Jornalista não quebra sigilo, diz TRF-3

Frederico Vasconcelos

Divulgação de informações sigilosas por repórter investigativo não se confunde com quebra e não é crime.

Por unanimidade, a 2ª Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região (SP/MS) acolheu o entendimento de que o crime de quebra de segredo de justiça pode ser atribuído, em princípio, apenas às pessoas que têm o dever legal de guarda do sigilo.

Três jornalistas da TV Globo conseguiram habeas corpus para não serem indiciados em inquérito policial pelo crime de quebra de segredo de justiça por divulgarem informações sigilosas de uma operação da Polícia Federal. (*)

A manifestação da Procuradoria Regional da República da 3ª Região (PRR-3) nesse caso foi de que esse crime é próprio, ou seja, pode ser atribuído apenas a determinadas pessoas, no caso, àquelas que têm acesso legítimo e direto ao procedimento de interceptação.

Segundo informa o tribunal, trechos de conversas telefônicas de envolvidos na operação denominada Sangue Frio, que constavam do inquérito sigiloso, foram divulgados em reportagem veiculada no programa “Fantástico” da TV Globo, o que levou o delegado da Polícia Federal a determinar o indiciamento de três jornalistas.

A operação investiga desvio de verbas do Sistema Único de Saúde (SUS) em hospitais públicos de Campo Grande (MS), onde os responsáveis realizavam tratamentos de câncer fictícios em pacientes.

“Importa a toda a população brasileira tomar conhecimento dos atos de desmando que os dirigentes públicos de hospitais públicos venham a praticar em detrimento de verbas oficiais, como o caso sugere”, decidiu o relator, desembargador Cotrim Guimarães.

De acordo com a 2ª Turma, a lei “busca repreender aquele que concretamente violou a obrigação legal de guarda de um sigilo decretado, ou seja, quem efetivamente procedeu à quebra, por possuir obrigação legal de resguardo, e não aquele que apenas divulgou dados recebidos de terceiros”. No caso, quando os jornalistas receberam o áudio com as conversas telefônicas, a quebra de sigilo já havia ocorrido.

Mesmo que fosse classificado de crime comum, “seria necessário que qualquer pessoa do povo viesse a praticar o ato caracterizado como quebra do segredo de justiça, como por exemplo, roubar a mídia de local protegido, ou qualquer outra ação concreta que se configurasse no crime tipificado pela lei”, ressaltou o colegiado.

Entretanto, “não há informação de que os jornalistas tiveram acesso criminoso ao material sigiloso e o conteúdo do material publicizado revelou assunto de interesse de toda cidadania sem qualquer mácula a direitos da personalidade, devendo pois prevalecer o interesse público representado pela informação veiculada,” afirmou o procurador regional da República da 3ª Região, Pedro Barbosa Pereira Neto, em sua manifestação sobre o caso.

Assim, ciente ou não do sigilo, o repórter investigativo que divulga dados que estavam em segredo de justiça, “não incorre na responsabilidade legal de resguardo da informação, como está previsto na lei”.

O procurador Pedro Barbosa destacou ainda o acesso à informação de interesse público, assegurado constitucionalmente. “A efetiva liberdade de informação jornalística, notadamente num país que já sofreu as agruras de uma ditadura militar, é instrumento fundamental para consolidação da sociedade democrática e pluralista”, afirmou.

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(*) HC Nº 0014097-92.2014.4.03.0000/MS