TSE versus CNJ: divergências e incoerências

Frederico Vasconcelos

Toffoli e Lewandowski
O Tribunal Superior Eleitoral e o Conselho Nacional de Justiça travam uma guerra surda –e controvertida– sobre os limites do CNJ para controlar a Justiça Eleitoral.

O ministro Ricardo Lewandowski sempre lutou para não submeter o Tribunal Superior Eleitoral ao controle do Conselho Nacional de Justiça. Aparentemente, mudou de posição na semana passada.

Numa reviravolta surpreendente, o colegiado aprovou no último dia 2, na primeira sessão deste ano, uma resolução proposta pelo presidente do CNJ, estabelecendo que o conselho é competente para exercer o controle administrativo, financeiro e disciplinar da Justiça Eleitoral.

A resolução foi autuada, distribuída, pautada e julgada em pouco mais de três horas.

A medida foi interpretada como uma resposta de Lewandowski a resolução que o presidente do TSE, ministro Dias Toffoli, editou, afirmando que o CNJ não tem competência para imiscuir-se na Justiça Eleitoral.

Em dezembro, Toffoli propôs resolução para reafirmar a autonomia administrativa e financeira do TSE. O entendimento aprovado é de que a resolução do CNJ destinada a regulamentar a convocação de magistrados para prestarem auxílio nos tribunais não se aplica às cortes eleitorais.

Lá atrás, Lewandowski e Toffoli abraçaram esse entendimento em relação à autonomia da Justiça Eleitoral, conforme exemplos listados mais abaixo neste post.

Eis o que dispõe o artigo 2º da Resolução 216/2016, aprovada pelo CNJ no último dia 2: “Aplicam-se à Justiça Eleitoral todas as Resoluções e determinações expedidas pelo CNJ, notadamente em matéria administrativa, financeira e disciplinar”.

Na Justiça Eleitoral, acredita-se que a resolução apresentada por Lewandowski atende aos anseios da Corregedora Nacional de Justiça, ministra Nancy Andrighi. A conferir.

Em seu artigo 3º, a Resolução 2016 determina que “os juízes eleitorais de todos os graus de jurisdição estão subordinados, em questões disciplinares, ao CNJ, especialmente à Corregedoria Nacional de Justiça, sem prejuízo da atuação das corregedorias dos tribunais a que estiverem vinculados, inclusive à do TSE, com exeção dos Ministros do Supremo Tribunal Federal que estejam a seu serviço, os quais se submetem a regime constitucional próprio“.

No dia 10 de novembro de 2015, quando o CNJ aprovou resolução que disciplina a convocação de magistrados para atuarem como juízes auxiliares no CNJ e nos tribunais, Andrighi elogiou a medida: “Vai representar um significativo aumento de trabalho e de produção no primeiro grau. Aqueles magistrados que estão há muito tempo fora da jurisdição vão retornar com outra visão. Nós precisamos do juiz na jurisdição”, disse a corregedora nacional.

No ano passado, conselheiros do CNJ questionaram artigo da proposta do Estatuto da Magistratura apresentada ao STF, estabelecendo que o TSE não está submetido às decisões do CNJ. A manutenção do dispositivo foi atribuída a Lewandowski.

Quando presidiu o TSE, Lewandowski sustentou –em vários votos e pronunciamentos– o mesmo entendimento de Toffoli, ou seja, de que o CNJ não poderia estabelecer regras para a Justiça Eleitoral.

A seguir, alguns exemplos.

Em 2009, ao julgar um processo administrativo no TSE (*), Lewandowski afirmou: “Se aceitarmos que o CNJ estabeleça regras de caráter administrativo para os Tribunais Regionais Eleitorais e Juízes Eleitorais, abdicaremos dessa importante função de o Tribunal Superior Eleitoral determinar essa matéria, que é de cunho eminentemente administrativo, de quando os tribunais vão funcionar, e como vão funcionar. Se abrirmos essa brecha, amanhã eles dirão os horários, os dias e como devem ser, inclusive quantos juizes”.

No ano seguinte, Lewandowski citou e reiterou num de seus votos (**) a seguinte afirmação de Toffoli:

Entendo que o Conselho Nacional de Justiça, mesmo que criado por emenda constitucional, não tem competência para tratar a respeito dos juízes eleitorais, sejam eles oriundos de qualquer classe ou tribunal. Não cabe ao CNJ, que não tem competência nem superioridade sobre o Supremo Tribunal Federal, de dirigir orientações a uma justiça que é presidida por um integrante do Supremo Tribunal Federal, que tem na sua vice-presidência outro integrante do STF e é composto por um terceiro juiz vogal também ministro do STF, além de três ministros substitutos”.

Ainda Lewandowski, na mesma decisão: “como bem assentou o ministro Dias Toffoli, a Justiça Eleitoral ‘mais do que uma justiça especial, é especialíssima'”.

Toffili retribuiu a citação: “Senhor Presidente, louvo e parabenizo o belíssimo voto que Vossa Excelência trouxe a esta sessão administrativa. É absolutamente incabível o que o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) tem feito; senão, daqui a pouco, ele dirá onde tem que haver seção eleitoral, como tem que ser a urna eletrônica”.

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(*) PROCESSO ADMINISTRATIVO N° 19.824 (29886-94.2007.6.00.0000) -CLASSE 19— BELO HORIZONTE – MINAS GERAIS
(**) PROCESSO ADMINISTRATIVO N° 2533-74.2010.6.00.0000 – CLASSE 26 – BRASÍLIA – DISTRITO FEDERAL