único do artigo 275 do anteprojeto da Loman, expressa, a impossibilidade do CNJ suspender os efeitos de decisões judiciais, sendo clara a intenção de transformá-lo em órgão recursal, ao dispor sobre a atribuição do plenário para julgar os recursos de oficio nas decisões disciplinares, como consta do inciso VII do artigo 278; na votação para aplicação de pena disciplinar nas sessões plenárias do Conselho, prevalecerá, em caso de empate, o voto que aplique sanção de menor gravidade (art. 279).
Por fim, o projeto transforma a Corregedoria Nacional em um apêndice da Presidência, porque cabe ao presidente a atribuição de examinar todos os pedidos e requerimentos, liminarmente, antes da distribuição, inclusive os pedidos dirigidos à Corregedoria. Assim, só chegarão ao Corregedor os pleitos selecionados pelo Presidente.
Este é o retrato do futuro Conselho Nacional de Justiça após a aprovação da nova Lei Orgânica da Magistratura, quando ficará sedimentada a intenção que já se anuncia: o Conselho Nacional de Justiça deverá transformar-se em mais um órgão burocrático na estrutura do Poder Judiciário.
Ao comemorarmos o aniversário de dez anos desse órgão que representou a esperança de todos os brasileiros na condução a um Judiciário com transparência e controle, só nos resta aplaudir, dizendo: foi muito bom enquanto durou.