Lava Jato em fatias: paixão e razão

Frederico Vasconcelos

Vladimir Passos de Freitas

O fatiamento da Lava Jato significa o esvaziamento das investigações?

“É preciso mais razão e menos paixão”, responde o desembargador federal aposentado Vladimir Passos de Freitas em artigo ponderado, no último dia 4, no site “Consultor Jurídico”.

Segundo o autor, “o fatiamento será um problema mais do Judiciário do que da Polícia Federal ou do Ministério Público Federal”.

“Esses órgãos –a PF e o MPF– podem dividir a ação dos seus membros pelo território nacional, compartilhar conhecimentos. O Judiciário, não. Dará mais trabalho, mais despesas (pagamento de diárias), mas o resultado será o mesmo ou quase. A Polícia Federal e o MPF estão preparados para enfrentar os desafios, possuem profissionais altamente especializados e que dominam a criminalidade econômica”, diz Freitas.

O articulista alinhou algumas respostas afirmativas e negativas para tentar responder as seguintes questões: a) Os processos serão julgados com brevidade? b) Haverá punição? c) Ocorrerá a impunidade que tantos temem?

Eis algumas observações do autor:

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1) Haverá redução da efetividade e os resultados não serão os mesmos. É certo que todos os juízes federais têm ótimos conhecimentos jurídicos, os concursos são muito difíceis nas cinco regiões. Também todos, salvo episódios isolados, como o do uso do luxuoso automóvel de Eike Batista, têm procedimento ético.

Todavia, tais qualidades não bastam para casos como esses. Para presidir tais ações penais é necessário mais. É preciso energia, renúncias, certa dose de risco pessoal, trabalhar muito além das horas de expediente, apoio da família, discrição, tudo sem perder a imparcialidade e o respeito ao direito de defesa.

As pessoas são diferentes e afirmar que todos são iguais é ingenuidade ou hipocrisia. Pessoas em geral, e juízes em particular, são diferentes.

2) Há também a expertise. Processos como os da operação “lava jato” não são rotina em todas as varas federais. O conhecimento acumulado por [juiz Sergio] Moro sobre as práticas utilizadas, com certeza não é o de todos os juízes. Não será fácil para quem receber os autos inteirar-se da matéria, pois cada processo tem cerca de mil eventos, o que corresponde a 4 mil folhas.

3) Uma grande quantidade de desembargadores, com diferentes posições sobre o Direito Penal, examinarão os recursos. Terão por foco o caso concreto e não o todo. Ainda, o TRF-4 dispensou Moro de receber outros processos além dos resultantes da operação. Isso não ocorrerá em outras varas, até porque cada uma receberá parte deles. Assim, casos relevantes terão que dividir a agenda do juiz com coisas menores, como a apropriação de verba do INSS de empregados.

4) A divisão não resultará em total impunidade de todos os acusados. Muitos processos serão distribuídos a juízes estudiosos da matéria e com muita vontade de prestar jurisdição efetiva, de construir um novo Judiciário. Não há dúvidas, portanto, que parte das ações resultará, sim, em condenação e prisão.

“As provas não são apenas fruto de delações premiadas, mas também de documentos. Por exemplo, e-mails apreendidos pela Polícia Federal, evidenciando o lobby da Odebrecht junto à presidência da República, para vencer licitações em outros países (“O Globo” de 30 de setembro de 2015, p. 3).

5) É preciso deixar de lado a desconfiança que se tem de tudo e de todos, crendo que há no Brasil apenas uma pessoa que possa decidir esses casos, ou seja, o juiz Moro. Não é assim. Ele é excepcional, tem conhecimento jurídico, equilíbrio físico, psicológico e não se rendeu à vaidade. Mas há outros tantos, em todas as instâncias, merecedores de confiança.

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Segundo o autor, “o importante é que as instituições estão funcionando”.

“A Polícia Federal e o MPF estão fazendo um trabalho equilibrado, profissional, de alta eficiência. Nenhum órgão de cúpula do Poder Judiciário faz qualquer tipo de interferência na ação do juiz de primeira instância. Não há tentativas do Poder Executivo nesse sentido. Compare-se a situação com a vizinha Argentina onde, entre outras coisas, o promotor Alberto Nisman, que investigava crimes relacionados com políticos, foi morto e a apuração não avança.”

“Estamos vivendo um momento em que, pela primeira vez, crimes praticados por pessoas de poder político e econômico estão sendo submetidos a julgamento, com réus presos há longo tempo. Há muito mais a comemorar do que a lamentar”, conclui o desembargador.