Em defesa do voo na classe executiva
Sob o título “Pela necessidade de viajar em primeira classe ou classe executiva!“, o artigo a seguir é de autoria de Osório Silva Barbosa Sobrinho, Procurador Regional da República da 3ª Região (SP-MS). *
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Algumas premissas absolutamente necessárias:
Ser servidor público não é uma pena!
Quem não é servidor público, regra geral, vive querendo sê-lo!
Não é o servidor público que trabalha pouco e ganha muito, é você, da iniciativa privada que é explorado (e ainda aplaude sua própria desgraça!) que ganha pouco e trabalha muito! O correto seria você, da iniciativa privada ganhar o que ganha o servidor público e trabalhar as horas que ele trabalha, pois aí você ainda não se teria tornado o escravo que você! Não teria a bola de ferro no tornozelo colocada pelo capitalismo. Portanto, nivele por cima, pelo razoável! Queira melhoria para você e não miséria para todos. É você quem está se afogando, portanto lute para sair da água, não queira afogar os demais.
Uma dica: estude e passe num concurso, o serviço público está aberto a todos! Mas, estude, não fique praguejando e esperando que Deus lhe enfie nada na cabeça! Repito: e-s-t-u-d-e!
Seus patrões dirão: “mas não existe emprego no serviço público para todo mundo”!
Responda a ele: mas para aqueles que “fazem calo na bunda estudando” tem! Ademais, o senhor vive dizendo que “tem Ferrari para todos”, basta que trabalhem, quando se sabe que apenas cerca de 30 desses carros são produzidos ao ano! Portanto, meu chefe, seu capitalismo só serve para você, que explora, não para o explorado!
Seus patrões, e você que se condoe com a malandragem deles, adoram, aqui em São Paulo e no Brasil, “não emitir a nota fiscal paulista”, por exemplo, além de outras sonegações e ainda pregam que ladrões são os outros!
Criaram até o mito de que receber a nota fiscal é pior para você!
O cara rouba da saúde, educação, transporte, moradia, segurança e pousa de honesto!
Fechemos as premissas, por enquanto!
Virou um escândalo o fato de o Ministério Público Federal ter regulamentado a classe em que viajarão seus membros em determinados voos!
Um fato histórico: com o neoliberalismo até os assentos dos aviões emagreceram. Isso é um fato!
Das largas e confortáveis poltronas da Varig migrou-se para os apertos da Gol/TAM!
É fato, segundo os médicos, logo será caso de saúde pública, que as pessoas que fazem longos voos devem exercitar-se, não ficar tanto tempo espremidos e parados, pois isso pode acarretar-lhes doenças ligadas à circulação sanguínea.
Além dos dois fatos acima, o Poder Judiciário e o Poder Excecutivo já tinham regulamentado em seus âmbitos tal matéria, portanto, nada mais natural que o MPF também o fizesse.
Quando um servidor público se desloca em uma viagem “a trabalho”, que é o caso sobre o qual tratamos (nunca vi, em 20 anos de casa, o MPF pagar viagens de férias para seus membros. Um PGR usou jatinhos da FAB para ir para Fernando de Noronha, em férias, mas o próprio MPF o acionou e ele pagou as despesas, embora, depois, o Poder Executivo e o Poder Judiciário tenham dito que ele não precisava fazê-lo!), ele está a serviço do país, não tratando de interesse pessoal, mas de interesse coletivo!
Portanto, vale repetir, além de o serviço público não ser uma pena para aquele que o exerce, este está a serviço da sociedade, e não é desfrute pessoal!
Um colega escreveu:
“Sem querer emitir qualquer juízo de valor sobre a questão, segue um pequeno histórico a respeito das normas referentes à aquisição de passagem aérea no âmbito da Justiça Federal.
A Resolução nº 386, de 19.08.2004, do Conselho da Justiça Federal cuidava da questão em seu art. 1º, in verbis:
“Art. 1º. As viagens a serviço no país de magistrados e servidores, custeadas com recursos do orçamento do Conselho da Justiça Federal, serão realizadas utilizando-se as seguintes classes de transportes aéreos:
I – classe executiva para os membros do Conselho da Justiça Federal;
II – classe econômica promocional para magistrados, não alcançados pelo inciso anterior, e demais servidores.
