Contrato suspeito gerou bate-boca no STJ
A troca de ofensas nesta quarta-feira (3) entre os ministros Francisco Falcão e João Otávio de Noronha, do Superior Tribunal de Justiça, tem origem numa investigação determinada por Falcão no início da gestão, fato revelado pela Folha em março de 2015.
Assim que assumiu a presidência, em setembro de 2014, Falcão constatou que os recursos para Tecnologia da Informação estavam esgotados desde julho daquele ano. Foram calculados prejuízos de R$ 20 milhões em contratos com indícios de superfaturamento e direcionamento de licitação.
Noronha não foi citado na reportagem de autoria do editor deste Blog. O ministro foi testemunha de um dos investigados, que recebeu punição administrativa e impetrou mandado de segurança.
O caso foi chamado a julgamento nesta quarta-feira e Falcão teria alegado que Noronha, por ser testemunha, não poderia participar do julgamento.
Adversários políticos há vários anos, Noronha e Falcão, que já haviam se desentendido momentos antes na mesma sessão, voltaram a travar bate-boca:
“Esse presidente é um tremendo mau-caráter”, disse Noronha.
Falcão, gritando, respondeu: “Mau-caráter é Vossa Excelência, me respeite!”.
A origem dos fatos está numa sindicância instaurada em 2014 por Falcão para apurar a suspeita de irregularidades em duas aquisições: uma antena de rádio de 50 metros erguida no estacionamento do STJ, sem nenhuma utilidade, [foto] e a troca do cabeamento da rede de comunicação de dados do STJ.
Para esse segundo contrato, a Alsar Tecnologia em Redes Ltda., de Brasília, venceu pregão de uma hora, no dia 26 de dezembro de 2013. Ofereceu lance de R$ 37,4 milhões.
A sindicância apurou um sobrepreço de R$ 13 milhões na troca do cabeamento. Dos R$ 8 milhões da antena, o tribunal pagou R$ 3,5 milhões. O prejuízo total inclui ainda R$ 3,5 milhões pagos a uma empresa de informática.
A comissão de sindicância tomou o depoimento de 27 pessoas, incluindo empresários e ex-assessores do ministro Felix Fischer, que antecedeu Falcão na presidência. O ex-presidente não é citado no relatório final.
Incomodou a vários ministros o fato de Falcão ter entregue, em mãos, cópia do relatório da sindicância ao diretor da Polícia Federal, Leandro Daiello Coimbra, ao Procurador-Geral da República, Rodrigo Janot, e ao presidente do Conselho Nacional de Justiça, ministro Ricardo Lewandowski, entre outras autoridades.
Foi aberto um processo administrativo disciplinar contra 12 agentes, alcançando os então responsáveis pela Diretoria-Geral do STJ e pelas secretarias de Administração e Finanças e de TI.
“Só tive conhecimento de possíveis irregularidades na última semana no exercício da Presidência”, afirmou Fischer à reportagem. “De imediato, determinei providências, inclusive sustando pagamentos.”
A comissão atribuiu maior responsabilidade ao ex-diretor-geral, Maurício Carvalho, que teria extrapolado o limite orçamentário para aquisições na área de TI sem consultar a área financeira e usado reserva técnica para garantir o contrato com a Alsar.
Ouvido pela reportagem, Carvalho negou as acusações. Disse que a antena foi adquirida “por necessidade de segurança, apontada por auditoria independente que condenou a fragilidade e segurança na comunicação e rede do STJ”.
O diretor-comercial da Alsar Tecnologia em Redes, Ronei Machado, negou superfaturamento na substituição da rede de cabeamento. “O pregão contou com participação de 14 empresas. A Alsar sagrou-se vencedora com valor final de R$ 37,1 milhões, uma redução de 12,4% em relação ao valor estimado inicialmente pelo próprio STJ”, afirmou, na ocasião.
Segundo Machado, “o valor efetivamente contratado foi de R$ 32,7 milhões. Não há que se falar em sobrepreço se a referência de valor foi determinada pelo próprio STJ”.
Eliane Lavoyer de Araújo, gerente da Stelmat Teleinformática Ltda., disse à reportagem que o projeto de instalação de rede de comunicação de dados privativa “foi paralisado pela atual gestão, sem qualquer explicação sobre o motivo e sem o pagamento das últimas medições dos serviços executados”.
Ela disse que a Stelmat foi vencedora, dentre seis empresas participantes.