A garagem e a insensibilidade federal
Espera-se que o Conselho Nacional de Justiça retome nesta terça-feira (10) a discussão sobre o caos identificado no Tribunal Regional Federal da 1ª Região, em Brasília, onde foram encontrados 62 mil processos da área previdenciária estacionados numa garagem.
O julgamento foi interrompido na sessão anterior com pedido de vista do conselheiro Emmanoel Campelo.
Foi vísível o esforço da corregedora Nancy Andrighi para sensibilizar o colegiado, diante da “falta de piedade, apoio e misericórdia” com “a profunda dor e ansiedade” dos milhares de interessados naqueles processos há muitos anos sem julgamento.
O que está em discussão é um pedido de providências da Associação dos Juízes Federais da 1ª Região (Ajufer) que pretende revogar decisão da corregedoria: um “Projeto de Aceleração de Julgamentos”, convocando juízes federais para reduzir o inaceitável acervo.
Ou seja, não se falou –até agora– da eventual responsabilização dos que permitiram que o TRF-1 –por resistência ou desídia– estocasse milhares de ações sem julgamento, deixando também de juntar milhares de petições.
Durante os debates, houve quem alegasse ser tradição do CNJ não interferir nas decisões administrativas dos tribunais.
Diante de processos paralisados há sete anos –com réus presos– e decisões não cumpridas pelo tribunal desde 2009, a ministra Nancy Andrighi se disse perplexa com a alegação da Ajufer de que a corregedoria “estava induzindo o tribunal a ferir a lei de responsabilidade”.
Em vez de sugestões para reduzir o vergonhoso acúmulo de processos, a corregedoria recebeu do presidente do tribunal um orçamento –não solicitado– de R$ 2,6 milhões para os 90 dias de trabalho do mutirão –com a “inadmissível”, segundo Andrighi, previsão de contratação de 20 recepcionistas, 25 estagiários e aquisições de poltronas e armários –apesar de o TRF-1 possuir 30 armários no depósito.
A discussão foi concentrada numa questão de ordem levantada sobre o volume máximo de processos que poderiam ser julgados até o final do ano.
Como observou a conselheira Luiza Frischeisen –que antecipou seu voto acompanhando a corregedora, pois se despedia do CNJ– “todos que atuam no TRF-1, membros do MPF e advogados, constatam as dificuldades no trâmite dos processos”.
“O Conselho da Justiça Federal há anos faz recomendações que não são cumpridas pelo TRF-1”, disse Frischeisen.
“A falta de implementação de medidas gerais pune não somente o jurisdicionado e as partes, como o MPF, mas também aqueles juízes convocados e desembargadores, que adotam práticas inovadoras para baixar o acervo, pois esses demonstram que é possível fazer alguma coisa em termos de gestão e melhorar a produtividade, que , no geral , é a menor de todos os TRFs”, diz a ex-conselheira.
Não custa lembrar que se trata do mesmo tribunal que transformou numa grande pizza o julgamento de ex-presidentes da mesma Ajufer, suspeitos de envolvimento na contratação fraudulenta de empréstimos com a Fundação Habitacional do Exército (FHE).
Durante dez anos, juízes dirigentes da associação usaram indevidamente o nome de colegas magistrados para levantar mais de R$ 20 milhões da FHE por meio de contratos fictícios.