Pressão externa e corrupção interna
“Pressões internacionais pelos direitos humanos têm servido de combustível para corrupção e ineficiência.”
Sob o título “A Comissão Interamericana de Direitos Humanos e o Complexo Penitenciário de Curado (PE)“, o artigo a seguir é de autoria do juiz federal Hugo Otávio Tavares Vilela. (*)
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Após ter sido o país mais advertido pela Corte Interamericana de Direitos Humanos em 2014, o Brasil continua sofrendo reveses no cenário jurídico internacional. O país, que sofreu quatro advertências no ano passado, além das dezessete entre 1985 e 2013, expandiu seu currículo de desrespeito aos Direitos Humanos com a Resolução de 7 de outubro de 2015, editada por aquela Corte tendo em vista que as afrontas aos direitos humanos constatadas em 2014 no Complexo Penitenciário de Curado (PE) continuam.
Um dos aspectos chocantes da atuação do Brasil perante a CIDH é sua falta de transparência. No item 6 da mencionada Resolução, observa-se que, mesmo instado a apresentar um plano detalhado de atenção a reclusos portadores de doenças infecciosas, o governo não o apresentou. Certamente, isso se deveu aos dados desanimadores que um tal plano mostraria. Entretanto, em política internacional, é menos nocivo admitir seus erros e traçar planos claros e efetivos de ação que se deixar inerte, permitindo aos outros que tragam a público o que lhe cabia trazer.
Pior ainda é tentar impedir que organismos internacionais investiguem as condições de nossas penitenciárias. O item 38 da Resolução lamenta que o Brasil tenha imposto restrições à entrada de câmeras fotográficas no complexo penitenciário. Tal restrição, segundo o governo brasileiro, se baseou no Decreto Estadual n. 41.448 de 2015, de Pernambuco. Ocorre que tal decreto nada dispõe sobre o acesso de câmeras ao local. Além disso, como constatou a própria Corte ao examiná-lo, seu art. 1º era claro ao atribuir-lhe vigência de apenas 180 dias. Assim, além de se mostrar truculento e avesso à transparência para com a comunidade internacional, o Brasil deu mostras de desconhecimento elementar de sua própria legislação.
Apesar do silêncio brasileiro, e das manobras desastradas para impedir a publicidade do complexo, a Corte pode constatar que os casos de tuberculose entre os reclusos aumentou entre 2014 e 2015, conforme o item 8 da Resolução. Constatou ainda que o nível de violência ali verificado alcança níveis medievais, segundo se lê do item 23 da Resolução.
Como é praxe em situações em que nosso país é pilhado desrespeitando os direitos humanos, a vergonha quanto aos fatos parece consternar apenas a população, mas não seus governantes. Uma vez censurado por entidades internacionais, o Brasil tem se valido do momento para promover contratações de bens e serviços sem licitação, alegando justamente a situação de emergência, constatada por órgãos internacionais. Foi o que aconteceu no próprio Decreto Estadual n. 41.448\2015 de Pernambuco.
Valendo-se dos achados alarmantes das primeiras inspeções realizadas em 2014, o Estado utilizou-os como pretexto para determinar um sem número de contratações diretas.
Constata-se, pois, que uma política perversa estabeleceu-se no país. As pressões internacionais por respeito aos direitos humanos têm servido de combustível para mais corrupção e ineficiência.
Costuma-se dizer que o Brasil é um país de boas lei que não são aplicadas. Errado. Faltam leis essenciais ao país. Não poderia ser permitido, em hipótese alguma, que um ente público realizasse uma contratação emergencial sem que fosse ajuizada pelo Ministério Público ação criminal e por improbidade administrativa contra o gestor que permitiu o descalabro.
Enquanto não houver lei assim, más notícias vindas de fora soarão como música para os aproveitadores.