Parágrafo único. Quando não houver classe executiva para o trecho desejado os membros do Conselho da Justiça Federal utilizarão a classe econômica promocional.”
https://www2.cjf.jus.br/jspui/bitstream/handle/1234/3428/Res%20386-2004.pdf?sequence=1
Posteriormente veio a Resolução CJF nº 4, de 14.03.2008, que tratou da matéria nos seguintes termos:
“Art. 120. Nas viagens ao exterior, a categoria de transporte aéreo a ser utilizada será a seguinte:
I – primeira classe para todos os membros do Conselho da Justiça Federal;
II – classe executiva para os magistrados da Justiça Federal de primeiro e segundo graus; e
III – classe econômica ou turística para os servidores.
Parágrafo único. Poderá ser concedida ao servidor, quando em viagem ao exterior, passagem de classe executiva nos trechos em que o tempo de vôo entre o último embarque no território nacional e o destino for superior a 8 (oito) horas.
https://www2.cjf.jus.br/jspui/bitstream/handle/1234/3802/Res%20004-2008%20alt.pdf?sequence=3
Neste ano foi publicada a Resolução nº 340, de 11.02.2015 (revogou expressamente as acima transcritas), que passou a tratar a matéria nos seguintes termos:
“Art. 29 – Nas viagens ao exterior, a categoria de transporte aéreo a ser utilizada será a seguinte:
I – primeira classe, para todos os membros do Conselho da Justiça Federal;
II – classe executiva, para os magistrados da Justiça Federal de primeiro e segundo graus;
III – classe econômica ou turística, para os servidores.
Parágrafo único – Poderá ser concedida ao servidor passagem de classe executiva nos trechos em que o tempo de voo entre o último embarque no território nacional e o destino for superior a oito horas.”
http://www.lex.com.br/legis_26564623_RESOLUCAO_N_340_DE_11_DE_FEVEREIRO_DE_2015.aspx
Ao que parece, o PGR pretendeu dar aos membros do MPU o mesmo tratamento dado aos magistrados federais, o que restou afetado pela decisão judicial aqui comentada.”
Vejam como é tratado o assunto no âmbito do Poder Executivo:
“O Decreto 71333/73, que regulamenta a aquisição de passagens para o exterior do servidores públicos civis e militares em serviço da União no exterior. Seu art. 27 prevê a aquisição de: a) passagem de primeira classe para Presidente, Vice-Presidente, Ministros, Secretários e Comandantes do Exercito, da Marinha e da Aeronáutica; b) passagem na classe executiva para titulares de representações diplomáticas brasileiras, ocupantes de cargos de Natureza Especial, Oficiais-Generais, Ministros da Carreira de Diplomata, DAS-6 e equivalentes, Presidentes de Empresas Estatais, Fundações Públicas, Autarquias, Observador Parlamentar, ocupante de cargo em comissão designado para acompanhar Ministro de Estado e para ocupantes dos postos de Capitão-de-Mar-e-Guerra, Coronel, Conselheiro da Carreira de Diplomata e de cargos de DAS-5 e 4 e equivalentes, a critério do Secretário-Executivo ou de titular de cargo correlato, nos trechos em que o tempo de vôo entre o último embarque no Território Nacional e o destino for superior a oito horas.
Outro colega acrescentou:
“ – as viagens internacionais a serviço não são tantas. Aliás, para uma instituição que quer, precisa e merece ter reconhecimento internacional, são até poucas;
– usualmente, as viagens internacionais se dão por vôos longos, cansativos; e
– a chegada menos cansado no destino permite uma adaptação (ao clima, ao fuso, ao local do trabalho) mais rápida, ensejando uma permanência mais curta no destino (quase que apenas o mínimo de tempo necessário ao desenvolvimento das atividades que ensejaram o deslocamento), gerando economia de diárias internacionais.
A esses argumentos se somam outros dois: a representatividade do cargo e a simetria/paridade com o Poder Judiciário (tão bem demonstrada na mensagem acima).
A meu ver, um agravo – que eu espero e torço para que seja interposto – tem elevadas chances de ser provido.”
Não cito os autores por deles não ter pedido autorização, mas faço meus os seus escritos.
Para que se tenha uma ideia da dificuldade que é resolver o tema, um terceiro colega sugeriu:
“Eu devo reconhecer que, em deslocamentos internacionais longos do tipo bate-e-volta, há argumentos consistentes para o voo em classe executiva.
Noto, porém, que a juíza enfrentou esses argumentos e sugeriu uma alternativa a meu ver razoavel: antecipar/estender a estada no exterior em mais um dia, para a devida adaptacao/recuperacao do organismo. A economia será brutal, mesmo com o pagamento de mais 1 ou 2 dias de diárias.”
O que o colega e a juíza desconhecem é que, o próprio MPF tem ajuizado ações por improbidade administrativa contra servidores que seguem o que eles sugerem: “antecipar/estender a estada”, pois entendem tal possibilidade fere dispositivos legais protetores da moralidade administrativa! E aí?
A tudo até agora exposto, certamente que está presente, também, um pouco daquela desvirtude humana conhecida como “inveja negativa”, sentimento “humano, demasiadamente humano”!
O autor da ação é um agente subalterno do Poder Executivo, onde a imoralidade graça a passos largos, sem que ele, e é até compreensível, já que não dispõe de nenhuma autonomia, não faz nada! Ou melhor, não fazia, pois, agora, diz que cobrará os “ladrões da Petrobras”, isso se ele não for exonerado antes!
Não sei qual é a da juíza, mas ela, diversamente dos procuradores da República, não investiga! Sequer tem jurisdição além de Brasília (uma das 5 regiões em que está dividido o Brasil). No exterior ela não julga nada, logo, dificilmente tem como viajar para fazer algo por lá! O procurador da República é procurador da República no Brasil (todo) e no mundo (todo), pois pode, e deve, ir procurar provas onde estas se encontram! Estou falando, repita-se: a serviço!
A presidente da República não viaja de primeira classe! Ela tem um avião adaptado para ela! E que pode ser contra isso? Os ministros, inclusive aqueles que são acusados de receber propina oriundas dos desvios da Petrobras, viajam nos jatinhos da Força Aérea Brasileira! Seriam ladrões escoltados para praticarem suas traquinagens?
Mais uma ponderação de um colega:
“Esse fundamento de igualdade, assim como outros apontados pelos colegas, deve servir ao AGRAVO contra a decisão e não para abarcar ACPs (infrutíferas) contra os demais agentes que se valem da mesma prerrogativa.
A viagem ao exterior em classe executiva (que nunca fiz no exercício da função) é uma circunstância ligada ao pouco tempo de trabalho e da necessidade de plena condição física de atuação do membro do MPF assim que desembarca.
Quem voa de classe econômica em distâncias intercontinentais precisa de um dia de recuperação, na ida e na volta.
Acessoriamente, ainda há a questão da relevante representação do cargo.
Simples assim.”
Concordo plenamente!
E concordo, especialmente, por nunca ter viajado internacionalmente a serviço e, por certo, nunca irei fazê-lo, pois a aposentadoria se aproxima, mas “defendo até a morte o direito daqueles que precisam de fazê-lo”, para aproveitar a frase atribuída a Voltaire.
Muita água ainda vai rolar sob a ponte, em especial quando o MPF alegar a regulamentação do tema no âmbito de toda a magistratura, quando, então, a causa será levada ao Supremo Tribunal Federal, onde receberá a palavra final.
Espero, sinceramente, que os julgadores já tenham viajado de São Paulo para Manaus, pelo menos, como faço de vez em quando, sentados nas micro- poltronas e entre dois obesos! Isso se tiverem sobrevivido!
Mas, diga-se: não é os que viajam em classes especiais que estão errados, mas aqueles que viajam naquele aperto em que se é proibido, pelo aperto, até de ir aos banheiros!
Entretanto, para alguns, aqueles que condenam o progresso do conforto humano, melhor seria que os servidores públicos viajassem nos porões dos “navios negreiros”, sob açoite, dos quais nos falou, jogando em nossas caras, Castro Alves.
Aos demais uma dica: existem nas bancas inúmeros “jornais dos concursos”.
Mas, não esqueça, ESTUDE!
(*) Fonte: http://www.osoriobarbosa.com.br/node/813.